quarta-feira, 26 de junho de 2024

minérios e meio ambiente

imagem retirada da internet



Excerto de texto para publicação na imprensa regional (Diário Insular) e, como é habitual, também aqui no blogue momentos.





(...) Os cidadãos podem até ficar bem com a sua consciência ao contribuírem para a sustentabilidade ambiental quando optam por um carro elétrico, mas não devem deixar de se questionar sobre a origem dos componentes das baterias, os impactos ambientais negativos que produzem, as condições de trabalho de quem extrai esses minérios e as fontes de energia que são utilizadas para a produção da eletricidade que carrega as baterias do carro. Nem tudo é tão linear e limpo como nos querem fazer crer.

A breve reflexão, sobre o contributo para a sustentabilidade ambiental que a transição dos carros de combustão para os carros elétricos, não pretende mais do que alertar para a forma como a publicidade nos vende “gato por lebre”, e para a importância de nos mantermos informados e, assim, menos permeáveis às agressões da propaganda, mesmo quando aliadas a “nobres” princípios. (...)


quinta-feira, 13 de junho de 2024

mais do mesmo

A complexidade dos diferentes cenários e contextos políticos nacionais dos países membros da União Europeia, a situação global e o investimento do poder financeiro nas candidaturas que, de momento, melhor o servem, ditaram os resultados das eleições para o Parlamento Europeu (PE).

Se fiquei satisfeito, não. Se fui surpreendido, também não. Claro que se for olhando para os pormenores poderei encontrar alguns motivos de satisfação e algumas perplexidades, mas não são suficientes para contrariar a ideia geral que pouco, ou nada, vai mudar no rumo que a União Europeia tem vindo a trilhar. 

O Partido Popular Europeu (PPE) e o Partido Socialista Europeu (PSE) continuam a ser as duas maiores famílias políticas do novo PE e, ainda que sem maioria dos assentos parlamentares, encontrarão nos Liberais, ou num outro parceiro de ocasião, o necessário apoio para dar continuidade às políticas de desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, de concentração de riqueza, de escalada armamentista e belicista, com os inerentes custos sociais e económicos para os trabalhadores e povos dos países membros, mas também para o mundo. Nada de novo, nem de bom, se configura para o futuro próximo, ou seja, mais do mesmo. Nem mesmo o crescimento da extrema-direita, aquém do que foi projetado e alimentado, chega a ser motivo para tecer outras considerações, para além da que se segue: os tumores, mais tarde ou mais cedo, serão extirpados.

Os efeitos produzidos na política interna de cada um dos membros da União Europeia (UE) são diversos e sujeitos a leituras políticas, igualmente distintas, que produziram e irão produzir efeitos colaterais, uns mais catastróficos que outros. Se é verdade que a natureza dos atos eleitorais é diferente existem, contudo, efeitos presentes e futuros nas políticas internas dos Estados membros que resultaram ou resultarão diretamente dos resultados eleitorais para o PE, ainda que e como já referi, não se prevejam alterações ao rumo neoliberal que tem vindo a caraterizar as políticas internas dos Estados membros e da União Europeia. Rumo que só será invertido, mais tarde ou mais cedo, com a luta dos trabalhadores e dos povos.

Não deixa, contudo, de ser interessante quando olhamos para os resultados de cada um dos Estados membros e tentar perceber as lógicas eleitorais que levaram às “vitórias” e “derrotas” de alguns agrupamentos políticos que atualmente exercem(ciam) o poder. As razões da derrota de Macron, em França, podem justificar a vitória de Meloni, em Itália, ou seja, ambos apoiam a escalada armamentista da EU, e não ajuízo sobre as escolhas dos franceses nem dos italianos, embora me preocupe. Quero com isto dizer que em relação às políticas internas e externas da União Europeia não são claras as diferenças entre Meloni e Macron, sendo que os dois comungam de ideais de direita, ainda que Meloni tenha a marca da extrema-direita e Macron, sendo-o, tem evitado essa distinção em grande parte devido a Marine Le Pen que assume e vocifera aos sete ventos que o é, retirando a Macron esse estatuto. Quer um quer outro foram subscrevendo as políticas da União Europeia da qual Ursula von der Leyen tem sido o rosto e almeja continuar a ser, ou quiçá, a assunção de um qualquer outro cargo de servente da política externa dos Estados Unidos ou do seu braço armado.

