O pacote de privatizações acordado pelo PS, PSD e CDS/PP com a sacra trindade que representa os interesses dos oligopólios financeiros e cujos rostos visíveis são os técnicos do FMI do BCE e da UE que com regularidade nos visitam, fazendo lembrar representantes de uma administração colonial ou imperial de visita à colónia ou ao protetorado. Mas, como dizia, no pacote de privatizações acordado estão, de entre outras, a empresa que gere as infraestruturas aeroportuárias em Portugal (ANA) e a companhia aérea nacional (TAP).
Ainda antes de partilhar um aspeto que penso possa vir a acontecer com a privatização de uma destas empresas públicas, não posso deixar de referir que o controle da navegação aérea, a NAV, EPE, esteve sem Conselho de Administração cerca de um ano. Período em que, no contexto da União Europeia, se discutiram questões tão importantes como a definição dos blocos funcionais no céu único europeu. Os prejuízos decorrentes da incúria do(s) governo(s) que deixaram esta empresa pública ao abandono, ainda estão por contabilizar, mas nada de bom daí resultou ou, a prazo resultará. Também a este respeito a Região tem interesses a defender e, neste quadro a ser ouvida sobre a estratégia da empresa no que concerne à Flight Information Region (FIR) Oceânica de Santa Maria.
É sabido do enorme passivo da TAP e julgo não ser do desconhecimento da generalidade dos cidadãos que este passivo decorre, não do facto de esta ser uma empresa pública mas, da gestão ruinosa que a tutela e o Conselho de Administração fizeram. Mas o passivo da TAP não é, certamente, o motivo da sua eventual privatização, aliás o setor privado não se mostraria interessado em adquirir a companhia aérea nacional se esta empresa não representasse um valioso ativo comercial. E o maior ativo da TAP serão, porventura, as suas rotas. Se outros interesses não houvesse que motivassem eventuais compradores, este não será, de todo, despiciente.
Mas, se é sabido dos passivos das companhias aéreas públicas é, igualmente conhecido que a ANA e a NAV apresentam resultados líquidos. Nem tudo o que é público é sinónimo de passivos.
A privatização da TAP para além de representar a perda de património público pode ter efeitos negativos sobre o funcionamento de outras empresas como sejam a ANA e a SATA, também elas públicas, embora estejam sempre na mira da saga privatizadora que continua a fazer doutrina em Portugal. Mas, então em que medida é que a privatização da TAP pode influenciar negativamente empresas como a ANA e a SATA?
A TAP e a SATA Internacional são os principais clientes da ANA (cerca de 60% da receita), por outro lado a SATA Internacional utiliza a engenharia da TAP para a manutenção das aeronaves.
A aquisição da TAP por parte de um consórcio que integra a IBERIA terá como um dos possíveis efeitos a deslocalização da sua base para Espanha. Se este cenário se verificar a ANA perderá uma receita considerável e a SATA deixará de poder contar com a manutenção da TAP em Lisboa. Este cenário terá como consequência a desvalorização da ANA e um crescendo de dificuldades para a SATA.
Até para os defensores das privatizações este é um cenário que não serve os interesses portugueses, designadamente, se a TAP for privatizada ainda antes da ANA pois, como é bom de ver, se a TAP for deslocalizada para Espanha, o valor da ANA pode cair abruptamente, por consequência quem defende um calendário de privatizações colocando a necessidade de privatizar a TAP antes mesmo da ANA não está preocupado com o país. Estará, certamente, a soldo de alguém. Mas, este é um panorama fictício qualquer semelhança com a realidade será pura coincidência.
O que fica dito reflete apenas algumas preocupações sobre eventuais cenários e não uma opinião especializada sobre diferentes componentes da aviação comercial, como sejam a navegação aérea, as infraestruturas aeroportuárias e as companhias aéreas públicas. São, porém, preocupações de quem se recusa a aceitar a delapidação do património público em nome de interesses apátridas.
Ponta Delgada, 11 de março de 2012
Aníbal C. Pires, In Jornal Diário, 12 de março de 2012, Ponta Delgada
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