sábado, 8 de fevereiro de 2025

Entrevista ao DI - Sorte de varas seria "aculturação"


Texto da entrevista publicada hoje no Diário Insular. 


1. Como nasceu este Manifesto contra a Legalização da Sorte de Varas nos Açores?

Quero começar por uma declaração de princípio. As respostas que se seguem só me vinculam a mim e não aos subscritores do “Manifesto”, pois, de entre as muitas pessoas que já o subscreveram existem cidadãos que terão visões muito diferentes da minha. O que nos une é a luta contra qualquer tentativa de legalizar a “sorte de varas” e foi esse o motivo da mobilização destes cidadãos entre os quais se encontram aficionados das touradas de praça e da apropriação popular da “festa brava”, conhecida como “tourada à corda”.

Eu diria que nasceu da mesma forma que aconteceu em janeiro de 2015, quando nos bastidores da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores correram rumores de que estava em preparação uma iniciativa parlamentar com o propósito de legalizar as “touradas picadas/sorte de varas”, ou seja, houve uma reação cidadã espontânea que gerou uma grande mobilização em torno de um manifesto com o mesmo teor do que agora apresentamos. Em janeiro de 2015 o aparecimento do manifesto e a mobilização social e política foi suficiente para que os propósitos se esfumassem nos corredores e gabinetes da ALRAA.

O presente anúncio da eventual apresentação de uma iniciativa legislativa encontrou eco nas declarações de um membro do governo e num contexto muito particular. Esse facto não significa, necessariamente, que venha a concretizar-se a iniciativa parlamentar, mas vamos prevenir pois, como diz a sabedoria popular, vale mais do que remediar.

Desta vez, e para sermos justos, antes do manifesto apareceu, também com a espontaneidade que estas questões provocam, uma petição contra a legalização da sorte de varas que, como é do domínio público, conta já com mais de 2000 mil assinaturas, o que por si só garante a discussão em plenário do seu conteúdo e propósito pois, também como é do domínio público sobre os propósitos das petições não há decisões. A discussão da petição servirá apenas e tão-somente para que sobre ela se façam declarações de ordem política e se marquem posicionamentos.

A petição e o manifesto não competem entre si e muitos dos subscritores da petição são-no também do manifesto e vice-versa. A diferença é que o manifesto se mantém em aberto e a petição perde o seu impacto logo que venha a ser discutida, embora os subscritores se mantenham atentos e mobilizados contra qualquer tentativa de apresentação de uma iniciativa parlamentar que vise a legalização da “sorte de varas”.


2. Considera que em causa está um possível retrocesso?

A introdução da “sorte de varas” ou “touradas picadas” a que corresponde o primeiro “tercio” da “tourada à espanhola”. E começo por referir este aspeto para que se perceba que a introdução desta variante nas touradas de praça nada tem a ver com a tradição e cultura tauromáquica nos Açores e no País, ou seja, tratar-se-ia da importação de uma prática para introduzir nas lides tradicionais portuguesas e, por conseguinte, de uma aculturação, se isto seria ou não um retrocesso depende sempre do ponto de vista pois, se queremos salvaguardar o que nos diferencia de outros povos então, trata-se de um retrocesso, apesar de já ter sido praticada na ilha Terceira durante alguns anos. Por outro lado, a evolução social da humanidade tem vindo a defender valores da não violência e da ética e isto aplica-se à defesa do bem-estar animal. Assim e, também, desse ponto de vista a legalização da “sorte de varas”, pelo aumento da violência e dos maus-tratos sobre os animais representaria um retrocesso.

Há, porém, um outro aspeto que não é de somenos importância e se relaciona com a atividade económica. O destino Açores é “vendido” como um destino ambientalmente limpo e sustentável onde as ações antrópicas se desenvolveram, com impacto é certo, mas mantendo uma relação amigável com o meio ambiente de onde resultou uma cultura e paisagem únicas. E esse é (ou será) o fator que garante atratividade ao setor. A introdução da “sorte de varas” viria manchar a imagem do destino e possivelmente a procura turística cairia, de onde resultaria algum declínio para um setor económico que representa já um contributo muito importante para a formação do PIB regional.



3. Mesmo assim, da leitura que faz da composição atual do parlamento açoriano, é possível que uma iniciativa desta natureza vá a debate e seja aprovada?

Sobre a atual composição da ALRAA não vou dizer mais do que o seguinte: é mais conservadora do que era nas legislaturas em que tive assento (2008/2012 e 2012/2016). O que não significa que uma iniciativa deste teor possa ser aprovada, ou mesmo que venha a ser apresentada.

  

4. O que torna a sorte de varas algo que, do vosso ponto de vista, não deve ser legalizado?

A resposta que dei à segunda pergunta já adianta alguns aspetos, quiçá, os mais importantes para que não se legalize a “sorte de varas”, todavia, poderei aduzir mais alguns que nem sempre são bem explicitados e que desconstrói alguns dos argumentos dos defensores desta prática.

“Picar” o touro antes da lide apeada tem um propósito que nunca é referido, ou melhor, o propósito a que me refiro conflitua com o argumento de que “picar” o touro tem como objetivo torná-lo mais agressivo preparando-o assim para que a lide seja mais emotiva e, fundamenta-se esta prática com o despertar da nobreza do touro, ou seja, um animal nobre não foge à “vara” e depois de ser “picado” investe melhor, ou seja, é garante de uma boa lide. Pois bem, durante esse processo estima-se que um touro perca, em média, entre 1 a 2 litros de sangue. O sangramento provoca, naturalmente, a debilidade do animal e é aqui que reside a falácia, a “sorte de varas” serve para enfraquecer o touro e não para lhe despertar a natural e nobre agressividade atrás da qual os defensores desta variante tauromáquica se justificam. Na verdade, trata-se de uma forma cruel de debilitar o nobre animal para que o nobre lidador não corra os riscos de uma lide com um animal na posse de toda a sua pujança e nobreza.

Por estes dias e em conversa com uma cidadã terceirense que podendo não ser uma aficionada de primeira água, mas gosta de touradas como se verá pelas suas palavras. Dizia-me então a referida cidadã: “Sim! É dessas que eu não gosto. Uma vez em Madrid saí a meio da tourada. É horrível! Vemos o sangue a sair em esguicho do corpo do toiro. É horrível.”

Julgo ser suficiente esta pequena descrição para que a sua pergunta fique cabalmente respondida.



