Os pescadores queixam-se do baixo rendimento do seu trabalho, os armadores de pesca também têm as suas razões de queixa, os consumidores de peixe clamam por preços justos. Não se ouvem muitos queixumes dos comerciantes a não ser, é claro, dos transportes que lhes deixam o pescado nas placas dos aeroportos e dos elevados custos associados ao transporte aéreo.
A observação da realidade mostra que a montante e a jusante existe um problema por resolver, por outro lado na cadeia de comercialização, podem até existir problemas e razões para reivindicações, mas a havê-las não são tão visíveis aos olhos do observador pois os sinais indicam de forma inequívoca o sucesso económico dos comerciantes de pescado. Os pescadores continuam a ter, em algumas das nossas ilhas, uma relação de trabalho medieval, os armadores queixam-se da depredação dos recursos piscícolas por armações estrangeiras e dos custos de produção, os consumidores na Região pagam um preço do outro mundo, quando o podem pagar e, podem cada vez menos.
Os comerciantes há muito reivindicavam a liberalização do mercado, o Governo regional atendeu a reivindicação e publicou uma portaria que atende à pretensão dos comerciantes de pescado.
Qual o contributo desta medida para resolver o problema dos baixos rendimentos dos pescadores, dependentes do valor do pescado em lota, e do elevado preço a que o peixe chegava ao mercado com a imposição de uma margem de lucro que se situava nos 25%!? Quais os efeitos desta medida na gestão de stocks piscícolas!? Muitas outras questões se podem colocar sobre a bondade desta medida do Secretário Regional dos Recursos Naturais, mas tenho muitas dúvidas que o resultado não seja o esperado, para os consumidores e para os produtores/pescadores.
A importância do sector da pesca para a Região devia implicar uma atenção e um cuidado especial por parte dos poderes públicos. No mercado de comercialização de pescado fresco, a limitação do número de intermediários e a fixação das suas margens de lucro devia constituir-se como uma importante peça dessa regulamentação. A ineficácia da regulamentação agora alterada fica a dever-se à debilidade da atuação da inspeção regional das pescas e das atividades económicas.
Foi, assim, recebida com surpresa a Portaria 70/2013 de 30 de Setembro, que revoga a Portaria 50/90 de 11 de Setembro, abolindo a regulamentação que limitava a participação na cadeia a apenas um intermediário e fixava as margens máximas de comercialização e desregulando completamente este mercado tão importante para a Região. Com esta decisão, o Governo regional retira proteção aos pescadores e favorece apenas a multiplicação de intermediários, aumentando o preço final no consumidor, sem qualquer benefício para os produtores/pescadores/armadores.
Não são compreensíveis as razões que assistiram a esta inversão da política seguida até aqui na regulamentação do mercado de pescado fresco nos Açores e, afigura-se como uma decisão casuística, sem encadeamento numa visão global dos problemas do setor da pesca.
Angra do Heroísmo, 06 de Outubro de 2013
Aníbal C. Pires, In Jornal Diário, 07 de Outubro de 2013, Ponta Delgada
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