quarta-feira, 26 de julho de 2023

identidade

Imagem retirada da internet

O torpor induzido pala estação quente e húmida, ao qual se pode aduzir que a generalidade dos meus concidadãos estão, como eu, a sofrer da mesma apatia, coloca-me muitas dificuldades na escolha dos temas que partilho neste espaço. Já o referi no último texto, mas hoje senti a necessidade de reforçar e voltar a partilhar com os leitores esta minha angústia. Não é fácil, conquanto não faltem assuntos que merecem a minha atenção e, certamente, a vossa.


Os resultados das eleições no reino de Espanha, a participação, pela primeira vez, da seleção portuguesa de futebol feminino na fase final do Mundial, que está a decorrer na Austrália e Nova Zelândia, os destinos de férias mais “in” ditados pelos influenciadores das redes sociais, o recorde do Guinness  da Maior Roda de Chamarritas do Mundo conseguido nos últimos dias na ilha do Pico, os interessantes resultados da cimeira EU – CELAC, a situação de conflito social e político no Peru, as manifestações contra o aumento do custo de vida no Quénia e a repressão dos manifestantes, a Maratona Literária promovida pela Editora Letras Lavadas em co-realização com a Câmara Municipal de Ponta Delgada, o prémio literário atribuído a Lídia Jorge, o continuado aumento dos juros de referência do Banco central Europeu e a incapacidade das famílias de os suportar, as festas e festivais que animam o Verão insular, as Jornadas Mundiais da Juventude, enfim a lista poderia prolongar-se por muito mais linhas, linhas suficientes para preencher este espaço e, ainda assim, não se esgotariam os temas. 

imagem retirada da internet
Não faltam assuntos, uns mais interessantes que outros, é certo, uns mais outros menos apropriados à estação, mas a opção irá ser outra, embora a questão, ainda não referida, da “prisão flutuante” para migrantes que a Inglaterra contratou à Bibby Marine, com sede em Liverpol para abrigar imigrantes “ilegais” merecesse particular atenção, mesmo durante a estação quente e húmida. Deixo-vos apenas as referências suficientes para, querendo, poderem aprofundar o conhecimento sobre esta bizarra iniciativa. O navio chama-se Bibby Stockholm, tem estado (ou está) atracado no porto de Portland, Dorset, Inglaterra, e tem capacidade para “albergar” 506 pessoas. Uma nota final sobre este assunto: existem registos de ligações entre a empresa-mãe Bibby Line Group (BLG) e o comércio de escravos, no princípio do século XIX. Ao que parece os negócios com a indignidade humana estão no ADN da Bibby Marine.

A identidade açoriana é, bastas vezes, utilizada no discurso político como se fosse uma construção acabada. Não é! À semelhança da autonomia, da democracia e da liberdade, também a identidade açoriana necessita de ser cultivada e alimentada para se consolidar e constituir-se, em definitivo, como uma prática cidadã e um desígnio coletivo.

A história política e económica dos Açores demonstra qua a unidade regional, que se alicerça na identidade açoriana, nem sempre é uma história de harmonia e coesão, quantas e quantas vezes se perderam oportunidades devido a bairrismos irracionais que teimam em persistir, como teima em perdurar a competitividade e multiplicação de equipamentos e modelos, ao invés da complementaridade que atenda às singularidades de cada uma das nossas ilhas.

Construir uma identidade regional neste território pulverizado numa vasta área do Atlântico Norte e com as particularidades de cada uma das ilhas e do povo que as povoou, mas também com as ingerências administrativas externas do poder central, não é uma tarefa fácil. O poder autonómico não fez, e não faz, tudo o que deveria fazer para alicerçar a ideia de Região e foi alimentando os bairrismos replicando investimentos, alguns dos quais mais não servem do que nutrir os clientelismos eleitorais do momento. Levado ao extremo e caricaturando, no atual contexto pode muito bem acontecer a proposta de abertura de gateways no Corvo e na Graciosa.

A identidade regional estrutura-se e desenvolve-se, em minha opinião, nos seguintes pilares: i) a partilha de uma geografia comum, ainda que com o território e a população dispersa por nove ilhas; ii) a religiosidade; iii) a emigração; iv) os movimentos autonomistas; e, v) a Autonomia Constitucional.