5. Como encara os argumentos dos defensores das touradas picadas?

Percebo-os e compreendo-os, mas são inaceitáveis e não têm qualquer fundamento do ponto de vista da criação dos animais ou da continuidade da atividade tauromáquica. Eu diria que estas insistências lhes são prejudiciais pois, contribuem para que cada vez mais cidadãos se afastem das touradas de praça. A seleção dos animais para as lides utiliza as “tentas” como uma das técnicas para garantir bons animais para as lides, mas não confundamos uma e outra coisa, embora esta técnica para a seleção dos animais não deixe de ser condenável por alguns cidadãos.


6. Como vê o discurso do secretário regional da Agricultura a respeito desta temática?

O senhor Secretário Regional da Agricultura no contexto em que proferiu as declarações conhecidas e, certamente, no calor do ambiente, para colher apoios e ficar bem no retrato, não refletiu e mostrou um grande desconhecimento do pulsar da sociedade açoriana, desde logo a terceirense. As posições e gostos individuais do senhor Secretário são suas e deve manifestá-las no seu círculo de amigos e indefetíveis apoiantes, manifestar-se publicamente como membro de um governo que não tem uma posição sobre o assunto parece-me grave e merecedor de um reparo pelo Presidente do Governo Regional.

O Secretário regional deveria preocupar-se com os setores que tutela e trabalhar para garantir a segurança alimentar e os rendimentos dos trabalhadores do setor.

Aníbal C. Pires, Angra do Heroísmo, 6 de fevereiro de 2025


sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

MANIFESTO CONTRA A LEGALIZAÇÃO DA SORTE DE VARAS NOS AÇORES e Lista de subscritores (em aberto)


Ontem, na apresentação do “Manifesto Contra a Legalização da Sorte de Varas nos Açores” foi afirmado que o texto e a lista dos subscritores seriam divulgados na internet.

Não dispondo de outros suportes fica aqui no blogue “momentos” e depois será replicado nas “redes sociais”.

Os interessados em subscrever o manifesto podem fazê-lo declarando na caixa de comentários a sua concordância, o nome e a atividade profissional, ou junto de outros subscritores que me farão chegar a informação pois, coube-me a tarefa de manter atualizada a lista de apoiantes desta iniciativa.





MANIFESTO CONTRA A LEGALIZAÇÃO DA SORTE DE VARAS NOS AÇORES

Somos todos Açores e qualquer prática legalizada numa das nossas ilhas implicará a Região no seu todo. Ora, as recentes notícias vindas a público fazem-nos temer que esteja a ser construída uma iniciativa parlamentar, a apresentar à Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), que visa, uma vez mais, a legalização da chamada “Sorte de Varas”, ou “Tourada Picada”, na ilha Terceira (o que significa, naturalmente, verter para os Açores o ónus dessa prática que nada tem a ver com a cultura ou tradição açoriana).  

Os cidadãos açorianos já iniciaram um forte movimento de contestação para uma vez mais impedir que se legalize uma prática cruel que, como já referimos, é estranha à ilha Terceira e aos Açores. Muitas são as vozes, de todos os quadrantes da sociedade, mesmo entre os aficionados, que se têm posicionado contra esta prática de crueldade extrema para com o touro, proibida em todo o país e que não se reveste, nas nossas ilhas, de qualquer caráter cultural, tradicional ou identitário. Acrescente-se que, a verificar-se, se trataria da quarta tentativa de legalização desta variante tauromáquica, tendo sido rejeitada, na ALRAA em 2009 por parcos dois votos.

Somos todos Açores e, numa altura de forte aposta no Turismo Sustentável, no Turismo de Natureza, assente sobretudo no respeito ambiental e na estreita e harmoniosa ligação do Homem com a Terra e com o Mar, não consideramos compreensível esta pretensão, que remete para uma forma de sofrimento animal que não é admissível nos dias que correm, e que mancharia, cá dentro e para quem nos visita, a imagem dos Açores – abrindo, além do mais, gravíssimas fendas na sociedade açoriana, que se quer coesa e unida. 

Somos todos Açores. Estas nove ilhas do verde e das águas límpidas, das belezas naturais e da comunhão com a Natureza, não merecem isto. Não merecem ficar conotados com uma nova forma de crueldade animal. Não merecem a mancha social e política que a legalização de uma prática deste teor traria para todo o arquipélago.

Porque somos todos Açores, e independentemente de a suposta iniciativa parlamentar chegar ou não à Assembleia Legislativa Da Região Autónoma dos Açores, manifestamo-nos CONTRA a legalização da Sorte de Varas nos Açores.

Subscritores:  

