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A proximidade do ato eleitoral, a euforia de alguns, a demissão de outros e a afirmação, institucional e na rua, de quem não se verga, nem desiste, mas resiste, dizem bem da forma como os diferentes partidos políticos se posicionam, ao que veem e ao que estão. E julgo que, para já, é suficiente, pois, qualquer tentativa de expressar opinião sobre o assunto seria completamente improdutiva, não passou tempo suficiente, a poeira ainda não assentou e, como tal, a visibilidade está aquém do que é desejável para tecer considerações sobre as contradições em que este novo quadro parlamentar se irá, com naturalidade, enredar.
Resta a firmeza da luta a que os resistentes nos habituaram ao longo dos seus 104 anos de existência em unidade com os amantes da liberdade, da democracia e de um Estado que continue a garantir os direitos sociais, laborais, culturais e políticos, tendo como referencial a Constituição da República Portuguesa que, apesar das sete revisões a que foi sujeito o texto fundador do Portugal de Abril e de todas as tentativas para lhe retirar o essencial das conquistas da Revolução, ainda mantém a matriz que a afirmou como uma das mais progressistas da Europa.
Como já se percebeu não é sobre os resultados eleitorais e do que que se lhe segue que versa o texto que hoje partilho com os leitores.
O mundo gira, e gira cada vez mais rápido. E o que está a acontecer fora das nossas fronteiras, muitas vezes ignorado ou manipulado, terá um impacto muito mais profundo na vida dos povos do que os acordos parlamentares internos. Portugal à semelhança do chamado Ocidente parece descurar todas as alterações que estão a acontecer um pouco por todo o Mundo.
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Vivemos tempos de viragem histórica. O mundo está a mudar diante dos nossos olhos, os centros de decisão estão a deslocar-se e os dirigentes políticos ocidentais atuam como se nada tivesse sido alterado e parecem continuar a viver no passado glorioso que já não existe. A arrogância geopolítica, a fé cega no dólar, a moral seletiva e a cegueira estratégica estão a deixar os dirigentes europeus e estado-unidenses à margem de uma nova ordem internacional em formação. Se os dirigentes políticos continuarem a ignorar as profundas alterações que se têm verificado no xadrez geopolítico mundial e a não participarem na mudança avizinham-se tempos difíceis para os povos do chamado ocidente ou, se preferirem, do Norte Global, embora existam diferenças concetuais entre um e outro, mas que neste caso, retirando as questões culturais e históricas, se pode considerar uma e a mesma coisa, pois, os países que não pertencem ao ocidente, mas fazem parte do chamado Norte Global, estão politicamente alinhados a ocidente.
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Vejamos então algumas transformações e podemos começar pelos BRICS. Os BRICS alargaram-se e já deixaram de ser de ser apenas uma sigla económica para se tornar um projeto político em expansão, representa hoje uma alternativa real ao modelo imposto pelo Ocidente desde o fim da chamada Guerra Fria. A sua recente e continuada expansão, os movimentos coordenados para reduzir a dependência do dólar, a chamada desdolarização, e os acordos comerciais bilaterais em moedas locais, mostram que há vida (e poder) para lá de Washington e de Bruxelas. A multipolaridade deixou de ser um cenário hipotético e já está em construção, diria mais, o processo está em movimento acelerado.
Enquanto isso, a União Europeia continua a agir como um apêndice político dos Estados Unidos. No caso do conflito na Ucrânia, os líderes europeus alinharam cegamente com a estratégia da OTAN, mesmo depois de se tornarem óbvios os custos económicos, sociais e energéticos dessa decisão. A diplomacia foi substituída por slogans, e o realismo geopolítico, pelo pensamento ilusório (wishful thinking). Veja-se por exemplo: a Rússia não foi derrotada, (como se desejava) a Ucrânia está devastada (como previa quem racionaliza o conflito) e a Europa mais dependente e dividida do que nunca, como era óbvio que viesse a acontecer face ao efeito boomerang das sanções impostas à Rússia.
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imagem retirada da internet - Ibrahim Traoré, Presidente do Burquina Faso |
Na América Latina, o mapa político mudou. México, Colômbia, Venezuela e Brasil estão a afirmar soberania e a questionar décadas de submissão ao Fundo Monetário Internacional e aos interesses estado-unidenses, não são mais o quintal do seu vizinho do Norte. O Sul Global está a criar as suas próprias alianças, os seus próprios fóruns, a sua própria linguagem política, e veja-se o despropósito, não está à espera da aprovação de ninguém.
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E no meio de tudo isto, a China observa, investe, negocia, constrói infraestruturas, assegura matérias-primas e alarga a sua esfera de influência sem precisar de usar bombas. Pequim não precisa de ser perfeita, basta-lhe ser consistente. E está a conseguir impor-se, pacificamente, como uma potência económica e tecnológica, mas também militar para afastar qualquer devaneio na agonia da unipolaridade.
O mundo unipolar, centrado nos Estados Unidos, está a morrer. Diria que está no estertor final, ou já só lhe faltará a certidão de óbito. Os herdeiros desse mundo, os dirigentes ocidentais, recusam-se a aceitar o óbvio e o óbito e continuam a discursar como se tudo fosse reversível, como se bastasse manter as sanções, repetir mantras democráticos e financiar mais umas guerras por procuração de que a história está repleta, mas não precisamos recuar no tempo para encontrar exemplos, acontece na Ucrânia e, mais recentemente na Síria.
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Ponta Delgada, 27 de maio de 2025
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