segunda-feira, 14 de abril de 2014

Políticas culturais

Foto - Aníbal Pires
O parlamento regional discutiu, na última reunião plenária, uma proposta de DLR do PCP para criar o Conselho Regional de Cultura. Sabemos que em Março passado o Governo Regional tinha, por via de um DRR, criado um ente semelhante e que o PSD tinha apresentado um Projeto de Resolução que recomendava ao Governo isso mesmo, ou seja, esta é uma questão que aparentava reunir o consenso da generalidade das bancadas, E assim é. De facto, existe um acordo alargado em relação à criação de um Conselho para os agentes culturais da Região. No entanto, se existe consenso em relação a criar-se UM Conselho de Cultura, o mesmo já não sucede quando discutimos QUE Conselho de Cultura, com que composição e com que competências.
As divergências de opinião que existem, nomeadamente entre o PCP, o PSD e o PSD radicam em diferenças de posição política, direi mesmo em diferenças ideológicas, em relação à forma de encarar não só a cultura, mas também o papel e a intervenção dos parceiros sociais e a sua relação com os poderes públicos. E foi esse o fundo significativo da discussão. Que papel e que responsabilidades se querem atribuir aos agentes culturais da Região e que poder e influência é que estes devem ter sobre a atuação dos poderes públicos regionais. Se quiserem e de forma simples, tratava-se da permanente questão da relação entre Estado e Sociedade Civil, no caso vertente, o campo da cultura. 
Assim, estamos a falar de compartir efetivamente responsabilidades, de reconhecer a maioridade, capacidade e competência dos agentes culturais açorianos para assumirem um papel decisivo na condução da política cultural da Região. Foi esse o fundamento da proposta do PCP: dar poder aos cidadãos, através das suas organizações.
Para o PSD – que se limitou a recomendar ao Governo que delineasse um Conselho de Cultura – e para o PS, um Conselho de Cultura é uma coisa muito diferente. Não pretendem, longe disso, partilhar com os cidadãos o poder que tão ciosamente guardam para si. E, em relação às responsabilidades, reduzem-nas apenas à possibilidade de emitir opinião sobre as propostas que o Governo apresenta. 
Para o PSD e para o PS, um Conselho de Cultura deve ser um mero órgão consultivo que serve apenas para legitimar as opções políticas de quem estiver no poder num dado momento e, talvez, para dar alguma sugestão que o Governo possa achar útil.
Enquanto PS e PSD pretendem legitimar as opções da administração, o que o PCP pretendia, e pretende, é dar espaço para que os cidadãos tenham um papel decisivo na formação da política regional para a cultura. O que o PCP pretende é que a sociedade civil possa decidir, de forma vinculativa, sobre as opções para a área cultural. Para quem não temos medo da participação ativa dos cidadãos, trata-se de uma natural garantia democrática de que nenhum Governo possa decidir contra a vontade dos próprios agentes culturais e tentar impor, de forma autoritária, uma determinada política cultural. 
A posição do PS, que o PSD recomendou, demonstra-se facilmente no articulado do Decreto Regulamentar Regional 6/2014/A, de 28 de Março, pelo qual o Governo Regional criou o SEU conselho de cultura.
Generosamente, o Governo Regional permite que o seu Conselho “aprecie” e “emita parecer”, mas só sobre “matérias que lhe sejam submetidas” pelo próprio Governo regional. Por outro lado, o direito de iniciativa própria desse concelho consultivo governamental é limitado à mera formulação sugestões ao Governo. 
Mas também a sua composição demonstra a preocupação do governo Regional em garantir o alinhamento do conselho com as suas políticas. Se cinco dos seus membros são por inerência direta nomeados pelo Governo (refiro-me aos representantes dos museus, das bibliotecas, ao Diretor Regional da Cultura e ao respetivo membro do Governo), a verdade é que também as dez distintas personalidades referidas na alínea i) do artigo 4º do DRR 6/2014/A são convidadas diretamente pelo Governo. Portanto, em 18 membros, 15 são de nomeação governamental. Esta não é a minha visão de cultura e da liberdade dos agentes culturais. Entendo que só a participação e a sua opinião livre e independente podem contribuir para políticas culturais abrangentes e pluralistas, que não estejam sujeitas ao ditame ideológico do poder instalado, 40 anos depois do 25 de Abril, a luta pela liberdade de criação e fruição cultural continua.
Ponta Delgada, 13 de Abril de 2014

Aníbal C. Pires, In Jornal Diário et Azores Digital, 14 de Abril de 2014


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