sexta-feira, 18 de novembro de 2022

generalidades com propósito

Aníbal C. Pires (Vale dos Reis, Egipto) by Madalena Pires
Não raras vezes me perguntam, Estás afastado da política!? Para esta recorrente demanda que me é colocada a resposta é invariável, Não, não estou. Depois sempre acrescento que a atividade política, seja na Região ou fora dela, nem sempre tem visibilidade mediática e que continuo a dar os contributos possíveis, ao meu partido, como faço desde os meus 18 anos. Por outro lado, evito utilizar este e outros espaços para abordar ou opinar sobre a situação política regional, por vezes com algum esforço para resistir à tentação de o fazer, aliás como está a acontecer hoje. São estes alguns dos detalhes que alimentam a ideia do meu afastamento das lides políticas e legitima a recorrente pergunta.

Quando me sentei para dar corpo a este texto trazia comigo a ideia fixa de falar de dependências políticas, do poder pelo poder e da teia de reféns e interdependências que está instituída. Reféns que a tudo se sujeitam para se manterem no poder. Optei, mais uma vez, por não o fazer, embora este fosse um dos momentos adequados para tecer algumas considerações sobre o “estado da Região” pois, como é do domínio público, prepara-se a discussão do Orçamento e do Plano de Investimentos Anual do ano de 2023 e, sobre estes dois documentos muito se poderá(ia) dizer. Mas não o farei. Não o faço sobre o que está explícito, nem sobre o que está submerso nas entrelinhas. O que passa para a opinião pública é a ideia de diálogo parlamentar, de rigor orçamental e de unidade política à volta de um projeto de governação. Nem disse governação avulsa para não me acusarem de estar a fazer juízos infundados e espúrios sobre este tripartido governo e os seus fiéis acólitos de ocasião. Mas, como dizia, a construção das representações sociais sobre o atual momento político, não passam disso mesmo, são imagens de uma realidade virtual. Imagens muito distantes da realidade que nos está a empobrecer como cidadãos e como povo.

imagem retirada da internet

Sou levado a reconhecer que a gestão da comunicação e a indução da ideia de que a governação açoriana tem um rumo e que rompeu com o passado está consolidada. Este reconhecimento é, como qualquer outra opinião, subjetiva, pois não disponho de estudos de opinião que a sustentem, mas a insipiência das oposições, com particular relevo para o PS, e a fraca ou inexistente contestação pública, com as devidas e reconhecidas exceções, levam-me a concluir que a generalidade dos agentes políticos e dos cidadãos aceita como boas as opções políticas que estão a ser implementadas na Região. Talvez não seja bem assim, só a consulta eleitoral o poderia assegurar, mas lá que parece, parece.


Continuo a esforçar-me, mas tenho consciência que já disse mais do que deveria, porém, e sem aprofundar a análise sempre direi que, de facto, existe uma mudança de paradigma nas opções políticas regionais, o que não significa, por si só, que essas alterações representem algo de positivo, bem pelo contrário. A dependência externa aumenta na mesma razão em que diminui o investimento nos serviços públicos, se desbarata o património regional e se enfraquece a capacidade produtiva regional. Ou seja, estamos a caminhar a passos largos para o que os liberais, os de nome e os de opção, tanto desejam: o mercado. Não deixa de ser paradoxal que numa região que pelas suas caraterísticas endógenas (insular, arquipelágica, com uma reduzida dimensão territorial e populacional) se pretenda substituir o setor público por serviços privados. Se é possível!? Claro que sim, mas sempre à custa do financiamento público no qual o mercado se alimenta, quer aqui quer em qualquer outra parte do mundo. Não temos dimensão produtiva, o território é exíguo e pulverizado numa vasta área do Atlântico Norte, não temos dimensão populacional, logo não temos dimensão de mercado. Qualquer tentativa de liberalização dos serviços públicos e da economia está condenada a sair-nos muito caro. O anterior modelo de transporte aéreo para a Região custava anualmente ao Estado cerca de 16 milhões de euros, com a liberalização das rotas de S. Miguel e da Terceira e a inexistência de um teto máximo para as tarifas destas rotas, paradoxalmente por pressão das transportadoras de baixo custo, com a justificação de que o mercado iria autorregular-se e a tendência seria os preços baixarem, teve como efeito um aumento brutal nos apoios do Estado para suportar o chamado Subsídio Social de Mobilidade.     

imagem retirada da internet
A ideia de que o setor privado presta melhor serviço que o setor público é uma panaceia. Veja-se, por exemplo, a diminuição da qualidade dos serviços postais nacionais (CTT) desde a sua privatização, ou ainda, o aumento dos custos e o desinvestimento na infraestrutura aeroportuária nacional, em particular na Região, com a entrega, “ad aeternum”, da concessão da ANA à Vinci. Outros exemplos poderiam ser enunciados como o setor energético ou os transportes, mas julgo que os dois primeiros são suficientes para se perceber que o neoliberalismo não dispensa o financiamento estatal. Para os neoliberais tudo está bem se os lucros forem privatizados e os prejuízos socializados. Veja-se a banca. Foram milhares de milhões de euros de fundos públicos para a recapitalização, agora que os lucros voltaram a ser obscenos não há retorno para o erário público. 

Ponta Delgada, 15 de novembro de 2022

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 16 de novembro de 2022

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