sexta-feira, 30 de outubro de 2009

As pessoas antes dos lucros

Passou sensivelmente um ano desde que o Governo, tardia e relutantemente, acabou por reconhecer que a tal crise “que chegaria mais tarde aos Açores e que se iria embora mais cedo”, tinha afinal chegado. A crise estava instalada muito antes de ser “decretada” e não tem dado sinais de se ausentar nem mais, nem menos depressa como profeticamente foi anunciado.
Quase um ano passou sobre a criação de um pacote de medidas para combate à crise e aos seus efeitos. É, portanto, tempo de se proceder a um balanço da sua eficácia.
Os dados e indicadores necessários para este balanço aí estão e são claros para todos os que os quiserem ler sem a cegueira do dogmatismo.
O grau de endividamento das empresas e das famílias, a retracção da produção e do consumo, o crescimento do desemprego, são indicadores reais e não há cenários de confiança ancorados na excitação da alta bolsista, das últimas semanas, que os disfarcem.
Os que acenam como sinal de confiança e retoma a recuperação de que se tem verificado nas principais bolsas onde se desenvolve a economia virtual, como sendo um indício infalível da ansiada recuperação da economia real, demonstram que nada aprenderam com o desastre global que vivemos, pensando provavelmente, que tudo voltará a ser como dantes, com os sectores especulativos a continuar a desbaratar a riqueza das nações por tóxicas fantasias financeiras, a troco da miséria de mais metade dos habitantes do planeta.
A verdade que temos de enfrentar é que, não só a crise não está debelada, nem controlada, nem terminada, como na verdade se aprofunda. O que temos de assumir é que muitas das medidas tomadas se revelaram completamente insuficientes.
O ritmo de destruição de emprego na Região atinge níveis alarmantes em todas as áreas de actividade, nomeadamente, nos serviços e entre os trabalhadores qualificados. O brutal aumento do desemprego e as expectativas pessimistas que, quer a União Europeia, quer a OCDE, tornaram públicas sobre a sua evolução para o ano de 2010 exigem políticas concretas, eficazes e assertivas para contrariar esta tendência negativa. Uma tendência que põe em causa qualquer pretensão de desenvolvimento harmonioso, qualquer esperança de avançarmos no caminho da tão desejada coesão social, territorial e económica.
Por outro lado, os rendimentos dos trabalhadores açorianos, apesar dos mecanismos existentes, em termos de fiscalidade e de acréscimos salariais, continuam a apresentar valores substancialmente inferiores aos dos seus congéneres continentais. A pobreza e a exclusão social são uma realidade em curva ascendente da qual, quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista humano, não nos podemos alhear metendo, como essa magnífica ave que dá pelo nome de avestruz, a cabeça na areia.
Em tempo de discussão do Plano e do Orçamento Regional para o ano de 2010 são necessárias novas políticas de investimento que valorizem o trabalho e os trabalhadores. Políticas que coloquem as pessoas antes dos lucros.
Aníbal C. Pires, IN A UNIÃO, 30 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Viroses

