quarta-feira, 29 de abril de 2015

Desafios

Foto - Aníbal C. Pires
A zona habitacional envolvente do Aeroporto de Santa Maria tem características urbanas distintivas e únicas na Região. Caraterísticas que decorrem do seu planeamento original, que permitiu criar uma zona, com baixa densidade de construção, abundância de espaços verdes e zonas de lazer, boas vias de acesso e circulação e um conjunto de equipamentos coletivos adequados ao tempo e às necessidades da então população residente. Esta singularidade decorre de um conjunto de fatores, desde logo, de ter sido implantado junto do aeroporto de Santa Maria, ter acompanhado o seu desenvolvimento e evolução. Assim pode afirmar-se com segurança que ali foi implantado, um conjunto urbano inovador, coerente, planeado de raiz, indo ao encontro do modelo de “cidade-jardim” e enquadrando-se no urbanismo moderno de meados do século XX. Esta evolução decorreu não apenas da presença americana inicial como, também, da posterior planeamento e intervenção da aeronáutica portuguesa, envolvendo alguns dos maiores arquitetos portugueses, entre os quais Keil do Amaral, e que a tornaram, verdadeiramente, uma zona urbana modelo. Pesem embora as diversas intervenções e alterações a que foi sendo sujeita ao longo dos tempos, a zona envolvente ao aeroporto de Santa Maria mantém ainda hoje muitas destas características.
No entanto, o passar dos anos e as vicissitudes da sua gestão e propriedade, bem como a redução da população residente devido à extinção de serviços ligados ao funcionamento do Aeroporto e à manutenção da estrutura habitacional, à separação ANA/NAV levaram a uma progressiva degradação e abandono. Enfrenta hoje, por isso, enormes e complexos problemas em termos da sua rede viária e caminhos de acesso às habitações, rede elétrica, sistema de abastecimento de água e saneamento obsoletos e em mau estado, proliferação de construções ilegais, abandono e degradação do edificado, má conservação dos espaços exteriores, de entre outros.
Foto - Aníbal C. Pires
Durante anos a zona manteve-se sob propriedade da ANA Aeroportos e a falta de vocação desta empresa para a gestão urbanística e o seu desinteresse em relação aos bairros levou a um progressivo agravamento dos problemas. Os moradores assistiram impotentes à degradação das suas habitações sem que obtivessem respostas por parte do gestor (ANA) e do proprietário (Governo da República). Igualmente lhes foi vedada a possibilidade de adquirir os imóveis que habitavam.
A transferência da propriedade dos terrenos onde este conjunto urbano está implantado para o domínio privado da Região, que foi acordada em protocolo entre o Governo Regional e o Governo da República no ano de 2011, tardou a ser concretizada e só após a aprovação da proposta do PCP que resultou na Resolução da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores 4/2013/A, de 21 de Fevereiro, o Governo da República publicou o Decreto-Lei 66/2013, de 17 de Maio, que oficialmente desafetou os terrenos em causa do domínio público aeroportuário do Estado e os transferiu para o domínio privado da Região Autónoma dos Açores, tendo-se assim removido um grande obstáculo legal para que pudesse ser contemplada uma intervenção de fundo em termos da reabilitação e revitalização desta zona urbana e abre a possibilidade da venda das casas e terrenos.
A transferência deste enorme conjunto urbano para a posse da Região não deve ser encarada como um problema ou apenas como uma despesa acrescida para o poder regional. Pelo contrário, tem de ser considerada como uma oportunidade de encetar um amplo processo de renovação urbana que poderá ter significativos impactos positivos na vida das populações e na economia da ilha de Santa Maria recriando aquele espaço urbano de excelência e criando uma nova cidade-modelo num território que é, por excelência, a zona de expansão urbana de Vila do Porto e que pode ser uma importante âncora para o desenvolvimento da ilha de Santa Maria e, por consequência, para o desenvolvimento regional.

Horta, 27 de Abril de 2015

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 29 de Abril de 2015

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