Adelino Manuel de Jesus Lourenço Ferreira, reformado bancário; Alexandra Manes, Aj. Educação Especialista e ex-deputada à ALRAA; Alexandre Pascoal, gestor cultural; Alexandre Wragg Freitas, investigador; Ana Brum, encenadora; Ana Isabel Newton da Fonseca do Canto e Castro, professora aposentada; Ana Luísa Sarroeira dos Santos, professora; Ana Margarida de Medeiros Henrique, turismo/ agricultura regenerativa; Ana Maria Nogueira dos Santos Loura, engenheira aposentada; Ana Monteiro, instrutora de mergulho; Ana Monteiro, radiologista; Ana Teresa Baía Simões, desenhadora; Ana Teresa Rocha Alves, técnica de estatísticas, aposentada; Ana Sofia da Silva Lourenço Ferreira, guia turística; André Martins, arquiteto; André Silveira, empresário; Andrea Giusti, investigador; Aníbal C. Pires, professor aposentado; Aníbal Raposo, cantautor; António Fonseca, funcionário administrativo; António Henrique Ramos Correia, pintor/artes plásticas; António José do Nascimento Dinis Pereira, oficial de operações de socorro; António Neves, engenheiro e poeta; António Rego, reformado; António Salgado Almeida, médico; Armando Meireles Monteiro, bancário reformado; Basílio Narciso de Sousa, reformado; Beatriz da Conceição Leite de Castro, professora; Bernardette Filomena de Oliveira, professora reformada; Bernardo Peixoto, terapeuta ocupacional; Bianca Mendes, fisioterapeuta; Carla Alexandra Ramos da Silva Nunes, professora; Cacilda Medeiros, reformada; Carla Garcia, educadora social; Carlos Raposo, aposentado; Carlota Pereira Cordeiro, notária estagiária; Carlos Bessa, escritor e professor; Carlos Enes, reformado; Carmélio Manuel Dias Rodrigues, reformado; Catarina Rosa dos Santos Mourato Conceição, bióloga; Catia Benedetti, professora e tradutora;  Célia Otelinda Borges Pereira, diretora técnica; César Augusto dos Santos Pereira Silveira Terra, enfermeiro; Chrys Chrystello, jornalista australiano (MEEA); Cláudio Gomes, físico teórico e investigador universitário; Conceição Mendonça, professora aposentada; Conceição Tibúrcio, reformada dos CTT; Daniel Henrique Pena Antunes, guia turístico; Daniela Silveira, Produtora cultural; David M. Santos, biólogo; Diogo Caetano, Geólogo; Duarte Manuel Espírito Santo Melo, padre católico; Elsa Bettencourt, poeta e ilustradora; Elsa Ferreira, Técnica Superior de Reinserção Social; Emanuel Jorge Botelho, escritor; Eva Melo Cunha de Almeida Lima, técnica superior de ambiente; Fabíola Sabino Gil, funcionária pública; Fernando Vicente, professor; Filipe Gomes, Piloto de barra; Filipe Machado Tavares, produtor, cineasta, diretor artístico e presidente da ARTAC; Filomena Dutra Bacalhau, funcionária pública; Filomena de Fátima Rocha Tavarela Ferreira, atriz; Francisco Manuel Serra Nunes, oficial de justiça; Francisco Lopes, arquiteto; Francisco Maciel de Freitas, estudante de Medicina Veterinária Francisco Rosas, realizador e produtor; Frederico Cabral, farmacêutico; Guilherme Lemos Gambier Machado, professor; Graça Silva, técnica superior; Gui Menezes, investigador principal da UAc; Guilherme António Toledo Ornelas Bruges, operador de assistência em escala; Guilherme Henrique Ávila Parreira, técnico de colheitas; Gustavo Adolfo de Sousa Rodrigues Fernandes, engenheiro informático; Helena Medeiros, professora; Helena Melo Medeiros, professora; Henrique Levy, poeta e ficcionista; Helena Maria Massa Flor Franco Carreiro, professora; Henrique Ramos, consultor economia do mar; Herberto Gomes, jornalista; Ildeberto Rocha, radialista e diretor da Rádio Voz dos Açores; Inês Fontes de Meneses, técnica de apoio psicossocial; Hugo Bettencourt, educador de infância; Humberta Brites Dias Jerónimo Araújo, reformada da NAV; Igor Tavares de Melo Espínola de França, arquiteto; Isabel Alexandrina Lemos Gambier Machado, designer gráfica; Isabel Maria Paiva Pinheiro de Magalhães, conservadora/notária aposentada; Isabel Melo de França de Araújo e Abreu, executiva de marketing; Izabel Armas, agrónoma; João Cardoso, assistente científico; João Domingos Marques Araújo, professor; João Mota Vieira, engenheiro; João Paulo Marques Rosa, notário; João Pedro Costa, designer gráfico; João Pedro Leonardo, músico/compositor; João R. Pires Marques, designer gráfico; Joana Traveira Madeira da Silva Fernandes, artista e empresária; Janete Encarnação Alves Chaves Viana, educadora de infância; Jorge Manuel Figueiredo Ventura, Presidente do Clube Naval de Lajes das Flores; José António Contente, professor universitário reformado; José Artur Jácome Corrêa, Reformado da SATA e Presidente da Mesa da Assembleia Geral, do Lar Luís Soares de Sousa; José Bettencourt Costa e Silva, eletricista; Joaquim Melo, investigador; José Decq Mota, antigo deputado regional, antigo coordenador do PCP/Açores e antigo dirigente do associativismo desportivo náutico; José Fernando Borges Mendonça, Chefe dos serviços de contabilidade USFORAZ, aposentado; José Guilherme Teixeira Machado, reformado; José Luís Pereira Santos Gonçalves Neto, arqueólogo; Josefa Bettencourt, educadora de infância; Jéssica Nunes, designer gráfica; José Manuel N. Azevedo, docente universitário aposentado; José Manuel Santos Narciso, jornalista; José Maria Mendonça de Freitas, engenheiro zootécnico; José Pedro Medeiros, bancário; Judite Barros, professora; Juliana Oliveira de Matos, farmacêutica hospitalar; Laura Alves, investigadora; Laura Quinteiro Brasil, cineasta; Lisandra de Fátima Ormonde Sousa Meneses, ajudante de educação; Lizuarte Manuel Machado, Comandante da Marinha Mercante; Leonor Sampaio da Silva, professora universitária; Lorena Correia Botelho, professora aposentada; Lorena de Medeiros Ataíde Freitas, professora aposentada; Lúcia Oliveira Ventura, professora; Lucília Maria Caldeira de Agrela, professora; Luis Filipe Ruas Madeira de Vasconcelos Franco, artista plástico; Luís Miguel dos Santos Almeida, professor; Luís Noronha Botelho, professor aposentado; Luísa Madaleno, educadora de infância; Luísa Ribeiro, funcionária pública e poeta; Marco Varela, operário; Madalena Ávila Rego da Silva, poeta e declamadora de poesia; Manuel Urbano Bettencourt Machado, professor aposentado; Maria Alexandra Terra, enfermeira; Maria Antónia Fraga, professora aposentada; Maria do Carmo Barreto, professora universitária; Maria do Céu Barroca de Brito, professora aposentada; Maria Emanuel Albergaria, mediadora cultural; Maria Francisca Melo de França de Araújo e Abreu, analytical consultant; Maria Gabriela Câmara de Freitas Silva, professora reformada e ex-deputada na ALRAA; Maria João Vieira, professora; Maria Madalena Pires, aposentada; Maria Manuela Martins Rabacal Gonçalves Ponte, docente; Maria Narcisa Lemos Gambier Machado, designer; Maria do Natal Batista de Lemos Machado, reformada; Maria da Natividade Mendonça de Freitas Reis, educadora de infância; Maria Regina de Freitas Silva Meireles Monteiro, tesoureira de finanças reformada; Maria do Rosário da Silva Ferreira, professora; Maria Teresa Ferreira, bióloga; Mariana Freitas Reis, médica; Mariana Caçador Morais Sarmento de Melo, desempregada; Mário Abrantes, Engenheiro Silvicultor; Mário Belo Maciel, professor; Mário Jorge Nunes, arquiteto; Mário Roberto Sousa Carvalho, artista; Margarida Vitória Fonseca, professora; Marlisa Furtado, gestora comercial; Marta Couto, Solicitadora e ex-deputada a ALRAA e dirigente associativa da área ambiental e social; Marta Fernandes Louro Parreira Cruz, Filóloga; Natália Correia, professora; Nelson José da Silveira Pimentel, prof. assistente operacional; Nuno Alexandre Silveira Mendonça, TSDT-Radiologia; Paula Decq Mota, professora; Paula Rosa Vieira Cabral, professora; Paula Sousa Lima, professora e escritora; Paulo Bettencourt Lemos, programador informático; Paulo Matos, professor; Paulo Alexandre Almeida dos Reis, engenheiro zootécnico; Paulo Lopes Lobão, reformado; Paulo Mendes, psicólogo e ex-deputado à ALRAA; Paulo Pacheco Santos, advogado;  Pedro Leite Pacheco, professor reformado/agricultor; Pedro Neves, Deputado na ALRAA; Pedro Pacheco, criador de conteúdos digitais; Pedro Perpétuo, engenheiro mecânico; Raquel Raposo, atriz, produtora, diretora de cena e educadora artística; Raquel Valadão, Chef; R. Augusto Marreiros M, magistrado; Regina M. P.T. Tristão da Cunha, aposentada; Renata Correia Botelho, psicóloga; Ricardo Rodrigues, advogado; Rita Costa, bióloga; Roberto Resendes, Assistente Técnico da Universidade dos Açores; Rodrigo Gonçalves, arquiteto; Ronaldo Valadão, técnico superior saúde; Rosa Maria Belo Maciel, professora; Rui Lopes, ilustrador; Rui Suzano, Médico; Rui Teixeira, professor; Sandra Silva Dimas Serpa, professora; Sara Sarroeira, técnica superior de educação especial e reabilitação; Sílvia Fagundes, funcionária pública; Sónia Domingos, professora e técnica de património cultural; Sónia Passos de Barros Borges de Sousa, administradora; Sónia Soraia Rodrigues Luís, operadora de caixa; Susana Lopes Baltazar, professora; Teófilo Braga, professor reformado; Terry Costa, diretor artístico; Tiago Miranda, advogado; Tiago Resendes, engenheiro do ambiente; Valter Peres, produtor cultural; Vamberto Freitas, crítico literário; Victor Medina, professor, aposentado; Vítor Silva, assistente administrativo; Wilson Fagundes, assistente técnico;