Carlos César, na qualidade Presidente do Governo Regional, veio a terreiro criticar a actuação e o mediatismo do médico Mário Freitas.
Tudo gira, ao que parece, à volta das críticas que profusamente Mário Freitas tem vindo a fazer à estratégia seguida pela administração regional de saúde no combate à disseminação do vírus da gripe A(H1N1). Aparentemente porque as medidas preconizadas e as críticas feitas pelo Dr. Mário Freitas não diferem tanto assim da realidade. O diferendo tem, certamente, raízes mais profundas e a razão não assiste nem à estratégia da Secretaria Regional da Saúde nem, tão-pouco, ao Delegado de Saúde em questão pois, face à disseminação do vírus da gripe A(H1N1) contribuiu, ainda mais, para um clima alarmista. Estamos a falar de um vírus com uma elevada capacidade de contágio mas cujos efeitos letais são bem menores que o vírus da gripe sazonal.
Mal, mas mesmo mal, ficam a Directora Regional e o Secretário Regional da Saúde desautorizados, que foram, com a atitude de Carlos César quando veio censurar, com a acidez que bem se lhe conhece, o excessivo mediatismo de Mário Freitas, revelando o seu incómodo pelas críticas às suas políticas de combate ao temporão e atípico vírus gripal. Este é um comportamento recorrente do Presidente do Governo Regional. Outros casos semelhantes são do domínio público.
A autoridade que emana do Palácio de Santana é intocável e para que todos percebam quem manda, eis que o Presidente Governo Regional decidiu que o Cais de Cruzeiros da Ilha Terceira se vai situar em Angra do Heroísmo.
Assim, sem mais nem menos, num exercício autoritário do poder, decidiu: “- É em Angra.”
E pronto! Angra do Heroísmo vai ter um Cais de Cruzeiros porque Carlos César assim o entende. Porquê em Angra e não na Praia? Que fundamentos presidiram a tal decisão?
Não disponho de informação suficiente para poder ter uma opinião fundamentada sobre a localização do Cais de Cruzeiros ou mesmo se a infra-estrutura deverá ser ou não, no presente, a grande prioridade de investimento público para a Ilha Terceira, mas julgo que a decisão presidencial deveria ter sido precedida de discussão pública e de uma avaliação rigorosa quer das prioridades de investimento na Terceira, quer ainda dos impactos, num e noutro local, da implantação de uma obra desta dimensão.
Este surto de atitudes autoritárias de Carlos César, como já disse, não é novo. A virose do autoritarismo contraída em 2000, com a primeira maioria absoluta, permanece em latência. O fim do ciclo eleitoral, os resultados obtidos nas legislativas e nas autárquicas pelo PS e a distância que nos separa de 2012, terão sido os factores que favoreceram a actividade do vírus adormecido e eis que o despotismo surge naturalmente nas palavras, atitudes e decisões do Presidente do Governo Regional dos Açores.
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 28 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Fragmentos do quotidiano

Este texto marca o início da colaboração com o "Diário Insular".
Este será o primeiro de alguns “fragmentos do quotidiano” que por aqui deixarei, não interessa quantos nem por quanto tempo. Nada é imutável o que constitui um perpétuo e aliciante desafio. Semanalmente virei ao vosso encontro até que valha a pena. Valha a pena por mim, pelo prazer que a escrita e a partilha me proporcionam. E… Valha a pena por vós. Só se os textos que vos trouxer merecerem a vossa atenção valerá a pena, ainda que, … a esperança só morra comigo e a alma não seja pequena.
Sem leitores o exercício da escrita pouco significa e, se for apenas para satisfação do meu ego, então não ocuparei indevidamente espaço e tempo que não são meus. Disponho de outros suportes onde deixo que as palavras respirem e andem por aí sem grilhetas formais, trilhando os caminhos da liberdade. Outros suportes onde a momentos derramo pedaços, registos, instantes, olhares, notas à solta… Vantagens das novas tecnologias de informação e comunicação que nos permitem a auto-satisfação narcísica, mas também espaços de intervenção e formação de opinião e debate.
Aqui, neste espaço e neste suporte, mais do que ideias feitas procurarei, sem abdicar da minha opinião à qual está associada uma matriz ideológica, promover e incentivar o diálogo, a cogitação, a discussão e o contraditório. Só assim, em minha opinião (cá está ela), estes pedaços do dia-a-dia farão sentido. Fica o meu endereço de correio electrónico (anibalpires@sapo.pt) para o qual podem enviar opiniões e comentários o que muito agradeço.
Do meu círculo familiar e de amigos, do meu bairro, da minha Freguesia, da minha Cidade, da minha Região, do meu País e do Mundo, tento ter uma visão multilateral onde as diferenças devem ser respeitadas, as interacções valorizadas e os consensos procurados. Todos temos a nossa “verdade” e uma matriz cultural que nos torna diferentes, mas as pontes são sempre possíveis quando promovemos o diálogo em nome do interesse colectivo. A unilateralidade das análises é redutora, induz em erro e promove a imposição de uma “verdade” que nem sempre, quase nunca, é a que mais se aproxima da realidade e naturalmente do interesse comum.

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 21 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

domingo, 25 de outubro de 2009

Intermitências das "águas"


As águas-furtadas dominam sobre o casario
O recorte intermitente dos cumes
Encanta-me.


Gosto!
Da descontinuidade
E dos espaços
Furtados à uniformidade das águas
Excitam a fantasia
Quantas utopias e gestas ali coabitaram
Quantas ilusões ali criadas e aniquiladas
Que sonhos ali jazem
Eternamente adormecidos




Que devaneios
Que sonhos
Dali partiram
Convertidos em existências
Alheias ao espaço
Das águas-furtadas


sábado, 24 de outubro de 2009

Ainda não são as palavras

Foto by Aníbal C. Pires
Não são ainda as palavras que por aqui ficaram prometidas.
Ficam apenas estas imagens do Pico registadas hoje de manhã.


