Divulgo a minha intervenção na workshop (WS211) que teve como organizadores a Professora Doutora Ana PAula Beja Horta do CEMRI, da Universidade Aberta e o Professor Doutor Jorge Malheiros do CEG, do IGOT.
Nesta WS participaram ainda Joaquina Pires, Comunidade Portuguesa-Ville de Montreal (Canada) - Participaçao politica ou cidadania activa? O caso da diaspora portuguesa do Québec • Ana Paula Beja Horta, Universidade Aberta Lisboa (Portugal); and Jorge Malheiros,University of Lisbon (Portugal) - Political participation and civic engagement amongst migrants in Portugal • Beatriz Padilla and Giulio Mattiazzi, University Institute of Lisbon (Portugal) · Political Actors, Civil Society and Electoral System: Reparatory Action or New Form of Political Citizenship? The cases if Italy and Brazil • Giralda Seyferth, Museu Nacional/Universidad Federal do Rio Janeiro (Brazil) · Etnicidade, Imigração e Política no Brasil do início do século XX • Joana Bahia, Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Brazil) · Gender memories: the construction of an imaginary ídischkeit in Brazil
International Metropolis Conference, Azores, 2011
WorkShop - A participação política dos imigrantes: uma possível contribuição para formas de globalização não-hegemónicas?
Comunicação: “Direitos políticos dos imigrantes - o pensamento e a acção política face à cidadania plena dos imigrantes, cidadania entendida como factor de integração mas, também de capacidade para influenciar as políticas.”
A coberto do tema desta workshop recordo, assim como uma espécie de introdução a esta reflexão que me propus partilhar convosco, o que escrevi e publiquei na imprensa regional e em diferentes blogues, em Novembro de 2008, na sequência da realização do III Fórum das Estruturas Representativas das Comunidades Imigrantes em Portugal, promovida pela Plataforma que as representa e a quem o Estado português reconheceu como interlocutor válido.
Passo então a citar o referido texto:
“Sob o lema “Que políticas de Imigração para o Século XXI?”, o concelho de Lagos, no Algarve, acolheu nos dias 24, 25 e 26 de Outubro o 3.º Fórum Nacional da Estruturas Representativas das Comunidades Imigrantes em Portugal.
O movimento associativo imigrante em Portugal demonstrou, uma vez mais, a sua vitalidade e capacidade com a realização da terceira edição de um fórum nacional concebido e executado pelos seus representantes. Esta realização anual teve a sua génese em Abril de 2006, na cidade de Ponta Delgada, tendo-se seguido a segunda edição em Abril de 2007, na cidade de Setúbal.
Um dos aspectos mais relevantes desta terceira edição foi, sem dúvida, a parceria com o poder local. Uma parceria que não se limitou à atribuição de subsídios ou de apoio logístico, que não devem ser menosprezados, mas o relacionamento foi, desta vez para além disso, o relacionamento foi de cooperação e envolvimento com base no pressuposto, assumido pelas partes, de que o poder autárquico, pela sua proximidade com os cidadãos, autóctones e estrangeiros, reúne condições únicas para promover políticas locais de integração e acolhimento adequadas às características da população e do território sob o qual exercem governo. Na sequência deste propósito resultou que uma das recomendações da “Agenda de Lagos”, documento que se constitui em agenda comum das associações de imigrantes até à realização do próximo Fórum, apela aos imigrantes e às suas organizações para se envolverem na vida política local e para o estabelecimento de plataformas locais com as autarquias e redes locais de apoio ao cidadão.
