quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Acautelar

Dois sismos a Sul do Pico, alerta vermelho devido à forte agitação marítima, previsão de neve para os próximos dias, este novo ano promete. Mas não são os fenómenos meteorológicos, tectónicos ou vulcânicos que me preocupam, quem vive por aqui habituou-se a lidar com estas e outras adversidades naturais. Preocupantes mesmo são outras desventuras. O que me inquieta são as mutações políticas de que a Região, o País e o Mundo, dito primeiro e desenvolvido, estão a sofrer. Os fenómenos naturais não se podem evitar, podem prever-se e, com isso acautelar males maiores, mas não se podem banir, já as transformações políticas em curso podem controlar-se, podem evitar-se, podem banir-se, dependendo apenas da vontade coletiva dos povos e do exercício pleno dos direitos e deveres cívicos e políticos, condição necessária para a qualidade da vida democrática.
Em Portugal temos um Presidente e um Parlamento legitimados pelo voto popular, e um Governo cuja validade lhe é conferida pelo acordo político de uma maioria parlamentar bipartidária. Não colocando em causa a legitimidade formal destes órgãos de soberania, essa existe, mas diria que a legitimidade popular há muito lhes foi retirada. Conclusão que se pode inferir de todos os indicadores, objetivos e subjetivos, disponíveis. Sendo assim pergunto-me o que ainda estão a fazer no exercício dos cargos para que foram eleitos ou nomeados, se a maioria do Povo português não se identifica nem com as personalidades, nem com as opções e medidas políticas que têm sido tomadas pela maioria parlamentar, pelo governo e pelo Presidente da República.
O contrato social celebrado nos atos eleitorais não está a ser cumprido e não há crise nem resgate financeiro que o justifique ou desculpe, desde logo, o Presidente da República pois é a ele que cabe zelar pelo cumprimento da Constituição que jurou cumprir e fazer cumprir.
O incumprimento do contrato social celebrado entre os eleitores e os eleitos devia constituir razão suficiente para a sua demissão. Demissão que podia e devia ser concretizada pelo Presidente da República com a dissolução da Assembleia da República e a convocação de novas eleições legislativas. É um poder do Presidente da República, é um poder que Cavaco Silva se recusa a utilizar e, não é difícil perceber porquê. E os cidadãos interrogam-se, e os cidadãos interrogam-me, Não existem outros mecanismos políticos para por fim a esta catástrofe que atingiu os portugueses. E a resposta é invariavelmente a mesma, Há sim. A participação nas lutas sociais e políticas, a contestação pois, face ao contexto político que resultou dos atos eleitorais e que catapultou para o poder a direita neoliberal, não existe outra solução que exigir, na rua, a demissão do Governo da República.
Se situações como a que estamos a viver podem ser evitadas, podem. Podem e devem, como referi no início do texto, através da plena participação cívica e política, através de opções de voto esclarecidas e conscientes, só assim será possível acautelar, para o futuro, que o Governo e a Presidência da República, sejam de Portugal e não, meros delegados de um poder sem rosto e sem pátria que globaliza a desgraça. 
Ponta Delgada, 06 de Janeiro de 2014

Aníbal C. Pires, In Diário Insular et Açores 9, 08 de Janeiro de 2013 

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