Foto by Aníbal C. Pires

Já não era o alvorecer
O Sol espreitava no cume
A luz suave da manhã
Varria a encosta
Numa suave carícia
Iluminando o Sábado
Prometendo o dia


Foto by Aníbal C. Pires

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Vocação autárquica

As eleições autárquicas ditaram resultados que escaparam às previsões mais ousadas dos analistas, dos politólogos, dos partidos políticos e coligações e, quiçá, até de quem foi abençoado com o dom da adivinhação.
Na Região não se esperava um empate, porque matematicamente não era possível, e aguardava-se, legitimamente, equilíbrio no número de Câmaras conquistadas pelo PS e PSD. À medida que os resultados foram sendo conhecidos e de surpresa em surpresa os intervenientes foram apanhados desprevenidos perante o que se desenhava naquela noite eleitoral. Alguns nem tiveram tempo de se recompor da estranha sensação de terem saído derrotados ou vencedores desta contenda eleitoral. Quanto mais tempo para perceber como é que tinha sido possível um desenlace daqueles. Como é que foi possível? Como se justifica tamanho desaire? Ganhámos mas… como!?
Os resultados que se verificaram no que concerne à contabilidade das Presidências de Câmara ganhas e perdidas – 12 para o PS e 7 para o PSD – apanharam tudo e todos de surpresa e alguns dos resultados concelhios, com particular incidência em Vila Franca do Campo, merecem mesmo um aturado estudo e reflexão sobre o intrincado processo decisório dos eleitores.
O que terá pesado mais na decisão dos cidadãos? O projecto político? O futuro colectivo? A promessa… do que quer que seja? A oferta que pode ir da simples esferográfica, ao saco de cimento, aos blocos e à areia, aos electrodomésticos ou a garantia de um emprego para si ou para os seus, isto para não falar em toalhas de renda para a mesa de sala de jantar ou, das simples e vulgares t-shirts!?
Para além do espanto que constituiu o resultado das eleições autárquicas na Região, surpresa que vale o que vale, importante são mesmo as soberanas escolhas feitas pelos açorianos que, por mais que contrariem os objectivos e as expectativas político eleitorais, devem ser respeitados e aceites com humildade democrática, atitude que alguns actores políticos não souberam gerir, dissimulando muito mal o seu desagrado perante o desfecho eleitoral.
A líder do PSD Açores teve muitas dificuldades em assumir a derrota eleitoral e não conseguiu disfarçar a perturbação por ter ficado muito aquém daqueles que eram os seus objectivos eleitorais. Objectivos, já em si mesmo, pouco ambiciosos para quem se anuncia como alternativa ao actual poder regional.
Berta Cabral “demitiu-se” das suas responsabilidades regionais esquecendo os seus correligionários, que protagonizaram as candidaturas autárquicas do PSD e saíram derrotados, não lhes dirigindo uma palavra de alento e solidariedade. Berta Cabral não teve a nobreza de estender o manto da liderança sobre os seus esforçados dirigentes e militantes que se envolveram nesta batalha eleitoral e que não resistiram à eficaz máquina trituradora do partido/governo.
Ao assumir-se exclusivamente como autarca ganhadora em Ponta Delgada e escamoteando as suas responsabilidades enquanto líder partidária, Berta Cabral, demonstrou que a sua verdadeira vocação se situa ao nível da governação autárquica e, na retina dos açorianos, fica a imagem de que a alternativa política regional não se situa no PSD Açores, independentemente da personalidade que o lidera.
As alternativas políticas têm protagonistas mas o que lhes dá o verdadeiro suporte são os projectos políticos alternativos e, isso, o PSD também não tem.
Aníbal C. Pires, In A UNIÃO, 23 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Cultura mais pobre nos Açores

As políticas pouco têm a ver com quem em determinado momento as protagoniza.
Mas não há dúvidas que a cultura, no anunciado governo de Sócrates, fica claramente beneficiada com a entrada de uma mulher que para além de todas as qualidades que lhe reconheço, é sem dúvida, de uma beleza invulgar.
O governo do PS ficou claramente beneficiado com a entrada de Gabriela Canavilhas e a saída de Maria de Lurdes Rodrigues.