Região Autónoma dos Açores, 2025



quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

contra a "Sorte de Varas" nos Açores - Manifesto


Texto base de apresentação do Manifesto realizada hoje, pelas 15h30mn, no espaço "LAR DOCE LIVRO", em Angra do Heroísmo 


Apresentação do Manifesto Contra a Legalização da Sorte de Varas nos Açores

Lar Doce Livro – 15h30mn

Angra do Heroísmo, 6 de fevereiro de 2025


Boa tarde,

Quero, em meu nome, mas também em representação de todos os subscritores do “Manifesto Contra a Legalização da Sorte de Varas nos Açores” agradecer a presença da comunicação social e de alguns cidadãos que nos acompanham nesta iniciativa. Bem hajam pela Vossa presença.

Antes de vos ler o “manifesto” sinto que devo tecer algumas considerações sobre alguns contornos desta iniciativa, bem assim como relembrar dois ou três episódios históricos relacionados com as diferentes tentativas que certos atores políticos e grupos cidadãos levaram a cabo para legalizar a “Sorte de Varas” nos Açores, e digo Açores embora os promotores remetam as tentativas para uma circunscrição geográfica onde a cultura tauromáquica tem expressão, ou seja, a ilha Terceira, não tanto as clássicas corridas de praça, mas a apropriação popular que se manifesta nas chamadas “touradas à corda”.

A iniciativa surgiu de forma espontânea e não tem ligação com nenhuma organização, aliás como aconteceu em janeiro de 2015, é inteiramente livre de qualquer outro interesse que não seja a defesa dos Açores.  Os subscritores do “manifesto” fazem-no de forma individual e são uma representação da diversidade social, cultural, política, económica e geográfica açoriana, sendo que muitos dos subscritores são aficionados, o que diz bem da abrangência, mas também da unidade sobre uma questão que se viesse a verificar-se prejudicaria toda a Região, desde logo a ilha Terceira.

Julgo que terá ficado mais ou menos claro, contudo quero reforçar a ideia de que este manifesto não é contra as touradas de praça nem contra as touradas à corda, o manifesto é tão-somente contra qualquer tentativa, venha ela de onde vier, de legalização da “Sorte de Varas” nos Açores.

A nossa presença aqui não significa que tenhamos qualquer estrutura orgânica ou apoios de qualquer espécie. Estamos nós como poderiam estar outros cidadãos e o nosso papel tem sido, apenas, fazer contatos e listar os subscritores e, agora, apresentar o manifesto publicamente. Não terminaremos por aqui, vamos continuar a aceitar subscritores e, sobretudo, vamos manter-nos alerta.

Quanto à prometida resenha histórica deixo-vos então alguns dados e datas.

2002 – Acórdão do Tribunal Constitucional sobre o Decreto Legislativo Regional nº 32/2002, sobre "Adaptação à Região da Lei nº 92/95, de 12 de setembro, alterada pela Lei nº 19/2002, de 31 de Julho". Esta foi a primeira a tentativa, declarada inconstitucional, de legalizar a Sorte Varas. No acórdão pode ler-se, de entre outros motivos, o seguinte:

E cito.

(…) Também não está demonstrada, objectivamente, a existência de uma tradição arreigada, através de uma prática prolongada e ininterrupta. Com efeito, o legislador regional invoca "cinco séculos de história de relação dos açorianos com os touros" e a ancestralidade das festas Sanjoaninas mas apenas estima em doze anos o período pelo qual se têm vindo a realizar ininterruptamente touradas com "sorte de varas". (…)

Fim de citação.

Ou ainda, e cito.

(…) Não se elevando a prática da "sorte de varas" na Região Autónoma dos Açores a este patamar de antiguidade e de continuidade, como, aliás, é reconhecido pelo legislador regional, não se pode invocar uma especial configuração daquela matéria na Região.

