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foto by João Pires |
Viajar é sinónimo de conhecer, aprender, experimentar. Não encontramos estes significados no dicionário, mas as viagens, sejam simples passeios pelos espaços que habitamos, ou viagens para locais de não pertença, não digo lugares exóticos pois, tenho sempre a sensação que quando este vocábulo é utilizado traz consigo alguns atributos de valoração nem sempre muito positivos, mas como dizia, viajar é criar oportunidade para aprender e conhecer, experimentando e estando para sentir o pulsar da vida
e a gente dos lugares. Mesmo as hodiernas e, por vezes, mal-afortunadas viagens de estudantes para alguns não lugares. Mesmo dessas viagens poderá resultar alguma aprendizagem para a vida de quem embarca nessa espécie de ritual iniciático. Ou não! A dormência, provocada pelos excessos do consumo, bloqueia os sentidos e, como sabemos, a aquisição de conhecimentos faz-se através de estímulos sensoriais. Uma das aprendizagens, a haver alguma, poderá ser: sentir e usufruir não é compatível com o torpor induzido por substâncias que alteram o comportamento.
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Chicago, Lago Michigan (2016) - foto by Aníbal C. Pires |
Viajar é, cada vez mais, fazer turismo. E meu caro leitor da “Sala de Espera” turismo não significa, no meu dicionário de sinónimos, viajar. Conquanto se viaje para fazer turismo. Parece-lhe que estou confuso, e talvez tenha razão, ando profundamente perturbado com o que se passa pelo mundo: são as cheias e as vítimas, os golpes políticos palacianos (Paquistão), o perpetuar das guerras, a censura, a narrativa revisionista da história, os jornalistas presos – Julian Assange, mas também Pablo Gonzalez, ou Gonzalo Lira, recentemente desaparecido, e, por aqui me fico, a lista de preocupações é longa e, só a sua enumeração me afeta e revolta. Se isto é a civilização como será a barbárie para a qual a “comunidade internacional”, ou se preferirem o ocidente, nos está a guiar!?
Turismo é, por definição, a ação de fazer viagens para recreio. Ao fazer turismo nem sempre se viaja com o intuito de conhecer, aprender e experimentar, pode viajar-se apenas com um propósito lúdico. Não tenho nenhuma crítica implícita a este modo de viajar, também tenho feito algumas viagens que não vão além do lazer e do "dolce far niente" e, penso continuar a fazê-las pois, a minha idade já não aconselha a colocar a mochila às costas e partir, por aí, à descoberta.
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Marraquexe, Marrocos (2018 - foto by Madalena Pires |
Não pense o leitor que tenho uma posição radicalmente contra o turismo, ou seja, às viagens de lazer. Não, não tenho. E a oferta turística é cada vez mais diversificada quanto à sua natureza e à procura: lazer, saúde, aventura, cultura, religião, sexo, ambiente, gastronomia, enologia, espaço, enfim uma enorme panóplia. Procure o leitor e encontrará propostas para todos os gostos, por mais bizarros que possam parecer, haja bolsa para lhe suportar o desejo. O conceito de turismo evoluiu e vai muito para lá das clássicas viagens de lazer.
Os operadores turísticos adaptaram-se bem às necessidades do mercado e, nada tenho contra isso, se os destinos beneficiarem economicamente, o seu património cultural, ambiental e social não seja adulterado, e, a riqueza gerada contribua para elevar a qualidade de vida e o bem-estar das suas populações. Se os destinos não considerarem estas e outras premissas que lhes garantem competitividade e sustentabilidade não serão, por certo, os forasteiros que o farão, nem têm de o fazer, embora um pequeno segmento da população tenha consciência dos impactos negativos da procura massiva de alguns destinos turísticos e até os evite.
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Sal, Cabo Verde (2016) - foto by Aníbal C. Pires |
Se lhe disser que quando iniciei este texto a ideia era explorar a nostalgia e a sedução das aventuras romanceadas nas crónicas de viagem, estou a dizer-lhe a verdade. Ia juntar-lhe um ou outro apontamento sobre algumas das minhas viagens feitas à margem dos pacotes turísticos, mas a pena, neste caso o teclado, não quis seguir o guião e como constata ando por aqui a vaguear sem rumo, o que não deixa de ser, para mim, uma viagem desafiante. Para si que hoje passou pela “Sala de Espera” e ficou até agora, deixe-se ficar mais um pouco para ver até onde isto nos leva.
Tenho evitado, neste espaço, abordar de forma direta e objetiva questões relacionadas com a atualidade política. Pretendo continuar nesta linha de evitamento e as referências seguintes sobre um assunto da atualidade política regional mantêm-se dentro da fronteira, por mim, traçada.
O Plano de Ordenamento Turístico da Região Autónoma dos Açores (POTRAA) vai, finalmente, ser revisto depois de vários anos de vazio legislativo. Aguarda-se que as aprendizagens feitas com o crescimento (2019) e as legítimas preocupações daí decorrentes, mas também com os efeitos económicos desastrosos durante o período pandémico (2020), tenham sido suficientes para a ALRAA expurgar, da proposta apresentada, os mecanismos de livre arbítrio e da satisfação de interesses de momento, colocando em causa um modelo que deve ter como prioridade a garantia de sustentabilidade do setor ancorada na qualidade e singularidade do destino Açores. O turismo pode, e deve, dar um forte contributo para a economia da Região, mas não deve haver pretensões de que possa vir a ser substitutivo de outras atividades económicas.
Ponta Delgada, 19 de abril de 2022
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 20 de abril de 2022
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