segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Viagens

Viajar, Não sendo um verbo exclusivo do povo português é, porém, uma elocução que este povo da periferia europeia conjuga como nenhum outro.
Não há continente deste planeta onde não existam vestígios da língua e da cultura deste povo de costumes simples e alma grande.
Com os descobrimentos portugueses, a primeira globalização, viajaram pessoas, plantas, sons, paladares que se miscigenaram e recriaram, E retornaram viagem chegando às origens com formas, cores, sons, odores e sabores, diferentes. Direi mesmo, exóticos.
Como seria o caril indiano não fosse o adocicado dos coentros mediterrâneos e que a gastronomia do sul de Portugal, mas também do nordeste brasileiro não dispensam!
O cacaueiro veio do continente americano para África como planta decorativa, em S. Tomé e Príncipe, com a arte e engenho dos homens e a bênção da terra mãe, foi transformada em planta agrícola e as suas sementes fazem as delícias dos amantes do chocolate.
Também a música e a dança transportados pelos viajantes se foram miscigenando e percorreram Mundo. O “Ukelele” havaiano é um descendente do cavaquinho português e das violas de arame insulares. As “modinhas e lunduns”, segundo alguns autores são as primeiras formas musicais e de dança urbana com raízes na África subsariana, tomaram forma no Brasil pelos escravos vindos diretamente de Angola ou, via Lisboa onde “amaciaram” os sons e a dança ao gosto da corte. E, as “modinhas e lunduns” recriaram-se e, de novo viajaram para de novo se miscigenaram e regressarem a Portugal e às ilhas atlânticas sob a forma da “saudade” açoriana, da “morna” cabo-verdiana e do “fado” português.
Estes são alguns aspetos, quiçá, comezinhos da epopeia dos descobrimentos portugueses. Até poderão ser! Mas são os vestígios que restam e, ainda assim desbaratados pelas “elites” que têm vindo a exercer o poder em Portugal, “elites” a quem só preocupa encontrar uma terapia para acalmar os mercados, como se os mercados não vivessem do seu nervosismo intrínseco e à custa do sofrimento dos povos. Estando bem de ver que os mercados não precisam de sedativos mas de serem agrilhoadas e submetidos à legitimidade democrática. Veja-se o caso exemplar da Islândia.
Viajar sim! De novo e sempre mas, por vontade própria, individual ou coletiva, e não porque a pátria é madrasta ou, porque as “elites” não encontram outra solução que não seja a de nos mandarem de novo embora, desta vez, sem destino pré-definido.
A emigração serviu sempre como a válvula de escape social que responde aos fracassos da governação. Está a acontecer de novo e uma vez mais a resposta é imediatista e, por isso mesmo, não é solução.
Horta, 11 de dezembro de 2011

Aníbal C. Pires, In Jornal Diáro, 12 de dezembro de 2011, Ponta Delgada 

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