A Gabriela Canavilhas, para lá das divergências políticas que nos separam formulo votos de um bom desempenho no seu novo cargo.
E não posso deixar de registar que a cultura nos Açores ficou empobrecida com a sua saída da Direcção Regional que tutelava.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Desobriga

O post anterior suscitou muitas críticas telefónicas e, para já, um comentário.
Foram as louras que apoiaram, foram as louras que não acharam graça, foram as morenas de olhos azuis que se sentiram discriminadas, foram as morenas, as ruivas, as orientais, as africanas e as sul-americanas que perguntaram: Mas para quê uma loura? E, ainda, um sem número de seres do género masculino que me criticaram por eu ter dado por falta de uma loura perante tanta beleza.
Como é que raio tiveste discernimento para, perante tal quadro e tamanha beleza, dar por falta de uma loura? Foi a pergunta mais frequente de alguns amigos que telefonicamente manifestaram a sua opinião sobre o texto que acompanha a foto do post anterior.
Todas as críticas são fundamentadas e justas e este post constitui a minha desobriga perante tudo aquilo que me foi dito, até porque já hoje visitei o blogue “E Deus Criou a Mulher” quando percebi que nas novidades havia uma Cruz e eu bem preciso de expiar o "pecado" que levantou tanta controvérsia.
Não pude deixar de ir espreitar pondo fim ao meu boicote pessoal ao “E Deus Criou a Mulher

A foto acima é um acto de justiça. “E Deus Criou a Mulher” é um blogue plural que publica a beleza feminina sem nenhum tipo de discriminação. No caso vertente são mesmo as louras que predominam, faltando muitas outras.

domingo, 18 de outubro de 2009

Um post pós ciclo eleitoral

Num momento de descontracção após o desfecho do ciclo eleitoral - nos Açores teve no espaço de um ano quatro actos eleitorais – da análise aos resultados e dos efeitos imediatos que produziram, porque outros efeitos só daqui a algum tempo se terá noção do seu real impacto na vida política regional e nacional mas, como dizia num momento mais relaxante encontrei a foto abaixo que retirei daqui.



Se linkaram deram conta que entraram num blogue que classifico de culto à beleza feminina, aliás não é a primeira vez que o “momentos” se socorre das imagens de “E Deus Criou a Mulher" e como os visitantes já deram conta está na lista dos meus blogues de referência. Eu como disse classifico-o como um lugar de culto à beleza feminina, outros poderão classificá-lo como muito bem entenderem. Não discuto nem me preocupa a divergência de opinião no que toca ao conteúdo do blogue a que me tenho vindo a referir.
Mas ao ver a foto não pude deixar de considerar que havia qualquer coisa de discriminatório naquela imagem.
Falta, pelo menos, uma mulher loura!
Louras! Durante uma época o paradigma da “sex-simbol”, mais recentemente alvo das anedotas mais abjectas sobre a sua inteligência humana e agora, logo aqui, afastada de um colectivo de mulheres que merecem ser contempladas até que o olhar nos doa.
Não é aceitável. Considero uma inqualificável discriminação à beleza e ao encanto das mulheres abençoadas com o dourado dos seus cabelos.
Em sinal de protesto por este acto discriminatório vou deixar, durante alguns dias (poucos), de visitar “E Deus Criou a Mulher”.