Por todas estas razões, mesmo que se entenda que não está excluído a priori, pela própria natureza e pelos fins da proibição geral ancorada na protecção dos animais, o tratamento normativo desta matéria por uma Região Autónoma, não se pode concluir que haja uma configuração especial que justifique que a proibição de tais práticas se paute, na Região Autónoma dos Açores, por critérios diversos dos que valem para o todo nacional. (…)

Fim de citação.

Ou seja, existem razões do foro constitucional que não se prendem inteiramente com as competências autonómicas e justificaram a declaração de inconstitucionalidade em 2002.

2009 – foi apresentada à ALRAA uma proposta de DLR que visava a legalização da “Sorte de Varas”. A proposta foi subscrita por deputados de diferentes bancadas e foi dada liberdade de voto. A proposta veio a ser derrotada após um longo e disputado debate parlamentar por uma margem de dois votos, 26 a favor e 28 contra, registaram-se ainda 2 abstenções.

2015 – Correram rumores nos corredores da ALRAA que alguns deputados estavam a preparar, à margem dos seus próprios partidos, uma iniciativa parlamentar que visava a legalização da “Sorte de Varas”, disto foi dado conta numa publicação num blogue e a partir daí deu-se início à mobilização popular que subscreveu um manifesto no qual este se inspira e que foi suficiente para que a intenção, não tivesse passado disso mesmo, uma intenção que se esfumou nos passos perdidos do parlamento regional.

2025 – a situação é conhecida e esta e outras movimentações cidadãs surgiram com natural espontaneidade. Primeiro uma petição que já conta com mais de 2000 peticionários e que muitos dos subscritores do “manifesto” que aqui apresentamos também assinaram e, passados alguns dias teve início a redação e os contatos para a recolha de subscrições para este manifesto. O “manifesto e a “petição” não competem entre si, complementam-se e têm alcances diferentes.

Passarei agora à leitura do “Manifesto” ficando disponíveis para no final responder às questões que nos quiserem colocar.


“MANIFESTO CONTRA A LEGALIZAÇÃO DA SORTE DE VARAS NOS AÇORES

Somos todos Açores e qualquer prática legalizada numa das nossas ilhas implicará a Região no seu todo. Ora, as recentes notícias vindas a público fazem-nos temer que esteja a ser construída uma iniciativa parlamentar, a apresentar à Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), que visa, uma vez mais, a legalização da chamada “Sorte de Varas”, ou “Tourada Picada”, na ilha Terceira (o que significa, naturalmente, verter para os Açores o ónus dessa prática que nada tem a ver com a cultura ou tradição açoriana).  

Os cidadãos açorianos já iniciaram um forte movimento de contestação para uma vez mais impedir que se legalize uma prática cruel que, como já referimos, é estranha à ilha Terceira e aos Açores. Muitas são as vozes, de todos os quadrantes da sociedade, mesmo entre os aficionados, que se têm posicionado contra esta prática de crueldade extrema para com o touro, proibida em todo o país e que não se reveste, nas nossas ilhas, de qualquer caráter cultural, tradicional ou identitário. Acrescente-se que, a verificar-se, se trataria da quarta tentativa de legalização desta variante tauromáquica, tendo sido rejeitada, na ALRAA em 2009 por parcos dois votos.

Somos todos Açores e, numa altura de forte aposta no Turismo Sustentável, no Turismo de Natureza, assente sobretudo no respeito ambiental e na estreita e harmoniosa ligação do Homem com a Terra e com o Mar, não consideramos compreensível esta pretensão, que remete para uma forma de sofrimento animal que não é admissível nos dias que correm, e que mancharia, cá dentro e para quem nos visita, a imagem dos Açores – abrindo, além do mais, gravíssimas fendas na sociedade açoriana, que se quer coesa e unida. 

Somos todos Açores. Estas nove ilhas do verde e das águas límpidas, das belezas naturais e da comunhão com a Natureza, não merecem isto. Não merecem ficar conotados com uma nova forma de crueldade animal. Não merecem a mancha social e política que a legalização de uma prática deste teor traria para todo o arquipélago.

Porque somos todos Açores, e independentemente de a suposta iniciativa parlamentar chegar ou não à Assembleia Legislativa Da Região Autónoma dos Açores, manifestamo-nos CONTRA a legalização da Sorte de Varas nos Açores.”


Obrigado pela vossa presença e, tal com já foi dito, estamos disponíveis para as questões que nos quiserem colocar.


Angra do Heroísmo, 6 de fevereiro de 2025.


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

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Seminário Abertos "migrações" - Universidade Aberta
    Não é uma novidade, mas não deixa de ser uma temática que tem alguma relevância e é uma forma, como outras, de sustentar qualidade de vida quando já estamos livres das obrigações profissionais e dispomos de tempo para continuar a desenvolver atividades que nos mantêm ligados ao mundo, ainda que tenhamos por opção uma vida mais recatada e, por conseguinte, menos exposta. 

    Sim, uma vez mais trago a questão do envelhecimento, mas desta vez farei, para além, de valorizar a importância de manter atividade física, intelectual e participação cívica, algumas alusões, sem ajuizar, à visão que diferentes culturas têm dos idosos e do seu papel.

    E o tema surgiu naturalmente, não foi propriamente uma epifania, devido à minha participação em diversas atividades na passada semana para as quais foi solicitada a minha presença e intervenção, o que também não é novidade pois, desde que me aposentei/jubilei mantive as ligações com estruturas e organizações sindicais e políticas nas quais militei durante toda a minha vida adulta, mas também algumas ligações académicas e de colaboração com as organizações e instituições que se preocupam, estudam e agem na defesa dos migrantes, aqui ou em qualquer outro lado pois, como sabemos o direito a migrar está consagrado na “Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Depois da jubilação ainda acrescentei mais algumas atividades, físicas, intelectuais e cívicas sobre as quais sempre tive interesse, mas que o tempo não permitia desenvolver como o faço agora. 

imagem retirada da internet
Não vou deixar receitas para o envelhecimento ativo que prolongue por mais tempo a qualidade de vida, pois nunca gostei, nem gosto, de colonizar a vida de outros, cada um encontra o seu próprio caminho e disfruta das diferentes fases da vida como muito bem entende, desde que as suas opções não firam a liberdade e o bem-estar de outros, todavia, sempre direi que é consensual que a participação em atividades sociais e culturais contribui para reduzir o risco de algumas maleitas indesejáveis, por outro lado o exercício físico, não necessita mais do que simples caminhadas e alguns exercícios para tonificar os músculos e manter a flexibilidade são, igualmente, essenciais para promover a saúde cardiovascular e o comodidade física geral,  por fim, mas não menos importante a atividade intelectual: ler e nunca deixar de procurar mais, e mais, conhecimento, ou seja estimular a cognição reduz substancialmente o risco de desenvolvimento de algumas doenças do foro neurológico.