Da “Agenda de Lagos” constam, igualmente, outras recomendações que se constituem, por um lado, em posições de repúdio e luta face às actuais tendências repressivas e securitárias que caracterizam o que se pretende venha a ser uma política comum europeia para a imigração, de que a “Directiva de Retorno” e o “Pacto Sarkozy” são exemplo, por outro lado, a “Agenda de Lagos” propõe algumas medidas que visam conferir aos cidadãos imigrantes, por via da participação sindical e política, a cidadania plena e recomenda, ainda que, sejam revistas e agilizados alguns aspectos da “Lei dos Estrangeiros”, mormente, os que dizem respeito aos processos de regularização. A necessidade de encontrar, em Portugal e na União Europeia, uma solução global para os imigrantes indocumentados e a defesa da independência do movimento associativo imigrante, face aos poderes são, igualmente, preocupações espelhadas na “Agenda de Lagos” e sobre as quais as associações recomendam aos cidadãos imigrantes que reforcem a vida associativa e, se reforcem e estabeleçam novas pontes de cooperação local e regional e com organizações congéneres na Europa e no Mundo. O 3.º Fórum decorreu em simultâneo e de forma integrada com o projecto “Lagos Multicultural” promovido pela Câmara Municipal do Concelho de Lagos.”
Embora sendo uma leitura pessoal e até carregada de alguns afectos porque estive directamente envolvido quer, na criação da Plataforma das Estruturas das Comunidades Imigrantes em Portugal (PERCIP) quer, na realização do fórum de Lagos quer, ainda, nos anteriores fóruns que se realizaram, em Ponta Delgada e Setúbal como já foi referido.
Julgo, porém, poder afirmar com rigor que as comunidades imigrantes conseguiram traçar, no plano teórico, não só uma estratégia comum, vertida nas agendas anuais, como delinear e executar, no plano associativo, um modelo organizacional que, ao contrário de experiências anteriores, não se construiu à volta de uma reivindicação de momento (como foram os casos da regularizações extraordinárias), mas emergiu como uma necessidade sentida pelas lideranças das associações com maior implantação e capacidade organizacional e que representavam as comunidades imigrantes de maior dimensão.
Digamos que o pensamento e acção do movimento imigrante em Portugal procurou encontrar respostas que servissem uma agenda comum para as comunidades imigrantes, salvaguardando as agendas de cada associação mas, tentando contrariar os efeitos negativos da tendência natural para a etnicização e de uma constatada pulverização de associações.
No plano conceptual a PERCIP não foi uma resposta federativa, à data da realização do Fórum de Ponta Delgada já germinavam alguns projectos federativos, designadamente, a da comunidade cabo-verdiana que acabou por ser constituída e, posteriormente outros projectos foram apresentados mas, ao que julgo, não chegaram a concretizar-se, a PERCIP foi desenhada para se constituir como representante das comunidades imigrantes para os assuntos que lhe são comuns, e não como uma estrutura organizacional da qual emanam orientações estratégias para os seus associados.
Este exemplo que aqui vos trago constitui, em minha opinião, um paradigma que se ajustava e, ajusta, à necessidade de fortalecimento do movimento associativo imigrante em Portugal porque:
- garantia a independência e o apoio às associações de imigrantes;
- garantia a independência das diferentes comunidades;
- unia nas reivindicações e problemas transversais às comunidades imigrantes em Portugal; e,
- assumia o papel de interlocutor privilegiado com a sociedade de acolhimento e poder político com base numa agenda comum, aprovada anualmente pelas associações de imigrantes.
O carácter democrático e representativo da vontade das comunidades imigrantes é visível nos estatutos da PERCIP e a realização dos fóruns, o seu melhor exemplo.
Os fóruns serviram de espaço de construção colectiva de propostas políticas apresentadas ao Estado português concebidas pelos próprios destinatários das políticas de imigração com o apoio da comunidade académica portuguesa, aliás esta aliança foi fundamental para o sucesso dos fóruns.
Até à realização do I Fórum, em Ponta Delgada, a realização de eventos de dimensão nacional sobre a temática da imigração foram sempre promovidos pelas autoridades portuguesas com uma insípida participação dos imigrantes, como foi a realização do I Congresso – Imigração em Portugal, diversidade, cidadania e integração, realizado nos dias 18 e 19 de Dezembro de 2003, na Fundação Calouste Gulbenkian. Não retirando mérito, que o teve, a esta e outras realizações mas, em bom rigor, a participação dos destinatários foi a de meros assistentes passivos, a comprová-lo basta uma consulta à revista publicada pelo ACIDI para se verificarem as diferenças e, por conseguinte a mudança de paradigma.
