Revisitar os lugares vividos e a memória do tempo é um exercício de reencontro com o passado, embora os espaços e o tempo tenham adquirido os maneirismos e os caminhos de uma denominada modernidade fundada no acessório, no parecer, na imagem e na aculturação saloia que transforma os lugares em não lugares e onde o tempo não sobra às novelas e ao futebol.
Mesmo assim gosto deste exercício! Gosto destas viagens ao passado, num presente que maltrata o futuro.
Gosto, quando o tempo me sobra, de voltar aos lugares de construção da minha identidade cultural. É certo que resta pouco, muito pouco, à matriz cultural que me formou como pessoa igual e diferente a outros nascidos no mesmo tempo e espaço. Mas vou e gosto, gosto dos reencontros com o pouco que resta da identidade cultural que herdei e que me conferiu esta, e não outra qualquer, maneira de estar no Mundo.
E gosto! Gosto não pelo revivalismo ou pela nostalgia mas pelo prazer do reencontro e, sobretudo, pela afirmação da diferença num tempo de igualitarismos que emergem da globalização que mundializa os comportamentos e cava fossos que acentuam as diferenças na realização social e económica dos indivíduos e dos povos.
A padronização do comportamento faz-nos previsíveis e, naturalmente, objetos moldáveis ou, se preferirmos seres acríticos, incapazes de ter vontade própria. Afirmar a igualdade através da diferença é um exercício de cidadania e, um direito reconhecido e aceite universalmente, é por conseguinte uma forma de lutar contra a alienação e formatação do pensamento.
Mas nos reencontros com a memória dos lugares e do tempo há… encontros.
Encontros com pessoas deste tempo e que habitam estes lugares, pessoas que teimam em preservar a identidade e a memória coletiva que os faz diferentes. Pessoas que na afirmação da diferença exigem ser tratados como iguais.
E, também por isso é bom! Ou talvez, sobretudo, por isso! Pelas pessoas. Pessoas que têm tempo e, usam-no não o deixam passar.
Há pessoas que teimam em não deixar passar o tempo, há pessoas que teimam em não passar ao lado da vida… Vivem-na e transformam o presente a pensar no futuro.
(*) Este texto foi escrito na Covilhã no dia 10 de Agosto de 2007 e publicado na imprensa regional alguns dias depois. Recuperei-o para este espaço pois a pequena reflexão que encerra é, digo eu, intemporal.
Ponta Delgada, 26 de Maio de 2013
Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 27 de Maio de 2013, Ponta Delgada
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