O isolamento, a distância aos continentes, o abandono pelo poder central, a sismicidade e a atividade vulcânica moldaram nas gentes uma certa forma de ser e estar e, à margem da igreja católica, desenvolveu-se uma profunda religiosidade como sejam as “romarias quaresmais”, no essencial circunscritas à ilha de S. Miguel, mas é com culto ao “Divino Espírito Santo” que o homem açoriano, esteja onde estiver, se identifica com a sua mátria.

Como escreve Antonieta Costa em Festas em Louvor do Divino Espírito Santo, Tomar, Encontros Internacionais de Tomar, IV encontro Internacional de Tomar (1987): “As festas em louvor do Divino Espírito Santo são um gigantesco fenómeno de expressão cultural que galvaniza o arquipélago pelo Pentecostes, unificando-o em miríades de formas de dizer o mesmo.

Diferentes de ilha para ilha, de freguesia para freguesia, mas ainda assim iguais no seu aspeto nuclear, na sua intenção secreta, na sua mensagem dita e redita, ouvida e deturpada, refeita e reanalisada em cada ciclo do calendário.

É tão essencial à vida do açoriano esse confronto anual com a mensagem de revisão e avaliação dos seus valores mais elevados que para onde quer que vá, leva consigo esse mecanismo social adaptando-o às novas situações com que se depara e usando-o sempre com o mesmo fim, tão eficiente ele é no seu papel de transmissor de cultura.”

foto de Aníbal C. Pires
O culto ao “Divino Espírito Santo” assume-se como o principal pilar da construção da identidade açoriana. Não foi por acaso que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores consagrou legalmente a segunda-feira de Pentecostes como o Dia dos Açores.

À semelhança das “Festas do Espírito Santo” o fenómeno da emigração atravessa toda a sociedade açoriana, todas as ilhas, todas as freguesias viram os seus filhos partir na procura da concretização de sonhos e de melhores condições de vida.

Este fenómeno permitiu a formação de grandes comunidades açorianas no estrangeiro, particularmente significativas nos estados Unidos e no Canadá, onde a saudade da terra, a mesma origem geográfica e alguns aspetos culturais, apesar de oriundos de todas as ilhas do arquipélago, teve um efeito aglutinador que proporcionou um melhor conhecimento da terra distante e aproximou-os à volta de um sentimento comum: - do ser açoriano.

O processo que conduziu à criação da Região Autónoma dos Açores e à consagração da autonomia constitucional, embora tenha a sua génese nos movimentos autonomistas do último quartel do séc. XIX, resulta diretamente das transformações ocorridas em Portugal após a revolução de 25 de Abril de 1974. 

A Autonomia Constitucional é (deveria ser) suporte e instrumento para consolidar o processo de construção da identidade regional. Não tem cumprido cabalmente essa função. A ilha e o ex-distrito continuam a corroer a ideia de Região, sem a qual não há identidade regional.

Ponta Delgada, 25 de julho de 2023 

Aníbal C. Pires, In Diário dos Açores, 26 de julho de 2023

do tráfico negreiro a "albergue" de migrantes

imagem retirada da internet



Excerto de texto para publicação na imprensa regional (Diário Insular) e, como é habitual, também aqui no blogue momentos




(...) Não faltam assuntos, uns mais interessantes que outros, é certo, uns mais outros menos apropriados à estação, mas a opção irá ser outra, embora a questão, ainda não referida, da “prisão flutuante” para migrantes que a Inglaterra contratou à Bibby Marine, com sede em Liverpol para abrigar imigrantes “ilegais” merecesse particular atenção, mesmo durante a estação quente e húmida. Deixo-vos apenas as referências suficientes para, querendo, poderem aprofundar o conhecimento sobre esta bizarra iniciativa. O navio chama-se Bibby Stockholm, tem estado (ou está) atracado no porto de Portland, Dorset, Inglaterra, e tem capacidade para “albergar” 506 pessoas. Uma nota final sobre este assunto: existem registos de ligações entre a empresa-mãe Bibby Line Group (BLG) e o comércio de escravos, no princípio do século XIX. Ao que parece os negócios com a indignidade humana está no ADN da Bibby Marine. (...)

sábado, 15 de julho de 2023

o moscatel está inocente

Foto de Aníbal C. Pires

O tempo é de férias. O calendário assim o dita, mas nem todos podemos, nem todos gozamos os merecidos dias de descanso anual quando as temperaturas e os longos dias de Verão a isso convidam. Seja por opção, seja por obrigação contratual, ou outras razões que o justifiquem. As férias no Verão não são para todos, embora o sentimento generalizado seja de algum desprendimento e alheamento da realidade. É como se de uma reação inata se tratasse para compensar e recuperar das violentas agressões mediáticas, sociais, políticas e profissionais a que estamos sujeitos ao longo do ano. 

