A Constituição da República Portuguesa e a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) não consagram explicitamente nenhuma referência à diversidade cultural que caracteriza a Escola.
Embora não contenha uma vertente multicultural explícita, a LBSE permite olhares e interpretações diversas em função dos interesses e ideologias do observador.
O conceito de multiculturalidade pode inferir-se do princípio da igualdade de oportunidades consagrado na Constituição nomeadamente no domínio da Educação.
O multiculturalismo, no Sistema Educativo português, enquanto conjunto de princípios e práticas dos vários domínios institucionais, decorreu das pressões das minorias étnicas, sobretudo de origem africana, assume alguma relevância no início da década de 90 do sec. XX, embora que de uma forma incipiente e, mais tarde no limiar do séc. XXI, quando o fenómeno da imigração atingiu uma dimensão e diversidade à qual o poder não conseguiu evitar o alheamento.
Foi no domínio da educação, apesar das limitações das leis de enquadramento, que em Portugal se tomaram as primeiras iniciativas políticas formais em relação às minorias com a criação do Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural em Março de 1991.
A esta iniciativa outras se seguiram com maior ou menor alcance mas sempre desintegradas e por isso mesmo de eficácia duvidosa.
O Projeto de Educação Intercultural que vigorou nos anos escolares 1993/94 e 1996/97 focalizou-se em, apenas, 49 escolas do ensino básico situadas em zonas de residência de populações pertencentes a minorias étnicas e com elevada percentagem de insucesso escolar.
O Projeto de Educação Intercultural podendo ter um grande alcance pedagógico, pois uma das finalidades era a formação da comunidade educativa viu a sua ação limitada no tempo e no espaço.
O passado colonial português e a ditadura que se mantiveram até 1974 dificultaram posteriormente a introdução de mudanças, no domínio institucional, em sentidos multiculturais, embora a sociedade e a Escola sejam de há muitos espaços de coexistência multicultural.
A ‘velha’ Escola etnocêntrica, reprodutora do modelo social e cultural dominante e como tal promotora da aculturação, e a mais recente, Escola multicultural, igualmente reprodutora dos modelos sociais dominantes, mas também, redutora pois relaciona a multiculturalidade apenas a minorias étnicas desfavorecidas às quais estão, normalmente, associados fatores negativos e não considera, por exemplo, que a Escola que acolhe crianças vindas de outras zonas do país é igualmente multicultural.
A Escola etnocêntrica ao não reconhecer a diversidade cultural e procurar a homogeneização e a assimilação por razões marcadamente ideológicas e a Escola multicultural imposta pela dinâmica social e assumida apenas, por algumas escolas, docentes e investigadores, para fazer face a uma realidade social e ao seu reflexo na Escola, não atenderam ao problema, para nós central, da diversidade cultural e da comunicação intercultural a primeira, desde de sempre presente na Escola e a outra quase sempre ausente.
A administração da educação em Portugal não tem assumido seriamente a diversidade cultural dos alunos que as escolas acolhem e os docentes enfrentam diariamente e os problemas que essa realidade acarreta para toda a comunidade educativa e em particular para os jovens alunos.
A dimensão do problema, em nossa opinião, não se soluciona com o eterno discurso de apelo à criatividade das escolas e dos docentes nem com a tomada de medidas avulsas com efeitos localizados e de carácter de emergência.
Só com o reconhecimento do outro, em toda a sua dimensão é possível passar da mera coexistência multicultural para o convívio intercultural e caminhar para a educação intercultural.
Nota: Este texto foi escrito em Maio de 2003, hoje foi revisto e objeto de correções e pequenas alterações. Passados que estão quase 10 anos sobre esta reflexão na Escola nada mudou, ou melhor tudo mudou... para pior.
Horta, 13 de Janeiro de 2012
Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 14 de Janeiro de 2013, Ponta Delgada
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