Não pretendo enfastiar os leitores com leituras país a país ou servir de mediador na leitura dos resultados eleitorais para o PE, mas sempre direi que, com uma ou outra exceção, a direita e a extrema-direita saiu, como era expetável, reforçada. Os efeitos desse aumento não vão contribuir para alterações substantivas, apesar dos discursos inflamados dos partidos populistas em campanha eleitoral pois, como todos compreendemos a “governação” da UE depende mais dos “arranjos” entre as maiores famílias políticas e os parceiros de ocasião, do que da intervenção dos deputados no PE.

O discurso oficial do PPE e do PSE denota alguma preocupação com o crescimento da extrema-direita, mas têm a sido as opções políticas destas duas famílias políticas que criaram as condições para o crescimento da extrema-direita nos países da UE e agora no aumento da sua representação no PE. As preocupações que o PPE e o PSE perante este fenómeno são um exercício de hipocrisia e de desculpabilização pelas responsabilidades que lhe podem ser imputadas, ao longo de dezenas de anos, pela desestabilização e promoção de conflitos bélicos (Líbia, Iraque, Síria, Ucrânia de entre outros), a queda dos pilares fundacionais deste projeto social e económico ao qual se pode juntar a gradual perda de soberania dos estados-membros e a sempre anunciada, mas inatingível coesão social e económica.

A deriva neoliberal que os governos dos estados-membros liderados por partidos ditos populares, sociais democratas e “socialistas” e a sua sujeição aos interesses dos Estados Unidos, a permeabilidade da governação da UE aos grandes grupos económicos e financeiros apátridas e uma incompreensível, ou não, sujeição aos interesses dos Estados Unidos escancararam as portas à extrema-direita neofascista, ou seja, à penetração dos discursos nacionalistas, de intolerância e de culpabilização do outro que alimentam as frases curtas e repetitivas tão características dos partidos populistas e neofascistas.

A UE tem vindo a abandonar a ideia de um espaço de liberdade, igualdade e cooperação, eu diria, que as atuais proclamações e atuação das diferentes instâncias políticas da EU escalam uma crescente restrição das liberdades e dos direitos sociais e laborais, mas também direitos políticos e culturais. As operações de falsificação da história impõem o pensamento único e difundem conceções fascizantes através dos meios propagandísticos oficiais, promovendo conceitos racistas xenófobos, chauvinistas e discriminatórios, ou seja, coloca em causa o princípio da igualdade consagrado nas cartas dos direitos humanos.

A pandemia, a inflação, a guerra e as sanções têm justificado um acentuado aumento das desigualdades e da injustiça social, seja pela desvalorização do trabalho (desemprego, precariedade e baixos salários), seja pelo aumento da inflação e das taxas de juro.

As opções políticas da UE provocam a acumulação e concentração da riqueza sendo que os principais beneficiários têm sido os grupos financeiros, farmacêuticos, de armamento, de energia, do agro-negócio e da grande distribuição.

Os efeitos destas opções políticas manifestaram-se de forma diferente nos estados-membros, mas todos sentiram o peso da inflação, o aumento dos custos da energia e os ataques aos direitos sociais e laborais.

Existem bastas razões para os cidadãos estarem descontentes com os seus governos e com a UE, a forma como manifestaram esse desagrado ou apoio foi diversa, o que não me surpreendeu, como referi anteriormente, mas também não me deixou satisfeito pois, o novo quadro parlamentar não vai inverter o rumo de empobrecimento dos cidadãos da UE. 

Ponta Delgada, 11 de junho de 2024 

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 12 de junho de 2024

1984, de George Orwell

foto de Aníbal C. Pires
Esta nota surge devido a um comentário feito na minha página do Facebook e me criticava por ter publicado uma imagem da capa sem qualquer apreciação crítica.

Não pretendo com este texto fazer apreciações literárias apenas e tão-somente deixar algumas impressões sobre a atualidade deste livro que, não o sendo, parece premonitório.

“1984” de George Orwell, foi escrito em 1948, daí resulta o título. Quando esta obra distópica deu à estampa, em 1949, foi considerada, em razão do contexto histórico e político, uma contundente crítica aos regimes totalitários, e em particular à União Soviética.