Estando, ou não, de férias este é um tempo que convida a ir ao mar no fim da tarde ou pela manhã, conforme o gosto e a disponibilidade, calcorrear trilhos, a dedicar mais tempo aos amigos, a conversar sobre os festivais de Verão, sobre a sustentabilidade do destino turístico Açores, a procurar ler os livros que se foram acumulando nas prateleiras, ou podemos mesmo optar por não fazer, rigorosamente, nada; o que podendo parecer não será, dizem os entendidos, a melhor forma de repor energias e lavar a alma.

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Nunca é fácil, mas em julho e agosto é sempre mais espinhoso encontrar um tema que se acomode à estação, isto é, que não retire os leitores da letargia em que estão mergulhados, mas não seja, de todo, desinteressante. A ação individual e coletiva do Governo Regional e dos seus fiéis acólitos é uma fonte temática inesgotável sobre os quais se pode dissertar, alguns factos e decisões até são hilariantes não fossem os custos presentes e futuros que daí resultam, outros que pelo seu alcance colocam em causa a sustentabilidade financeira da Região, são dramáticos e por isso não se adequam à época estival, que se quer e deseja tranquila. Mas a principal razão pela qual não vou abordar questões da política regional é, no essencial, por entender que nem agora, nem no Outono, no Inverno, ou na Primavera, a ação governativa merece a minha atenção. Tenho opinião, mas não gasto o meu tempo a escrever sobre as imbecilidades políticas protagonizadas pelos departamentos governamentais e apoiadas pelos indefectíveis subsídio-dependentes do poder instalado (não me refiro aos beneficiários do RSI, esses merecem todo o meu respeito pois, são as vítimas do sistema). 

O tempo passa, as instituições ficam, os atuais protagonistas da coligação governamental, serão a seu tempo afastados, quando os eleitores manifestarem nas urnas o enfado e o descontentamento que expressam em surdina, não vá o diabo tecê-las se levantarem a voz. Sim, pois esta solução governativa conseguiu, em tempo recorde, instalar um clima de medo que os governos do PSD e o PS levaram mais de uma década a aparelhar, e ainda assim caíram, como este cairá ao que se julga e deseja, também, em tempo recorde, outubro de 2024 parece-me uma excelente data, se for antes tanto melhor. Sei que as generalizações são injustas e nem todos os titulares dos departamentos governamentais merecem o epíteto político que atribuí ao coletivo que forma o governo, mas a exceção que faço à Secretária da Educação e dos Assuntos Culturais, não da Secretaria que Sofia Ribeiro tutela, apenas confirma o que fica dito sobre o atual governo e os seus indefetíveis servos.

Os leitores, neste momento, se ainda se mantiverem por aqui, já perguntam: afinal vais escrever sobre o quê? E eu não tenho o que lhes responder e, não é aconselhável dizer-lhes que não sei, logo o melhor é deixar correr a pena que alguma coisa se vai amanhar, conquanto a situação, face a tudo o que já foi dito, se esteja a tornar cada vez mais penosa e o espaço escasseie para tratar de um qualquer assunto que me venha a ocorrer e que se enquadre no contexto da estação estival, isto é, possa ser aliciante e não obrigue o autor e os leitores a esforços desnecessários. 

Sou uma pessoa bem-humorada e bem-disposta, mas não fui fadado para escrever textos que provoquem o riso, ou mesmo um esboço de qualquer expressão facial e labial que se aproxime de um sorriso, se assim fosse poderia tentar descrever algumas histórias leves e bem-humoradas a que assisti ou, que eu próprio protagonizei. Seria, sem dúvida, uma excelente opção para amarrar os leitores ao texto e uma contribuição para manter os espíritos afastado das inquietações adiadas para setembro quando tudo voltar ao ritmo do ano escolar, do ano judicial e do ano político, ainda que nem as escolas e os tribunais estejam fechados, nem o exercício do poder político tenha suspendido a sua atividade para balanço.

