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Dizem-nos os entendidos em economia que o aumento dos juros de referência do Banco Central Europeu (BCE) tem por finalidade travar o aumento da inflação. A receita é conhecida e a minha geração já experienciou, por diversas vezes, esta “fórmula mágica” com os efeitos que lhe conhecemos: empobrecer alegremente ao ritmo da batuta da especulação económica e financeira. A economia e os economistas deixaram, há muito tempo, de exercer o fim primeiro da sua razão de ser e obliteram uma das principais variáveis que alicerçam a sua existência: a redistribuição justa e equitativa da riqueza gerada. A economia deixou de ser uma ciência para ser um nocivo jogo de adivinhação (probabilidades) e os economistas são meros instrumentos robotizados de um modelo social, económico e político desenhado para concentrar riqueza e perpetuar o domínio de alguns (poucos, muito poucos) sobre uma imensa maioria.
A solução para qualquer problema tem de, ou deve ser, construída tendo como principal premissa as suas causas e, naturalmente, para motivos diferentes as soluções devem ser distintas, por outro lado se as medidas paliativas de combate ao aumento da inflação, em determinado momento, são necessárias é, porém, na eliminação das causas que reside a solução para o seu controle efetivo, mas o que assistimos ciclicamente e de forma linear é à aplicação da mesma receita, independentemente, do que lhe está na origem, ou seja, para travar o aumento da inflação aumentam-se os juros de referência, com as perniciosas e conhecidas consequências sobre as famílias e as economias. Os “analistas” de economia e finanças estão divididos quanto à decisão que o BCE vier a tomar durante o mês de setembro. As probabilidades, segundo os especialistas, dividem-se pela manutenção das taxas de referência ou, por um novo aumento (ganharam os segundos). Como se pode verificar os “analistas”, como é habitual, acertaram neste intrincado processo de adivinhação, acrescentam, ainda, que no caso de os juros não sofrerem um novo aumento isso se ficará a dever aos efeitos negativos que pode provocar nas economias da União Europeia (UE), algumas delas, e isto sou eu que digo, já se encontram à porta da recessão o que não significa que os juros não voltem a aumentar pois, os dogmáticos neoliberais que detêm o poder de decisão mandarão a senhora Christine Lagarde fazer o que melhor satisfaz os seus interesses.
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A subida da inflação está diretamente ligada aos desequilíbrios entre a procura e a oferta, o aumento da procura ou um déficit na oferta fazem oscilar os preços dando origem ao incremento, mais ou menos, descontrolado dos preços ao consumidor. A inflação pode, também, resultar do aumento dos custos de produção (matérias-primas, energia, custos do trabalho), de eventos imprevisíveis (catástrofes naturais, guerras híbridas), ou, ainda, de políticas monetárias expansionistas, de entre outros fatores, ou com a ocorrência de duas ou mais causas em simultâneo. A acrescer às variáveis endógenas aduzem-se outras, como seja a especulação. Vejam-se os lucros indecorosos das grandes centrais de compras e distribuição de produtos alimentares e de uso doméstico, das empresas que comercializam a energia e os combustíveis, ou, ainda, da banca, e, por outro lado o continuado empobrecimento da população que, uma vez mais, é vítima dos erros e opções económicas e políticas feitas em seu nome e justificadas como se da sua salvaguarda se tratasse, mas também alicerçadas num modelo social e económico, apresentado e aceite como sustentável e, como tal, acolhida sem reservas pela generalidade da população portuguesa e da UE. Estou a pensar, por exemplo, na destruição do setor agrícola e da desindustrialização, impostas pelas políticas comuns emanadas da UE e que contribuíram para uma crescente dependência de produtos alimentares e da energia. O aumento da dependência de produtos alimentares e das fontes energéticas, no atual contexto, é demonstrativo do quanto têm sido erradas as políticas comuns da UE.
Qualquer leigo, como eu, identifica um conjunto de fatores que, para além dos efeitos das opções políticas que corroem os setores produtivos em Portugal e no espaço da UE contribuem para justificar a subida dos preços de bens e serviços e, por conseguinte, o aumento da taxa de inflação.
A paralisação económica provocada pelas medidas de confinamento tomadas para enfrentar o grave problema de saúde pública que surgiu em 2020, a guerra híbrida entre os Estados Unidos e a China, tendo como face mais visível a guerra russo-ucraniana, e, por via do conflito, um interminável pacote de sanções à Rússia que, como cedo se percebeu, afetou mais as economias da UE do que o país sancionado. Estes dois eventos, digamos imprevisíveis, justificam, em parte, o aumento dos preços no espaço económico da UE, mas foi o efeito boomerang das sanções e a dependência energética que contribuiu para o aumento dos preços, ainda assim, nem tudo é resultante direta destas circunstâncias. Talvez se possa acrescentar alguns sinais de expansionismo monetário se considerarmos o comportamento dos bancos centrais na resposta à crise de 2007/2008. Se bem se lembram os juros de referência desceram o que permitiu acesso facilitado ao dinheiro, era necessário injetar dinheiro na economia e recapitalizar a banca. As famílias beneficiaram da baixa das taxas de referência, mas a preocupação não era, nunca é, a população o objetivo era, é sempre, a salvaguardada do setor financeiro que, como sabemos, foi o responsável pela crise do subprime.
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Não posso afirmar, com segurança, que o equilíbrio entre a procura e a oferta esteja a contribuir para o aumento da taxa de inflação, ou seja, não tenho dados objetivos que me permitam concluir que se regista um aumento na procura, os parcos rendimentos dos portugueses não o possibilitam, nem tenho conhecimento que exista escassez na oferta, não pela produção nacional, mas pelo recurso às importações. Sei, contudo, que os custos da energia constituem uma importante variável na formação do preço dos produtos e serviços. E, na verdade, o aumento dos combustíveis, do gás e da eletricidade influencia o custo final de produtos e serviços, ainda que, fiquem por explicar os lucros imorais das empresas que negoceiam no setor da energia. Sei também, sabemos todos, que nem todos os males podem ser imputados ao conflito russo-ucraniano.
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O aumento dos juros tem sido a receita, mas como muito bem se sabe existem outros mecanismos que, sendo igualmente paliativos, podem ser utilizados para travar o aumento da taxa de inflação, como seja, o controle de preços. Como disse esta não é uma medida que salvaguarde as economias de outros ciclos inflacionários, mas pode e já devia ter sido adotada pondo termo à especulação de preços que as grandes centrais de compras e distribuição estão a praticar. O controle de preços ou a subida das taxas de juro não são a solução e qualquer destas medidas pode provocar danos colaterais. A opção tem sido pela continuada subida do preço do dinheiro procurando reduzir a procura e penalizando as famílias, em particular, com créditos à habitação, ao invés do controle dos preços que beneficiaria a população e punha fim a um dos fatores exógenos que mais tem contribuído para a subida da taxa de inflação:
a especulação.
O aumento e diversificação da produção nacional é, contudo, a opção de médio e longo prazo que melhor pode assegurar a redução da pressão inflacionária. Em Portugal andamos desde 1986 a auto- destruir a nossa capacidade produtiva e, por conseguinte, a perder soberania deixando-nos expostos e permeáveis aos contextos externos, às “jardinices” do Borrel e aos desvarios de Ursula von der Leyen.
Arranhó, 15 de setembro de 2023
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 20 de setembro de 2023
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