quarta-feira, 6 de abril de 2022

Antes, durante e depois

imagem retirada da internet
A cerimónia de entrega dos Óscares reduziu-se à sua insignificância, não fora um inaceitável incidente e tinha passado quase sem se dar conta do evento. Sou um fã da chamada “sétima arte”, mas nunca me interessei pelo ritual, criado pela “Academia”, para anunciar os vencedores das diversas categorias em apreço, se bem que, posteriormente, procure saber quem foram os premiados.



O meu interesse pelos Óscares é relativo, embora fique cativado pelo antes e depois da liturgia encenada para promover a indústria cinematográfica de Hollywood. Este ano a minha atenção, para além de procurar conhecer a lista de nomeações, centrou-se na exigência e na ameaça de um ator, duplamente premiado, dirigida à organização. Sean Penn exigiu à Academia que o presidente da Ucrânia pudesse dirigir-se em vídeo, direto ou pré-gravado, à assistência e, por conseguinte, a todos os telespetadores que por esse mundo assistissem ao evento. Esta era a reivindicação do ator que, há falta de outros argumentos, ameaçou destruir (quebrando ou derretendo) as duas estatuetas que lhe foram atribuídas, em 2004, pelo seu desempenho em Mystic River, e, em 2009, como protagonista do filme Milk, isto caso a organização não atendesse ao seu pedido. A exigência de Sean Penn não foi aceite e, tanto quanto sei, a ameaça não foi cumprida. Eu pelo menos não dei conta, mas como não vejo televisão é bem possível que as estatuetas já tenham sido destruídas, até pelo facto de considerar o ator um homem de palavra e, por norma, não deixa os seus créditos por mãos alheias. Pode o leitor ter interpretado o que acabou de ler como uma ironia, e não se enganou, desde logo porque para estar bem informado o melhor, mesmo, é não ver televisão, e por outro lado, já tive pelo cidadão Sean Penn mais consideração. Mas o que eu penso dos conteúdos informativos e do ator é, obviamente, irrelevante para o caso.

Lady Gaga e Lisa Minnelli - imagem retirada da internet
A exigência antes, o incidente durante, a ameaça que ficava para depois ou, para o baú onde se arquivam as inconveniências. Em síntese, estas são, no essencial, as questões centrais dos Óscares de 2022. Pouco ou nada se falou dos filmes nomeados e dos vencedores, ou ainda de outros aspetos, quiçá mais interessantes, por serem humanos, que ficaram à margem dos noticiários e do dirimir de argumentos a favor e contra os protagonistas do incidente que marcou a entrega dos Óscares deste ano. Lady Gaga e Lisa Minnelli protagonizaram o melhor momento da noite e o público correspondeu com uma ovação de reconhecimento à carreira de Lisa Minnelli. Lady Gaga mostrou como a solidariedade e o respeito podem ser manifestados de uma forma discreta, mesmo tratando-se de um espetáculo onde, como todos tiveram oportunidade de ver, já vai valendo de tudo.

O presidente ucraniano não participou nos Óscares, mas o Grammys Award, realizado no passado domingo em Las Vegas, abriu-lhe espaço e Volodomyr Zelensky aproveitou-o para dar continuidade à sua narrativa e alimentar uma guerra que ninguém quer, mas é fomentada com estes e outros episódios e, impõe, à permeável opinião pública ocidental, uma visão unilateral e parcial do conflito bélico que está nas bocas do mundo, como se outros não devessem, também, merecer a nossa atenção. E sobre esta participação especial nos Grammys por aqui me fico antes de ser acusado de qualquer coisa que não sou. Não valorizo (nunca valorizei), à semelhança dos Óscares, o Grammys Award, mas se sou fã do cinema com a música mantenho uma relação de dependência, não vivo sem ela. Nunca me imaginei a escrever um texto sobre estes temas (Óscares e Grammys) e, em abono da verdade, confesso: quando me sentei para escrever não era bem isto que trazia em mente, mas depois pensei em si e no seu bem-estar. 

Para quê trazer-lhe um assunto sobre o qual, passados dois anos tanto se continua a falar e o essencial continua por fazer, isto é, o necessário reforço do investimento do sistema público de saúde. Investimento acompanhado de alterações ao atual paradigma.

imagem retirada da internet

Uma vez que a pandemia já é uma endemia, ou está em vias disso, e, por assim ser, passou para nota de roda pé nos telejornais, para as páginas mais recônditas dos jornais e para apontamentos “en passant” nos noticiários das rádios. Desta vez não é ironia, agora trata-se o assunto com mais sobriedade, o que me parece salutar, e por outro lado existem outros centros de interesse de maior consumo mediático. É o mercado a funcionar, também na comunicação social. 



Com o regresso da racionalidade à agenda das questões de saúde pública a pressão sobre os decisores políticos abrandou e este será, digo eu, um excelente momento para se avaliar, propor e colmatar as insuficiências que se verificaram durante a pandemia. Não as respostas a uma situação excecional, mas as não respostas do Sistema Regional de Saúde durante situações de exceção. Não querendo, nem podendo, alongar-me mais direi apenas que a crise sísmica vulcânica de S. Jorge veio colocar a nu a premente necessidade de construção de um novo Centro de Saúde nas Velas.

Ponta Delgada, 5 de abril de 2022

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 6 de abril de 2022


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