Terras abençoadas por Deus e esquecidas pelos homens. Isto é o que penso de cada vez que visito as ilhas Graciosa e S. Jorge e, a cada visita se aprofunda mais esse sentimento. É possível fazer mais e melhor pelas chamadas ilhas da coesão, é possível fazer mais e melhor pelo desenvolvimento harmonioso dos Açores.
A aplicação de modelos económicos que privilegiam a dimensão dos mercados e a economia global numa região insular e arquipelágica, onde a dimensão territorial e demográfica são exíguas, só pode estar condenado ao insucesso e provocar distorções e assimetrias ao desenvolvimento.
É tempo de repensar este modelo de desenvolvimento económico, não de reconfigurar a economia regional face às dificuldades que atravessamos, mas de romper, refletida e conscientemente, com um modelo económico que não atende às características da Região, ou seja, necessitamos de encontrar um paradigma açoriano para o desenvolvimento.
Um modelo de desenvolvimento que limite os constrangimentos da dispersão territorial e a distância aos continentes, um modelo de desenvolvimento que favoreça a comercialização interna da produção regional, um modelo que garanta a sustentabilidade da atividade produtiva (no mar e na terra), um modelo social e economicamente mais justo que promova a coesão territorial, social e económica.
Mas voltando às ilhas a que me referi no primeiro parágrafo. Abençoadas porque de uma beleza e fertilidade peculiares e, no caso particular de S. Jorge a bênção está, também, relacionada com a sua posição geográfica. A ilha do dragão é o vértice, não de um, de dois triângulos.
A proximidade de S. Jorge ao Pico e ao Faial, o tradicional triângulo, é a mesma proximidade que se verifica entre S. Jorge, Graciosa e Terceira. Um vértice comum a dois triângulos. É assim que vejo S. Jorge quando penso esta parte da Região, quando penso o seu futuro e as dinâmicas de desenvolvimento que podem ser potenciadas na diversidade e complementaridade das ilhas do Grupo Central.
Quanto ao abandono a que os homens, leia-se Governos, as outorgaram nada direi porque tudo está dito – desertificação e empobrecimento.
A história da cabotagem açoriana, verdadeira epopeia marítima dos Açores, está ou estará por fazer, mas não tenho dúvidas que do seu estudo poderão resultar ensinamentos para alguns dos problemas que nos afligem no presente, designadamente, os transportes marítimos de mercadorias e passageiros.
Foi pelo mar, até ao fim do terceiro quartel do século XX, que os açorianos comerciaram e viajaram, embora por vezes nos pareça que não, tal tem sido a dificuldade em encontrar navios e modelos de transporte marítimo que sirvam de fator de desenvolvimento e motor da economia regional.
A centralidade de S. Jorge tem sido desbaratada, a proximidade das ilhas do Grupo Central anulada com a competitividade alimentada em bairrismos cegos e ardis eleitorais.
Insistir em estratégias de atomização das unidades territoriais da Região e não procurar e potenciar as sinergias e complementaridades entre elas, atendendo às suas especificidades e á sua capacidade e vocação produtiva, é insistir num erro e colocar em causa um dos principais desígnios autonómicos – o desenvolvimento harmonioso da Região Autónoma dos Açores.
Para evitar qualquer especulação sobre o conceito direi que, no meu dicionário político, desenvolvimento harmonioso não é sinónimo de igualitarismo.
Santa Cruz das Flores, 20 de agosto de 2012
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 22 de agosto de 2012, Angra do Heroísmo
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