quinta-feira, 12 de julho de 2012

Coragem ou a falta dela


Na passada semana foi discutida e rejeitada uma proposta da Representação Parlamentar do PCP que recomendava ao Governo Regional o cancelamento do projeto de construção de um campo de golfe em Santa Maria mas, a proposta do PCP não se limitava a isso, a recomendação, para além de materializar a vontade expressa dos marienses, que de forma aberta manifestaram essa opinião numa petição, já discutida, mas concretizava também a vontade de muitos outros que declararam essa intenção em surdina - vá-se lá saber porquê!? Mas, como dizia, a recomendação não pretendia apenas o cancelamento da construção de um campo de golfe, a proposta refletia, sobretudo uma visão diferente de desenvolvimento para o nosso arquipélago.
Tratava-se, no concreto, de rejeitar definitivamente a disparatada ideia de construir um campo de golfe e, em vez disso, adquirir um navio para estabelecer uma ligação marítima regular entre as ilhas de São Miguel e Santa Maria, bem como iniciar ou reforçar um conjunto de medidas para fomentar o turismo sustentável em Santa Maria.
Tratava-se de realizar, no concreto, uma política de desenvolvimento turismo assente, sobretudo, no respeito e valorização do património paisagístico e ambiental, que o respeite e valorize tendo sempre presente que este património natural e humanizado é a principal riqueza de que dispomos, o fator que nos diferencia, o fator que nos torna atrativos e um destino único no Mundo. Trata-se, no fundo, de entender que é em busca dessa singularidade que os turistas nos visitam e na qual devem ser assentes os pilares da sustentabilidade do setor.
Para a concretização do modelo de desenvolvimento que defendo para os Açores é necessário fazer opções, seja em tempo de “vacas magras” seja em tempo “vacas gordas”, e a proposta do PCP, a que tenho vindo a referir-me, também tinha associado uma escolha política, uma opção clara sobre a utilização dos escassos recursos financeiros que a Região tem ao seu dispor, sem colocar em causa o necessário investimento público em Santa Maria. 
Onde será mais útil gastar quinze milhões de euros? A construir um campo de golfe que vai destruir dos melhores terrenos agrícolas da ilha e causar uma série de problemas futuros, como por exemplo, no escasso recurso natural que é a água!? Valerá a pena gastar quinze milhões de euros, a construir um campo de golfe que se vai tornar certamente num enorme e dispendioso “elefante branco” ou, cor-de-rosa se preferirem, à semelhança de outros “elefantes” que por aí existem ainda que com outros matizes cromáticos?
Será uma boa opção política investir quinze milhões de euros num equipamento turístico sem garantir que os seus potenciais clientes têm transportes para lá chegar? Não! Não é certamente necessário, não é seguramente útil, nem é certamente uma boa opção política.
A recomendação política do PCP tinha como alternativa a aquisição não só a de um navio com capacidade para transporte de passageiros, veículos e carga, que estabeleça, ao longo de todo o ano, uma ligação regular entre São Miguel e Santa Maria, bem como iniciar ou reforçar um conjunto de medidas para fomentar o turismo sustentável
PS e PSD, irmanados como sempre, na falta de imaginação e perspetiva de futuro, amarraram-se a esse infeliz projeto e, agora, apesar de não o quererem concretizar, está adiado para próxima oportunidade, também não podem formalmente desligar-se dele, sob pena de os marienses e o resto dos açorianos perceberem claramente a sua desorientação quanto ao modelo de desenvolvimento que propõem para a Região.
Talvez por isso as intervenções dos deputados do PS e do PSD para justificar a rejeição da proposta do PCP se tivessem constituído numa hilariante peça parlamentar. O PSD a fundamentar a sua posição nas vantagens ambientais da construção do campo de golfe, sim, leram bem, vantagens ambientais; e, os deputados do PS a enumerarem exaustivamente todos os investimentos públicos dos últimos 16 anos e a aconselharem o deputado do PCP a visitar todos os sítios de interesse ambiental, geológico, paisagístico e de lazer da ilha de Santa Maria partindo do abusivo princípio que o deputado do PCP, também eleito com os votos dos marienses, não conhece a realidade da ilha de Gonçalo Velho.
Haja paciência para tanta falta de coragem e para tamanha vulgaridade!
Ponta Delgada, 10 de julho de 2012

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 11 de julho de 2012, Angra do Heroísmo

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