    Manter os idosos ativos e participativos é uma prática que o ocidente “desenvolvido” tem vindo a perder com um claro prejuízo para as comunidades pois, abdicar da participação de cidadãos que são portadores de um vasto conhecimento é, parece-me, um desperdício. 

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    Os cidadãos mais idosos podem constituir-se como importantes mediadores geracionais, assim como estabelecer as pontes entre a ancestralidade e a modernidade, afinal eles assistiram a importantes alterações científicas e tecnológicas e, souberam adaptar-se. Mas não é só, a presença ativa de idosos em iniciativas sociais e culturais pode, também, contribuir para a coesão e para o reforço da identidade e solidariedade comunitária.

    Manter os idosos ativos e integrados socialmente não é apenas benéfico para os próprios, mas também para a sociedade da qual fazem parte por direito. Afigura-se, assim, que as abordagens às questões relacionadas com este importante segmento da sociedade sejam traduzidas em políticas públicas que os valorizem enquanto depositários de saberes que devem ser partilhados com os seus concidadãos. Ficar apenas por garantir a abertura de centros de dia, lares de acolhimento, ou casas de repouso, ou seja, lares para a terceira idade é muito pouco e, sobretudo, redutor.

    Se as sociedades “ocidentalizadas” e a cultura da atomização social desperdiçam os seus idosos e até os apelidam de “peste grisalha”, outras, porém, valorizam os anciãos e têm por eles respeito e deferência. Não temos sequer de seguir os exemplos de outas culturas como as do Japão, da China ou da Coreia, ou mesmo de algumas culturas nativas das Américas ou de África onde os idosos são olhados como referências e devidamente integrados e cuidados no seio da família e da comunidade de pertença, mas não podemos, nem devemos, desaproveitar todo o capital social e cultural de que são detentores, marginalizando-os e depreciando-os.

imagem retirada da internet
    A atomização social resulta de processos relacionados com o progresso e a modernidade, como por exemplo: a) a migração para as áreas urbanas e, por conseguinte, o crescimento das cidades e a desertificação das áreas rurais; b) promoção do sucesso individual com um claro prejuízo das realizações coletivas e comunitárias; c) as plataformas de informação e comunicação que ao invés de unir promovem o isolamento e o encapsulamento, contribuindo para o enfraquecimento das relações sociais; d) os efeitos do globalismo (desemprego, migrações e trabalho precário; e) fragilidade e perda de confiança nas instituições tradicionais (família alargada, ausência do estado); e, f) a constante mobilidade (por trabalho, estudo, migração forçada) que desmorona as comunidades. Sendo caraterísticas dos nossos tempos, será bom que tenhamos consciência que a atomização social nos aparta das comunidades de pertença e nos torna (velhos e novos) mais vulneráveis. Julgo, por isso, que devemos estar atentos aos efeitos perversos deste fenómeno social e construir estratégias que o contrariem, sob pena de, em nome da liberdade individual, se acentuar a manipulação, a modelação do pensamento e o individualismo e, por conseguinte, o aprofundamento do domínio que podendo ser individual tem reflexos negativos na construção de soluções coletivas que podem, essas sim, abrir caminhos à libertação e à transformação que exigimos para a sustentabilidade da vida no planeta e para a justiça social e económica.

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    Regressando ao tema central desta semana pode, não direi concluir-se, pois, as conclusões são sempre de quem lê, acrescentar-se mais umas palavras que poderão contribuir para aprofundar a reflexão sobre os idosos e o envelhecimento e o que devemos ou não fazer para que as políticas públicas atendam às necessidades, mas também ao capital social que representam os idosos (mais de 65 anos), mantendo-os ativos na vida das suas comunidades, aliás como muitos procuram fazê-lo em várias frentes.

    As diferentes culturas e civilizações refletem como as sociedades encaram o envelhecimento e o papel dos idosos na sociedade. E a forma como o entendem é visível nas políticas públicas, com os devidos reflexos na esperança de vida com qualidade e bem-estar, mas se algumas culturas contam com os seus idosos como pilares da comunidade e fontes de sabedoria, outras, como a nossa, tendem a marginalizá-los e optam por políticas mais consentâneas com supostos e hodiernos modelos de valorização de tudo o que é novo esquecendo o passado. Há, contudo, alguns sinais de esperança que se manifestam no crescente reconhecimento da importância de manter os idosos integrados e ativos de maneira significativa, e isto verifica-se independentemente dos contextos culturais, embora o neoliberalismo se vá sistematicamente opondo a isso. As sociedades ocidentalizadas, não é uma referência geográfica, ou as que o pretendem ser continuam a olhar para os idosos não como um importante ativo, mas como uma despesa pública dispensável.

Ponta Delgada, 4 de fevereiro de 2025 

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 5 de fevereiro de 2025

da atomização social

Aníbal C. Pires - foto de Henrique Borges


Excerto de texto para publicação no Diário Insular e, como é habitual, também aqui no blogue momentos.






(...) Se as sociedades “ocidentalizadas” e a cultura da atomização social desperdiçam os seus idosos e até os apelidam de “peste grisalha”, outras, porém, valorizam os anciãos e têm por eles respeito e deferência. Não temos sequer de seguir os exemplos de outas culturas como as do Japão, da China ou da Coreia, ou mesmo de algumas culturas nativas das Américas ou de África onde os idosos são olhados como referências e devidamente integrados e cuidados no seio da família e da comunidade de pertença, mas não podemos, nem devemos, desaproveitar todo o capital social e cultural de que são detentores, marginalizando-os e depreciando-os.

