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Aníbal C. Pires (foto do arquivo pessoal) |
A edição de dezembro de “O Barbilho”, boletim informativo da CDU Fundão, já está disponível. Podem aceder clicando
aqui.
No âmbito das comemorações do cinquentenário de Abril, “O Barbilho” tem vindo a publicar algumas sugestões de fundanenses, ou ao Fundão ligado, sobre o que deveriam ser as celebrações no concelho, mas também alguns testemunhos das vivências pessoais.
Foi-me pedida colaboração e, naturalmente, anuí.
Esta publicação no blogue reproduz os dois pequenos textos que, a este propósito, enviei para “O Barbilho” e que constam da edição de dezembro.
Abril, do povo e para o povo
Cresci no Fundão e foi no Fundão que vivi o 25 de Abril de 1974, embora esteja ausente a cidade, que era vila, está no meu coração pois, foi à sombra da Gardunha, com a Estrela no horizonte, que cresci e vivi intensamente o tempo das utopias da juventude, mas também a utopia da revolução.
A comemoração formal em sessões solenes nos salões do poder não é, nunca será, a melhor forma de comemorar o 25 de Abril. Principiou por ser uma revolta militar, mas foi com o apoio popular que se construiu o projeto transformador que a Constituição de 1976 consagrou. As comemorações do cinquentenário devem estender-se ao longo do ano, em todas as freguesias, aldeias e lugares do concelho, envolvendo as populações e os agentes culturais locais. Cumpra-se Abril, do povo para o povo.
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imagem retirada da internet |
Amor em Abril
Quando me levantei e durante as rotinas que antecediam a minha ida para a Covilhã, onde frequentava o ensino secundário, notei que a emissão de rádio estava diferente. A música e o noticiário anunciavam uma inusitada quinta-feira. Alguma coisa inusual acontecia e, parecia bom.
Quando cheguei à estação dos caminhos de ferro do Fundão, sempre no limite horário, entrei de rompante na carruagem já em movimento e procurei os colegas que comigo faziam, diariamente, a viagem até à Covilhã. Já tínhamos percecionado que o país estava a viver um dia invulgar e, conquanto, não houvesse muita informação disponível adivinhava-se um país novo.
Não tínhamos consciência política, mas a consciência social já despontava em alguns de nós e as questões da pobreza, da estratificação social, da emigração e da guerra colonial eram assunto de apaixonadas discussões.
O dia foi-se enchendo de novidades e, uma estranha e inexplicável sensação de felicidade foi-nos invadindo. O dia escolar sofreu algumas alterações. Era necessário ir para a rua expressar apoio ao “movimento dos capitães”. E fomos.
Ao fim da tarde regressei ao Fundão e subi em LIBERDADE a Avenida Salazar. Quando entrei em casa a minha mãe abraçou-me e chorou, como terão chorado de felicidade muitas outras mães nesse dia em que se anunciou o fim da guerra colonial, e disse-me: - Já não vais para a guerra filho. Enlaçado nos braços de minha mãe, chorei com ela.
Em 2008, ano da morte de minha mãe, escrevi um poema sobre este momento e que vos deixo como parte deste testemunho sobre o 25 de Abril.
amor em Abril
as lágrimas
soltaram-se
dos teus olhos
rolaram pela tua face
o choro embargou-te a voz
mas o teu semblante
irradiava uma alegria incontida
abraçaste-me, Mãe
chorei contigo
a tua exultação prenunciava
que os teus receios, os teus medos
que cresciam comigo
findavam
naquele Abril
sabes, Mãe
nunca mais deixei
de celebrar o teu Amor em Abril
e... por Ti, Mãe
fiz-me um dos homens
que nunca
nunca deixarão
Abril morrer
In “O Outro Lado – palavras livres como o pensamento”, Aníbal C. Pires, Letras Lavadas, 2014
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