Ainda antes de transmitir a minha opinião sobre o direito de voto dos estrangeiros como um exemplo de potencial postura de resistência à uniformização mas, também e quiçá, sobretudo de afirmação da importância social e económica das comunidades estrangeiras na sociedade de acolhimento, não posso deixar de referir que estas temáticas foram alvo de discussão e aprofundamento no Fórum de Setúbal e de Lagos mas que, certamente precisam de um “upgrade” até porque quer, as características que conformam as migrações internacionais sofreram algumas alterações quer, o quadro jurídico e legal registou evoluções quer, ainda, a própria política de acolhimento tem vindo a sofrer alterações embora, no essencial os problemas associados às migrações subsistam e se tenham agudizado com a crise do capitalismo com que actualmente nos confrontamos.
O PCP acompanha de perto o fenómeno migratório e tem assumido como suas algumas das preocupações e reivindicações quer, das comunidades portuguesas emigradas quer, das comunidades de imigrantes que procuram Portugal como país de acolhimento.
No que concerne ao direito de voto dos cidadãos estrangeiros o PCP defende que esse direito deve ser concedido aos cidadãos estrangeiros nas eleições locais e regionais, independentemente do princípio da reciprocidade.
A organização do PCP nos Açores defendeu em sede da preparação da última revisão do Estatuto Político e Administrativo da Região Autónoma dos Açores a consagração do direito de voto para os cidadãos estrangeiros, pretensão que não foi acolhida mas pela qual continuaremos a lutar em futuras revisões da Constituição, do Estatuto e da lei Eleitoral.
No período político de preparação da revisão do Estatuto da RAA o PCP Açores, ou seja na anterior legislatura (2004/2008), não tinha representação parlamentar.
Na actual legislatura, onde dispomos de Representação Parlamentar, e no quadro das políticas que directamente dizem respeito aos cidadãos estrangeiros temos tido uma intervenção positiva e da qual registo a apresentação de um projecto de resolução para a introdução da temática da Educação Intercultural no Sistema Educativo Regional, que não foi acolhido, e a apresentação de uma Ante-proposta de Lei que propunha a alteração do Dec Lei que regula o serviço público de transportes aéreos para as Regiões Autónomas. A alteração proposta pela Representação Parlamentar do PCP Açores visava eliminar do articulado o normativo que impedia o acesso, dos cidadãos estrangeiros oriundos de países extracomunitários, à tarifa de residente aos cidadãos. Proposta apresentada em 2009, aprovada na ALRAA por unanimidade e que a AR aprovou no princípio de 2011.
Para terminar, e em jeito de nota de roda pé pois iniciei esta reflexão com uma referência a uma estratégia do movimento associativo imigrante em Portugal que se consubstanciou num modelo organizacional inovador do qual resultou uma importante reflexão e acção sobre a temática aqui à discussão, não posso deixar de referir que a PERCIP reunindo todas as condições para se constituir como uma resposta social e política eficaz e inovadora aos velhos e novos desafios que se colocam às comunidades de imigrantes em Portugal, a PERCIP acabou por enfraquecer e foi perdendo gradualmente perdeu o reconhecimento que, até Lagos (2008) lhe tinha sido conferido pelo movimento associativo imigrante.
As razões desse enfraquecimento são diversas e, certamente, dariam para uma outra intervenção mas que hoje não vem ao caso, pois este não é o tempo nem o espaço para o fazer e, por outro lado este é um assunto que, em primeira instância diz respeito ao movimento associativo imigrante e no seu seio deve ser objecto de reflexão e discussão.
Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 14 de Setembro de 2011
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