A atomização social resulta de processos relacionados com o progresso e a modernidade, como por exemplo: a) a migração para as áreas urbanas e, por conseguinte, o crescimento das cidades e a desertificação das áreas rurais; b) promoção do sucesso individual com um claro prejuízo das realizações coletivas e comunitárias; c) as plataformas de informação e comunicação que ao invés de unir promovem o isolamento e o encapsulamento, contribuindo para o enfraquecimento das relações sociais; d) os efeitos do globalismo (desemprego, migrações e trabalho precário; e) fragilidade e perda de confiança nas instituições tradicionais (família alargada, ausência do estado); e, f) a constante mobilidade (por trabalho, estudo, migração forçada) que desmorona as comunidades. Sendo caraterísticas dos nossos tempos, será bom que tenhamos consciência que a atomização social nos aparta das comunidades de pertença e nos torna (velhos e novos) mais vulneráveis. Julgo, por isso, que devemos estar atentos aos efeitos perversos deste fenómeno social e construir estratégias que o contrariem, sob pena de, em nome da liberdade individual, se acentuar a manipulação, a modelação do pensamento e o individualismo e, por conseguinte, o aprofundamento do domínio que podendo ser individual tem reflexos negativos na construção de soluções coletivas que podem, essas sim, abrir caminhos à libertação e à transformação que exigimos para a sustentabilidade da vida no planeta e para a justiça social e económica. (...)


terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Claudia Sheinbaum - a abrir fevereiro


Claudia Sheinbaum  é Presidente do México e tem governado com o povo e para o povo.  Claudia é uma daquelas mulheres que lutam e, por essa razão são lindas. A Claudia faz parte desse grupo de mulheres bonitas que costumo trazer aqui.


quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Para além da morte

imagem retirada da internet
    O passado dia 20, segunda-feira, foi marcado por vários acontecimentos sobre os quais não podemos passar como “… cão por vinha vindimada”.

    A tomada de posse do novo inquilino da Casa Branca. Trata-se, como se sabe, de um regresso a que o mundo, por diferentes razões, não fica indiferente. Por mim, e para já, nada tenho a dizer, a escolha, quer se goste ou não goste, foi do povo estado-unidense e, como tal, respeitável como outras escolhas populares, digo eu que tenho uma visão diferente dos democratas encartados que por aí pululam e para os quais os resultados eleitorais só são aceitáveis quando servem os “seus” propósitos. A referência a um dos eventos está feita, sobre o que vier a acontecer decorrente da atuação da nova administração estado-unidense será, na devida altura, objeto de uma ou outra nota conforme os seus impactos internos e externos.

    O dia da aludida tomada de posse coincidiu com um feriado, um de três, nos Estados Unidos dedicado a uma personalidade, neste caso é dia de Martin Luther King, uma paradoxal coincidência. O feriado dedicado a Luther King assinala-se na terceira segunda-feira de janeiro, pela proximidade com a data do seu nascimento, este ano, por acaso do calendário, aconteceu ser empossado como presidente dos Estados Unidos uma personalidade que está nos antípodas de grande humanista e símbolo da luta pelos direitos civis naquele país. Sobre Martin Luther King já esta semana foi publicado, num jornal da Região, um texto de Diniz Borges que julgo ser suficiente para honrar a sua memória e a sua luta. Dedico as próximas palavras a uma outra personalidade que, tal como Luther King, perdura para além da sua morte: Amílcar Cabral. 

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    O passado dia 20 de janeiro regista a passagem dos 52 anos do assassinato de Amílcar Cabral, perpetrado por elementos do próprio PAIGC, a mando do regime colonial português. Mais do que sobre a sua morte importa a lembrança do seu legado que ainda hoje é uma referência para o continente africano e para o mundo e, por isso mesmo, objeto da atenção dos meios académicos. Por estes dias, no âmbito de uma pesquisa sobre Amílcar Cabral visionei um vídeo sobre as mulheres na luta pela independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau de onde extraí duas frases, proferidas por mulheres, que dizem bem da dimensão do homem e da sua obra. O contexto era a morte de Amílcar Cabral, e passo a citar:

“(…) isto chegou ao fim, mas depois vimos que não era o fim. É aí que reside o valor de Cabral: projetar-se para além da sua morte (…)”. Zezinha Chantre.

“(…) perdemos um grande homem, mas ele soube transmitir-nos a sua força de tal forma que a nossa luta redobrou de intensidade e chegamos à independência sem a sua presença, mas com ele no coração. (…), Amélia Araújo.

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    A declaração unilateral de independência da Guiné-Bissau chegou ainda em 1973, foi reconhecida internacionalmente, embora Portugal só o tenha feito alguns meses depois do 25 de Abril, em setembro de 1974, o que coloca, ou pode colocar, algumas interrogações sobre o processo revolucionário e contrarrevolucionário no que à descolonização diz respeito.

    O regime fascista e colonial português chamava terrorista a Amílcar Cabral, mas foi esse mesmo regime que empurrou os movimentos de libertação para a luta armada ao recusar todas as propostas de solução pacífica para a descolonização e a independência. No que concerne ao PAIGC e á luta pela independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau é bom que tenhamos em consideração o memorando enviado ao Governo português em 1960 e a nota aberta, em 1961, os quais foram ignorados, tendo a ação do governo de Salazar passado por aumentar a repressão sobre as populações e o reforço da presença militar numa clara demonstração de que o caminho da paz estava arredado dos propósitos do país colonizador.

    Amílcar Cabral foi uma personalidade multifacetada e um humanista. Sei que parece um lugar-comum, mas ainda assim, direi que Cabral era um homem muito à frente do seu tempo.  As questões da igualdade de género, do desenvolvimento sustentável e, por conseguinte, as questões ambientais eram, a par da justiça social, da eliminação de todas as formas de discriminação e da luta contra o colonialismo algumas das suas bandeiras e que influenciaram toda a sua vida e a sua luta.

    Um aspeto do pensamento de Amílcar Cabral que a maioria dos portugueses não terá conhecimento, ou pelo menos uma consciência apurada, relaciona-se com o seu opinião em relação ao fim do regime fascista em Portugal e a luta de libertação, sobre o qual diz o seguinte: (…) Nós estamos absolutamente convencidos de que, se em Portugal se instalasse amanhã um governo que não fosse fascista, mas fosse democrático, progressista, reconhecedor dos direitos dos povos à autodeterminação e à independência, a nossa luta não teria razão de ser. Aí está a ligação íntima que pode existir entre a nossa luta e a luta antifascista em Portugal; mas também, estamos absolutamente convencidos de que, na medida em que os povos das colónias portuguesas avancem com a sua luta e se libertem totalmente de dominação colonial portuguesa, estarão contribuindo de uma maneira muito eficaz para a liquidação do regime fascista em Portugal. (…).