Na época, 1948, a chamada guerra fria e o processo de reescrever a história estava nos seus primórdios. À data a obra de Orwell e durante alguns anos serviu como um suporte de propaganda para travar a influência dos ideais marxistas-leninistas nas sociedades ocidentais, ainda que sem sucesso pois, como sabemos o declínio eleitoral dos partidos comunistas, em particular na Europa, só veio a acontecer algumas dezenas de anos depois e por opções próprias que os transformaram em organizações partidárias, direi, sociais-democratas e igual a muitas outras já existentes.

Bem, mas, isso não vem ao caso. Importa hoje constatar que “1984” retrata, não tendo sido a finalidade de Orwell, a sociedade atual, em particular as sociedades do chamado “Norte Global”, vejamos:

- a “novaescrita” – as alterações semânticas como, por exemplo, “colaborador” ao invés de trabalhador:

- o “Grande Irmão” – as redes sociais que tudo vigiam e controlam;

- “2+2=5” – controle sobre a realidade, ou seja, as “fake news”, notícias falsas;

- “buraco da memória” – censura (temos no espaço da União Europeia, vários órgãos de comunicação social proibidos) e todo o processo, em curso, de reescrever a história.

- perseguição e prisão – Julian Assange, Pablo Gonzalez, Pablo Házel, de entre outros. Mas também a perseguição e a repressão sobre, por exemplo, os manifestantes contra o genocídio em Gaza.

"1984", ao contrário do “suposto” objetivo do autor e da propaganda anticomunista, transformou-se numa obra cuja atualidade é pungente, por isso a reli e aconselho a ler.


Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 13 de junho de 2024


terça-feira, 11 de junho de 2024

a deriva neoliberal da UE

imagem retirada da internet



Excerto de texto para publicação na imprensa regional (Diário Insular) e, como é habitual, também aqui no blogue momentos.





(…) O discurso oficial do PPE e do PSE denota alguma preocupação com o crescimento da extrema-direita, mas têm a sido as opções políticas destas duas famílias políticas que criaram as condições para o crescimento da extrema-direita nos países da UE e agora no aumento da sua representação no PE. As preocupações que o PPE e o PSE perante este fenómeno são um exercício de hipocrisia e de desculpabilização pelas responsabilidades que lhe podem ser imputadas, ao longo de dezenas de anos, pela desestabilização e promoção de conflitos bélicos (Líbia, Iraque, Síria, Ucrânia de entre outros), a queda dos pilares fundacionais deste projeto social e económico ao qual se pode juntar a gradual perda de soberania dos estados-membros e a sempre anunciada, mas inatingível coesão social e económica.

A deriva neoliberal que os governos dos estados-membros liderados por partidos ditos populares, sociais democratas e “socialistas” e a sua sujeição aos interesses dos Estados Unidos, a permeabilidade da governação da UE aos grandes grupos económicos e financeiros apátridas e uma incompreensível, ou não, sujeição aos interesses dos Estados Unidos escancararam as portas à extrema-direita neofascista, ou seja, à penetração dos discursos nacionalistas, de intolerância e de culpabilização do outro que alimentam as frases curtas e repetitivas tão características dos partidos populistas e neofascistas. (…)


sábado, 1 de junho de 2024

mulheres da Palestina - a abrir junho

Mulher palestina: coragem, luta, resistência, mãe, poesia. 

E é com a poesia de Mahmoud Darwish que o “momentos” abre junho.







À MINHA MÃE

Tenho saudades do pão da minha mãe,

Do café da minha mãe,

Do carinho da minha mãe...

Estou a crescer,

De dia para dia,

E amo a vida, porque

Se morresse,

Teria vergonha das lágrimas da minha mãe!

Se um dia voltar, faz de mim

Uma sombrinha para as tuas pálpebras.

Cobre os meus ossos com a erva

Baptizada sob os teus pés inocentes.

Ata-me

Com uma mecha dos teus cabelos,

Um fio caído da orla do teu vestido...

E serei, talvez, um deus,

Talvez um deus,

Se tocar o teu coração!

Se voltar, esconde-me,

Lenha, na tua lareira.

E pendura-me,

Corda da roupa, no terraço da tua casa.

Falta-me o ânimo

Sem a tua oração diária.

Envelheci. Faz renascer as estrelas da infância

E partilharei com os filhos das aves,

O caminho do regresso...

Ao ninho onde me esperas!


Mahmoud Darwish