Não sendo um humorista, como ficou a saber-se pela confissão feita no parágrafo anterior, também não sou “influenciador” (vulgo: influencer), apesar de ter perfis e publicações em diversas redes sociais, mas por prezar a liberdade e a diversidade de pensamento autónomo, não gosto de colonizar o gosto e a opinião dos meus concidadãos. Mais uma declaração de princípios a somar a outras que, por vezes, se podem encontrar dispersas nos textos que escrevo e partilho neste e noutros espaços.

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O senhor Presidente da República teve uma indisposição e desmaiou, naturalmente, esse incidente foi notícia. O estado de saúde do Presidente é do interesse de todos os portugueses, mesmo dos que nutrem pouco simpatia pela personalidade que atualmente desempenha o cargo. Já as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa foram descabidas ao atribuir ao “moscatel”, a causa da sua indisposição, por outro lado caberia à equipa médica que o assistiu, se fosse caso disso, qualquer nota sobre o estado clínico do presidente. Não sou produtor nem comercializo “moscatel”, ou qualquer outro tipo de bebidas espirituosas, mas se fosse tinha-me sentido prejudicado. A(s) causa(s) terão sido outras, o “moscatel” pode ter contribuído, mas a constatada desidratação e não ter almoçado, associada ao calor, à idade e ao histórico clínico, isso sim, justifica a indisposição e o desmaio do Presidente da República. O moscatel tem de ser ilibado desta responsabilidade pelo desmaio de Marcelo Rebelo de Sousa. O moscatel está inocente!

O personagem que ocupa a Presidência da República continua a ser o eterno comentador televisivo, daí não vem mal ao mundo, face à arquitetura do Estado português, mas não se espere que os portugueses lhe deem o crédito que é devido a um chefe de estado. Infelizmente Marcelo Rebelo de Sousa não é caso único, não faltam por aí presidentes e primeiros-ministros, e outros tantos comentadores, a fazerem o papel de capacho de organizações cuja legalidade democrática não foi sufragada pelos povos, mas que decidem sobre o nosso presente e futuro como se tivessem essa legitimidade.

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A lista destas personagens é longa, mas como está tacitamente assumido pelo autor que durante a estação estival os temas são tratados com alguma leveza, deixo uma curta lista de três nomes: Christine Lagarde, Presidente do Banco Central Europeu, Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia, e Josep Borrell, Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança. Sobre estas três “conhecidas” personalidades, hoje, abstenho-me de tecer outras considerações que não seja reforçar a ideia de que exercem cargos para os quais não foram eleitos, mas cuja ação coloca em causa o bem-estar, presente e futuro, dos povos da União Europeia.

Quanto ao narcisismo de Marcelo Rebelo de Sousa pouco há a acrescentar a não ser mais uns autorretratos (selfies) e, para nosso sossego antes isso que um monólogo de mais de dez minutos sobre o seu desmaio e o moscatel quente que o terá provocado. 

Madalena (Pico), 11 de julho de 2023 

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 12 de julho de 2023

nem agora, nem nunca





Excerto de texto para publicação na imprensa regional (Diário Insular) e, como é habitual, também aqui no blogue momentos




(...) Nunca é fácil, mas em julho e agosto é sempre mais espinhoso encontrar um tema que se acomode à estação, isto é, que não retire os leitores da letargia em que estão mergulhados, mas não seja, de todo, desinteressante. A ação individual e coletiva do Governo Regional e dos seus fiéis acólitos é uma fonte temática inesgotável sobre os quais se pode dissertar, alguns factos e decisões até são hilariantes não fossem os custos presentes e futuros que daí resultam, outros que pelo seu alcance colocam em causa a sustentabilidade financeira da Região, são dramáticos e por isso não se adequam à época estival, que se quer e deseja tranquila. Mas a principal razão pela qual não vou abordar questões da política regional é, no essencial, por entender que nem agora, nem no Outono, no Inverno, ou na Primavera, a ação governativa merece a minha atenção. (...)

quarta-feira, 5 de julho de 2023

Clara Josephine Zetkin - a abrir julho

imagem retirada da internet
"A propaganda das mulheres deve tocar em todas as questões que são de grande importância para o movimento proletário geral. A principal tarefa é, de fato, despertar a consciência das mulheres e incorporá-las na luta de classes."

Clara Zetkin


Lindas são as mulheres que lutam.