As questões do desenvolvimento têm sido encaradas e promovidas tendo por base apenas uma das suas vertentes - o crescimento económico. O discurso oficial dos decisores políticos do chamado Mundo desenvolvido, Mundo ao qual pertencemos, desenvolveu ao longo das nas últimas décadas, diria, desde os anos 70 do século passado, uma narrativa centrada no crescimento económico como o único fator capaz de assegurar o desenvolvimento e o bem-estar para todos. São as teses do mercado livre e, da sua auto regulação. Mais tarde foram sendo introduzidos novos reforços para a sustentação desta narrativa como o da competitividade económica num Mundo globalizado, e assistimos sem grande oposição à transferência de capital do centro, países desenvolvidos e industrializados, para a periferia, países subdesenvolvidos ou em via de desenvolvimento, onde a mão-de-obra era abundante e barata, e aconteceram as deslocalizações das unidades de produção.
Nos países desenvolvidos, designadamente em Portugal, estava a iniciar-se o caminho da terciarização forçada da economia. Em Portugal e consequentemente nos Açores, desenvolvimento era sinónimo de terciarização e, assim as opções, todos nos lembramos ou, pelo menos, já ouvimos falar, assistimos serenamente ao desmantelamento dos setores produtivos e da transformação.
Paralelamente foi-se instalando uma outra tese para justificar, desta vez, o desmantelamento dos setores sociais do Estado, uma vez que tudo o que era produtivo foi sendo paulatinamente desbaratado para gáudio do setor privado e, foi-se assim instalando, no comum dos cidadãos, a ideia que o Estado é ineficaz e que a despesa com os setores sociais é, a curto prazo, incomportável. A estratégia vai dando os seus frutos e os decisores políticos, a mando do poder financeiro, estão em vias de concretizar esse desiderato.
A este propósito permitam-me um pequeno aparte. O “shutdown” que se verificou nos Estados Unidos até ao limite do incumprimento tem um objetivo muito claro, reduzir a presença da administração federal e diminuir a despesa pública dos Estados Unidos, com os seguintes efeitos que se irão verificar a prazo, despedimentos na administração federal e redução da despesa nos setores sociais, saúde, educação e segurança social, que como é como é sabido já tem um peso relativo no orçamento dos Estados Unidos, digamos, pouco mais do que simbólico.
Regressando à nossa Região e ao nosso País constatamos que a estratégia que está a ser seguida está descrita na cartilha dos teólogos do mercado livre, trata-se de executar agora a tese do “menos Estado melhor Estado”. E já não são apenas sinais. A educação, a saúde e a segurança social em estão a ser tomados de assalto pelo setor privado.
Esta narrativa foi, e é, ampliada pelas corporações mediáticas elas próprias propriedade dos oligopólios financeiros, a que a generalidade dos cidadãos acede, e que tende a uniformizar os hábitos e o pensamento. Eu diria que com algum sucesso pois, como diz o poeta, “há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não.”
A economia regional e a economia nacional tornaram-se, ainda mais dependentes. Na agricultura apenas os setores do leite, do vinho, do azeite e da cortiça têm expressão, nas pescas e apesar da dimensão da nossa linha de costa e da nossa Zona Económica Exclusiva não pescamos o necessário para satisfazer as nossas necessidades de consumo, por consequência não temos, longe disso, soberania alimentar. Dir-me-ão que nenhum país, ou poucos terão soberania alimentar, e eu concordarei, mas a verdade é que hoje estamos muito mais dependentes, em matéria alimentar, do que há 30 anos atrás.
O setor da extração e a indústria sofreram um processo de desmantelamento e os investimentos nesta área foram, no essencial, em indústrias de trabalho intensivo e desclassificado, ou seja, em indústrias que deslocalizáveis, porque lhes faltava a singularidade, a inovação e a tecnologia.
A crise que atualmente afeta os países desenvolvidos poderia ter um impacto menor na Região e no País se a nossa economia se tivesse fortalecido, contudo, as opções tomadas pelos decisores políticos, em nome da integração europeia, fizeram tudo menos salvaguardar a economia produtiva regional e nacional e, a crise instalou-se com todos os efeitos dramáticos que conhecemos, o aumento do desemprego, da pobreza e da fome.
Este caminho não era inevitável e sempre houve na Região e no País quem tivesse alertado para o rumo desastroso que Portugal estava a navegar.
Horta, 21 de Outubro de 2013
Aníbal C. Pires, In Jornal Diário, 21 de Outubro de 2013, Ponta Delgada
Sem comentários:
Enviar um comentário