Foto by Aníbal C. Pires |
Nos Açores da autonomia sempre se olhou para a Madeira como mais afoita nas iniciativas do investimento público, e um segmento da sociedade açoriana, por vezes com uma pontinha de inveja, admirava a capacidade reivindicativa e empreendedora de João Jardim que, não tendo papas na língua, via as suas exigências junto de Lisboa satisfeitas ao passo que nos Açores as reivindicações não tinham a mesma força e, como tal, não seriam tão eficazes. O crescimento económico na Madeira era superior ao dos Açores e até na infraestruturação os ritmos nos Açores eram muito inferiores.
Sem contestar que numa comparação onde não se tem em linha de conta alguns aspetos e indicadores, a Madeira evidenciava diferença significativas em relação aos Açores, porém, não posso deixar de dizer que discordo em absoluto dessa visão que dava como adquirido que isso se devia aos órgãos de governo e, em particular, ao Presidente do Governo regional da Madeira, o Dr. Alberto João Jardim.
As duas regiões, sendo insulares, distantes e arquipelágicas, não são, nem podem ser avaliadas sem algumas precisões mesmo no que à geografia diz respeito, ou, sobretudo no que à geografia diz respeito. Se a geografia esteve na origem do abandono e no modelo político e administrativo que Lisboa, o Reino e a República lhe destinaram até à Revolução de Abril, foi também a geografia que contribuiu para que estes arquipélagos, desde o seu povoamento, tivessem especializações e percursos económicos diferenciados. Foi também a geografia que contribuiu para o reconhecimento do Estado, saído da Revolução de Abril, das especificidades destas regiões e tivesse consagrado na Constituição de 1976 as autonomias regionais. Claro que não foi só a geografia, as reivindicações autonomistas dos povos insulares foram determinantes para esse reconhecimento.
É também a geografia que está na base da decisão da União Europeia de reconhecer a um conjunto de regiões, insulares ou não, um estatuto especial no tratado, ou seja, um tratamento diferenciado para regiões ultraperiféricas, mas também aqui as reivindicações políticas regionais e nacionais assumiram-se como fundamentais para esse reconhecimento.
Mas voltemos à Madeira e aos Açores e às suas diferenças procurando, agora, aprofundar a que se se devem os motivos porque não se devem comparar, de forma linear, estes dois arquipélagos a quem foram politicamente conferidos, e bem, os estatutos autonómicos e de regiões ultraperiféricos.
Se na dimensão populacional se assemelha, o mesmo, para além de outras diferenças, não se pode dizer do território que no caso dos Açores, sendo maior, está pulverizado numa vasta área oceânica de 66 mil quilómetros quadrados, e esse é um atributo que não pode deixar se ser tomado em conta em qualquer olhar sobre os dois arquipélagos.
Foto by Aníbal C. Pires |
Neste texto não procuro avaliar quem fez as melhores opções políticas e económicas e, muito menos comparações sobre os estados de desenvolvimento das duas regiões autónomas. E se é inegável que estes 42 anos de autonomia transformaram a face dos dois arquipélagos, não é menos verdade que estão longe de estar resolvidas seculares questões como a pobreza e a baixa taxa de literacia. Dois indicadores que mais do que todo o betão e o asfalto dizem bem da natureza política de quem nos Açores e na Madeira tem exercido o poder. Os povos insulares continuam sob o jugo de um poder que tem vindo a perverter os desígnios autonómicos.
Ponta Delgada, 04 de Dezembro de 2018
Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 05 de Dezembro de 2018
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