segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Mais dia, menos dia vai chover

Acreditar é meio caminho andado. Acreditar incondicionalmente, por conseguinte, será ter fé e, a fé é o caminho para que tudo se explique e para que tudo se resolva, nem que seja segundo aquela velha máxima de que o que não tem remédio, remediado está.
A ministra Assunção Cristas é uma mulher de fé. Não chove mas vai chover! Assim podemos sintetizar a resposta da super ministra ao estado de seca generalizado que afeta todo o território continental. Posso até nem ser um homem de fé mas acredito que sim. Acredito que mais dia, menos dia vai chover.
O inverno seco que se está fazer sentir produziu entretanto graves prejuízos à agricultura, está na origem de ruturas no abastecimento de água às populações, contribuiu para a diminuição da produção de energia elétrica e os incêndios florestais deflagram como se fosse agosto. A resposta de Assunção Cristas a todas estas questões foi: “sou uma pessoa de fé, esperarei que chova.”
Ora aí está uma resposta à altura de um membro do governo para quem os portugueses são mercadoria para exportação e Portugal um protetorado da Alemanha, da França, quiçá, da União Europeia, nem sei muito bem se o Banco Mundial, a organização Mundial de Comércio e o Fundo Monetário Internacional também são nossos protetores, talvez sejam. Não nos faltam amigos dispostos a estenderem o seu braço protetor. Porque será!? Talvez pela seca, quiçá pela fé neste pequeno país que já foi império.
Tenhamos fé que um dia a crise acaba. Tenhamos fé que nos vão repor o valor do imposto extraordinário e dos subsídios de férias e de Natal, tenhamos fé... que um dia vamos ter horários de trabalho que nos permitam acompanhar o crescimento dos filhos e,  assim valorizar a família e, quem sabe, até aumentar a taxa de natalidade, tenhamos fé que um dia encontraremos a tal luz ao fundo do túnel, tenhamos fé...
Eu cá por mim estou como aquele que diz – “fia-te na virgem e não corras...”. Ou seja, por muita que acredite, por muita fé que tenha, julgo que o provérbio que melhor se adapta à situação será mesmo – “mais vale prevenir do que remediar”. E, como não sou pessoa para “esperar sentado” considero que só levantando a crista e lutando, e indignando-me, e insurgindo-me contra as “assunções”, com crista e sem crista, será possível prevenir pois, se assim não for, corremos o risco de, no fim, não haver luz ao fundo do túnel, corremos o risco de, no fim, não haver nada para remediar. No fim só as trevas da servidão e os néones do mercado a anunciar as vantagens do estado mínimo.
Não vou “esperar sentado”. Basta lembrar Brecht para perceber que nada temos a ganhar com a resignação e que nada é impossível de mudar.
Ponta Delgada, 26 de fevereiro de 2012

Aníbal C. Pires, In Jornal Diário, 27 de fevereiro de 2012, Ponta Delgada

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