Ao iniciar este texto faltavam poucos minutos para se realizar, aquela que pode ser a derradeira reunião, entre a Administração da SATA e a Plataforma Sindical que une os trabalhadores da transportadora aérea regional, antes de se iniciar o segundo período de greve previsto para os dias 2, 3 e 4 de Maio. Espero que este encontro acabe de forma positiva e que as partes, porque há partes, não há só uma parte, cheguem a entendimento.
E se as divergências que opõem a Administração do Grupo SATA aos seus trabalhadores é um assunto que diz, em primeira instância, aos próprios, não posso, contudo deixar de partilhar algumas preocupações que se foram adensando ao longo deste processo, desde logo, a campanha de intoxicação contra os trabalhadores do Grupo SATA feita junto da opinião pública regional, nas redes sociais virtuais ou não, e pela parcialidade da comunicação social, pública e privada, mas também pela forma como o próprio Governo Regional e a Administração da SATA conduziram, até agora, todo este processo. Faço-o enquanto cidadão que se preocupa com uma empresa pública, com a valorização do setor público regional e com a valorização do trabalho e dos trabalhadores.
Os trabalhadores de tudo foram acusados, porque são uns privilegiados, porque não têm alma açoriana, porque escolheram estas datas, porque querem destruir a empresa, tudo isto sem ao menos pensar que nenhum trabalhador põe em causa o seu posto de trabalho, tudo isto e mais o que a ignorância e o dogmatismo neoliberal vomitaram no espaço público regional. Nesta cegueira chegou-se ao ponto de sugerir um despedimento coletivo e o recrutamento de novos trabalhadores, enfim como se os trabalhadores deste setor, altamente especializado, fossem fáceis de substituir como o são os trabalhadores indiferenciados.
Quem fez esta campanha, fê-lo de forma consciente e nesta onda surfaram outros interesses, não terá sido por acaso que algumas vozes vieram terreiro defender a privatização da SATA, não terá sido por acaso que a questão das “low cost” assumiu, de novo, uma atualidade que há muito não tinha, veja-se por exemplo quantas vezes, nas últimas semanas, a Easy Jet, reafirmou direta ou indiretamente o seu interesse em operar nos Açores, nos Açores é como quem diz, numa das ilhas, vá lá talvez duas.
Mas para lá da lamentável campanha de intoxicação que foi promovida junto da opinião pública com a vergonhosa utilização dos sentimentos mais profundos do Povo Açoriano, outros aspetos me preocupam, designadamente informações vindas a público nos últimos dias, mas que já me preocupavam desde que o Programa do Governo de Vasco Cordeiro foi apresentado, discutido e aprovado na ALRAA, e que se relacionam com uma suposta intenção de operar uma profunda reestruturação numa das empresas do Grupo SATA, concretamente na SATA Internacional, suportada numa revisão das obrigações de serviço público e a consequente, facilitação às “low-cost” de operarem entre S. Miguel e Lisboa.
Quem fragmentou a SATA em várias empresas, quem criou a SATA Internacional, quem decidiu sobre o modelo organizacional, quem decidiu, quem decidiu foi o Governo Regional, e decidiu sem envolver os parceiros políticos, sociais e económicos. Agora diz-se, fala-se, dão-se uns palpites de que o Governo Regional vai acelerar, em virtude da greve dos trabalhadores da SATA, uma profunda reestruturação da SATA Internacional. Até posso considerar, e considero, que essa reestruturação seja necessária, desde logo a substituição da Administração, mas não posso é admitir que essa reestruturação não seja objeto de uma ampla discussão pública, não posso é admitir que essa anunciada estratégia de reestruturação sirva para ameaçar e coagir os trabalhadores nas vésperas de uma reunião negocial e do exercício de um direito constitucional, a greve.
Ponta Delgada, 30 de Abril de 2013
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 01 de Maio de 2013, Angra do Heroísmo
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