Manuel Gusmão - imagem retirada da internet |
Excertos da nota do PCP sobre o falecimento de Manuel Gusmão:
"(...) Manuel Gusmão foi um criador no campo da arte e da intervenção social e política. Teve, através desses dois caminhos nele convergentes, toda uma vida dedicada à cultura: à cultura dos que resistem e lutam, dos que sobrevivem e criam, dos explorados e dos humilhados. Homem, intelectual, militante do seu tempo, intervindo sempre, na poesia e na militância, para fazer um tempo novo. Intelectual de uma profunda cultura, construída e alicerçada no estudo e na estreita ligação com os trabalhadores e o povo português. (...)"
"(...) Manuel Gusmão fala-nos da alegria, “contra todas as evidências em contrário”. Sabendo que a procurava sempre, e sempre com os seus camaradas e com os trabalhadores, porque “Nós somos a esperança que não fica à espera (...)”
um poema de Manuel Gusmão
VARIAÇÕES DO BRANCO
Ergues o olhar: surpreendes por instantes essa hora
em que o mundo envelhece: ténues as variações do branco
parecem dissolvê-lo numa longínqua música, anterior à chuva
em que o mundo envelhece: ténues as variações do branco
parecem dissolvê-lo numa longínqua música, anterior à chuva
Ou será então a imagem submersa de um filme a preto e branco
Há próximo um branco vibrante: o da cal ainda recente
mas que a humidade salina já a espaços mordeu,
recortando as feridas cinza na varanda a que vens.
Não há ninguém aqui. Quem te chame, digo.
Há o branco baço na parede que em frente em vão separa
rua e praia. Tendo já transposto essa fronteira incerta
ou erguendo-se para lá dela há o branco pobre da areia:
As dunas plenárias sustentam os corpos deitados de mar e céu.
Aí é agora o grande branco: o clarão velado e difuso
que guarda e distribui a memória embaciada do azul
e do verde, do oiro e da prata — uma lembrança vã.
Tu escreves no visível do mundo essa névoa branca e desolada
que o motor da paisagem produz. As folhas do ar são como
se fossem as levíssimas pétalas, as vagas sílabas de uma neve –
e essa névoa engolfa, atrasa e apaga na travessia os simulacros
das coisas supostas e imaginadas que o mundo te envia
enquanto esperas por alguém que não virá
enquanto esperas por alguém que não virá
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