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    Não há como discordar de Amílcar Cabral. Teremos todos alguma consciência que as guerras de libertação dos povos das colónias portuguesas contribuíram significativamente para que o regime fascista português tivesse chegado ao fim naquela madrugada de Abril. Não foi por acaso que o povo português saiu à rua para apoiar o movimento das forças armadas que depôs o regime, um dos motivos decorre diretamente do anunciado fim da guerra colonial pois, todas as famílias sofriam com a ida dos seus filhos para a guerra, uma guerra que não era sua, com tudo o que isso significava. Não foi apenas, pois, muitos outros contributos e variáveis se podem aduzir para que Abril tivesse acontecido e, sobretudo, para que os caminhos de Abril tivessem Maio sempre presente apesar dos esforços para que a revolução portuguesa não fosse além da transmissão do poder para um antigo governador da Guiné.

    A faceta poética de Amílcar Cabral não será, de todo, desconhecida dos portugueses e trago-a aqui, para ilustrar uma dimensão menos referida deste homem de cultura, este poema que se intitula: A minha poesia sou eu.

… Não, Poesia:/Não te escondas nas grutas de meu ser,/não fujas à Vida./Quebra as grades invisíveis da minha prisão,/abre de par em par as portas do meu ser/— sai…/Sai para a luta (a vida é luta)/os homens lá fora chamam por ti,/e tu, Poesia és também um Homem./Ama as Poesias de todo o Mundo,/— ama os Homens/Solta teus poemas para todas as raças,/para todas as coisas./Confunde-te comigo…/Vai, Poesia:/Toma os meus braços para abraçares o Mundo,/dá-me os teus braços para que abrace a Vida./A minha Poesia sou eu.

Poema publicado na revista “Seara nova”, em 1946. Amílcar Cabral estudava agronomia em Lisboa e tinha 22 anos.

Ponta Delgada, 20 de janeiro de 2025 

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 22 de janeiro de 2025

paradoxal coincidência

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Excerto de texto para publicação no Diário Insular e, como é habitual, também aqui no blogue momentos.


(...) A tomada de posse do novo inquilino da Casa Branca. Trata-se, como se sabe, de um regresso a que o mundo, por diferentes razões, não fica indiferente. Por mim, e para já, nada tenho a dizer, a escolha, quer se goste ou não goste, foi do povo estado-unidense e, como tal, respeitável como outras escolhas populares, digo eu que tenho uma visão diferente dos democratas encartados que por aí pululam e para os quais os resultados eleitorais só são aceitáveis quando servem os “seus” propósitos. A referência a um dos eventos está feita, sobre o que vier a acontecer decorrente da atuação da nova administração estado-unidense será, na devida altura, objeto de uma ou outra nota conforme os seus impactos internos e externos.

O dia da aludida tomada de posse coincidiu com um feriado, um de três, nos Estados Unidos dedicado a uma personalidade, neste caso é dia de Martin Luther King, uma paradoxal coincidência. O feriado dedicado a Luther King assinala-se na terceira segunda-feira de janeiro, pela proximidade com a data do seu nascimento, este ano, por acaso do calendário, aconteceu ser empossado como presidente dos Estados Unidos uma personalidade que está nos antípodas de grande humanista e símbolo da luta pelos direitos civis naquele país. Sobre Martin Luther King já esta semana foi publicado, num jornal da Região, um texto de Diniz Borges que julgo ser suficiente para honrar a sua memória e a sua luta. Dedico as próximas palavras a uma outra personalidade que, tal como Luther King, perdura para além da sua morte: Amílcar Cabral. (...)


segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

pelos 52 anos da morte de Amílcar Cabral - não foi o fim

Passam hoje 52 anos sobre a morte de Amílcar Cabral. O "momentos" assinala esta data prestando assim tributo ao líder que conduziu a luta armada, para a qual foi empurrado, pela independência da Guiné e Cabo Verde (quem fecha as portas à revolução pacífica abre as portas à revolução violenta).

Os caminhos do pós-independência foram diversos para estes dois países para os quais Amílcar sonhava paz, prosperidade, justiça social e económica. 

Os herdeiros políticos de Amílcar Cabral destruíram, quer em Cabo Verde, quer na Guiné-Bissau, o seu projeto político e defraudam a cada dia o sonho e a utopia que mobilizou aqueles povos para se libertarem do colonialismo português e construírem um futuro de paz e prosperidade.

"Se alguém me há de fazer mal, é quem está aqui entre nós. Ninguém mais pode estragar o PAIGC, só nós próprios."

Amílcar Cabral


Por estes dias, no âmbito de uma pesquisa sobre Amílcar Cabral visionei um vídeo sobre as mulheres na luta pela independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau de onde extraí duas frases, proferidas por mulheres, que dizem bem da dimensão do homem e da sua obra. O contexto era a morte de Amílcar Cabral, passo a citar:

“(…) isto chegou ao fim, mas depois vimos que não era o fim. É aí que reside o valor de Cabral: projetar-se para além da sua morte (…)”. Zezinha Chantre.

“(…) perdemos um grande homem, mas ele soube transmitir-nos a sua força de tal forma que a nossa luta redobrou de intensidade e chegamos à independência sem a sua presença, mas com ele no coração. (…), Amélia Araújo.


terça-feira, 14 de janeiro de 2025

"Viagem pela Arte" - Ugolina Batista








Embarquei na “Viagem pela Arte” que Ugolina Batista tem em exposição no Centro Municipal de Cultura, em Ponta Delgada. 







A jornada foi prazerosa para o olhar, pela diversidade de materiais, suportes e técnicas que a Ugolina utiliza para expressar a sua criatividade e sensibilidade artística. As suas obras circulam pela pintura em porcelana, instalações com base de areia, ou com recurso a objetos que perderam o uso, mas que a Ugolina recria e lhes dá um novo uso estético, ou ainda o detalhe da pintura sobre tela, e algumas abordagens mais contemporâneas que traduzem um percurso dinâmico e de permanente atualização.







Nesta” Viagem pela Arte”, Ugolina Batista convida-nos a explorar as infinitas possibilidades a que a criatividade nos pode conduzir, mas esta jornada revela um percurso artístico tão admirável quanto a generosidade de quem o construiu. A Ugolina é uma amiga inspiradora pela criação artística e pela sua participação na vida cultural da sua comunidade. Muito me honra a sua amizade.