Foto by Aníbal C. Pires |
Feita esta pequena incursão na significância das palavras diria que a Prova de Aferição a que todos os alunos do 2.º ano escolaridade, em todas as escolas do país que o lecionam, serão sujeitas, durante o ano de 2017, a um trabalho escolar composto por um conjunto de perguntas para avaliar os conhecimentos dos alunos para, posteriormente, julgar através de comparação ou, mais simplesmente, avaliar.
Julgar através da comparação de resultados ou, se assim preferirmos, avaliar o quê. Não são os alunos pois, esta “Prova de Aferição”, não tem nenhum efeito na sua avaliação. Sim, destina-se a avaliar, julgar por comparação, o Sistema Educativo, ou seja, as escolas e por essa via ajuizar sobre o desempenho docente.
As organizações e as instituições devem ser objeto de avaliação, Sem dúvida. Da avaliação resultam, ou devem resultar alterações que tenham como finalidade o nobre objetivo de aperfeiçoar e cumprir, no caso das instituições, a sua missão. Fica assim, como uma espécie de declaração de princípio.
A “Prova de Aferição” que se pretende realizar este ano escolar é uma inutilidade quanto ao propósito e vem introduzir perversões no processo de ensino e, por consequência, efeitos negativos na aprendizagem dos alunos. Os docentes do ano de escolaridade visado pela “Prova de Aferição” terão, naturalmente, como principal preocupação a preparação dos alunos para aquele momento introduzindo alterações a um percurso que estando previamente traçado está, como qualquer outro plano, sujeito a correções em função da avaliação interna prevista e não de imposições externas, como é o caso. Ou seja, esta “Prova de Aferição” vem prejudicar objetivamente o processo de aprendizagem desenhado por cada professor para os seus alunos do 2.º ano de escolaridade.
Foto by Aníbal C. Pires |
O Sistema Educativo está estruturado por ciclos de ensino e, no caso do Ensino Básico, a avaliação das competências e dos saberes só é possível concretizar, com rigor, no final de cada um dos ciclos, ou seja, nos 4.º, 6.º e 9.º anos de escolaridade. E porquê, Porque os percursos de aprendizagem podem, por um lado não ser sequenciais e, por outro os ritmos de aprendizagem dos alunos e os seus próprios interesses são, por diferentes motivos e origens, diferentes. Uma avaliação externa, e é disso que se trata, julga e compara como se todos os alunos, todas as escolas, todas as comunidades educativas fossem iguais. E não são. Nem mesmo os Sistemas Educativos pois, esta prova é nacional e o Sistema Educativo Regional tem, no Ensino Básico, algumas diferenças curriculares e outras, que nos diferenciam do Sistema Educativo que vigora no território continental, não conheço o caso madeirense, mas eventualmente também consagrará algumas diferenças.
Mas mais grave do que o desperdício de tempo e de recursos para corporizar esta inutilidade é a ideia que lhe está subjacente. Medir o grau de uniformidade, verificar se a Escola portuguesa, em toda a sua extensão territorial, cumpre o seu papel de reprodução de uma certa forma de estar e ser, um certo modelo de sociedade. Espero que não esteja a cumprir, Gosto das diferenças e da manifestação das múltiplas formas de expressão cultural que a Escola, enquanto espaço intercultural, deve promover, respeitar e cultivar.
Uma nota final para registar que o Secretário Regional da Educação e Cultura nem sequer se deu ao trabalho de mandar fazer as necessárias adaptações ao documento que, sobre a “Prova de Aferição” enviou para as Unidades Orgânicas. Houve um tempo em que a Direção Regional da Orientação Pedagógica, extinta ainda na primeira metade dos anos 90, pouco mais fazia do que substituir o timbre do Ministério da Educação pelo timbre da Secretaria Regional. Este parece ser um tempo de acriticismo e de abandono da luta pelo que nos diferencia e, sobretudo, de abandono da luta pela afirmação da nossa autonomia.
Ponta Delgada, 19 de Fevereiro de 2017
Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 20 de Fevereiro de 2017
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