sábado, 17 de outubro de 2009

Conquistas e retrocessos

Nem sempre é fácil. Por vezes é até bem complicado e problemático mas, talvez por isso os desafios sejam tão aliciantes e quantas vezes as vicissitudes da vida não servem de mote à criatividade, à inovação e às transformações tantas vezes desejadas quantas vezes adiadas. Se isto é válido no domínio do indivíduo, ou pelo menos há um entendimento generalizado de que assim é, o mesmo se poderá inferir para as realizações colectivas.
Nada disto é novidade. Acontece desde o princípio dos tempos, é inato. É uma herança aperfeiçoada ao longo do extenso caminho da evolução.
A sociedade contemporânea é fruto da evolução natural a que me referi mas é também, e muito, resultado de construções sociais fundadas em valores, também eles em constante evolução e aperfeiçoamento, de onde deveria resultar bem-estar e qualidade de vida para todos os indivíduos. Foi à sombra destes princípios que cresci e me formei no seio da família, na escola e na vida social e colectiva. Acredito, por isso, que um dia os humanos evoluirão para comportamentos menos inatos e mais próximos das representações sociais que fazemos da humanidade.
Se tenho dúvidas? Sim, tenho muitas. Muitas incertezas e interrogações para as quais nem sempre encontro respostas plausíveis.
Há poucos dias as televisões noticiavam com a devida relevância e associação ao progresso e à evolução a abertura de agências bancárias, de um grupo financeiro nacional, aos sábados. É a adaptação às necessidades da vida moderna dir-me-ão. Eu direi que é um sinal de escravização pois se só temos tempo para ir ao banco aos Sábados e aos espaços comerciais à noite ou aos Domingos alguém subtraiu tempo ao nosso tempo.
O prolongamento e a flexibilização dos horários de trabalho, nomeadamente dos trabalhadores das agências bancárias que abrem ao público aos Sábados, contribuiu para a aceitação generalizada, como um sinal de evolução e de progresso, de horários nocturnos e aos fins de semana de sectores de actividade comercial aos quais temos de recorrer com frequência, como sejam por exemplo os hipermercados.
Quando era criança lembro-me de ficar a olhar para a Lua tentando identificar a figura de um homem que, por não ter guardado o dia de descanso semanal dedicado ao Senhor, tinha sido castigado por Deus e por Ele ali colocado eternamente para servir de exemplo aos Homens.
Já ninguém conta esta estória nem será aconselhável lembrá-la pois quem o fizer será por certo acusado de retrógrado e sabe-se lá que mais.
A valorização do trabalho e dos trabalhadores, aquisição social consolidada na segunda metade do século XX, consagrou semanas de trabalho de 5 dias e de 35/40 horas, pagamento diferenciado do trabalho nocturno e do trabalho extraordinário.
Na primeira década do Século XXI talvez não seja má ideia rebuscar os argumentos do castigo de Deus, mesmo correndo o risco de não ser compreendido, para garantir a subsistência de dias de descanso semanal para quem trabalha por conta de outrem.
Aníbal C. Pires, IN A UNIÃO, 17 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Não é o fado

Este texto foi escrito no dia 4 de Setembro e publicado na edição de Outubro do Jornal Açores 9.


Foi tempo de eleições. Os cidadãos, não tantos quantos seria de desejar, exerceram o seu direito de voto. Fizeram as suas escolhas na nossa empobrecida democracia. Pobre porque só apela à participação dos cidadãos em tempo de eleições. Pobre porque é mais representativa do que participativa. Pobre porque não cultiva a participação e a iniciativa popular. Pobre porque desacreditada por alternâncias de poder que nada transformam. Pobre porque descredibilizada por protagonistas que se comportam de forma bipolar, prometendo o paraíso nos jantares grátis do circo de campanha e promovendo, depois a desigualdade, a precariedade, a destruição dos serviços públicos, o desemprego, a pobreza, a exclusão.
Os cidadãos têm fortes motivos para se alhearem da participação política mas haverá, porventura, razões mais fortes para não se demitirem do exercício da sua cidadania plena. E as causas são, desde logo, a liberdade individual encarada enquanto realização colectiva do povo que somos. Liberdade que para a maioria dos portugueses está cerceada.
Temos liberdade para viajar mas quantos de nós não têm rendimento para sair para lá das fronteiras da sua própria ilha.
As prateleiras dos grandes espaços comerciais oferecem uma parafernália de produtos alimentares mas quantos de nós têm de recorrer ao banco alimentar ou ao Rendimento Social de Inserção para alimentar a família.
Temos direito à saúde mas quantos de nós não temos médico de família.
Temos direito à habitação mas quantos de nós não estamos eternamente endividados porque nos “empurraram” para a aquisição de casa própria.
Temos direito ao trabalho mas quantos de nós estamos desempregados.
Temos direito a uma renumeração justa mas quantos de nós vivem abaixo do limiar de pobreza.
Temos direito à protecção social mas são os pensionistas que engrossam os números da pobreza.
E tudo isto é fruto da política não é o infortúnio, nem o fado português, nem sequer é a crise que tudo tem desculpado.
Há outros rumos e outras políticas onde todos devem ser protagonistas na construção de um futuro diferente. Melhor!

sábado, 10 de outubro de 2009

Dia de reflexão (3)

Contemplar para ajudar à reflexão.


Aspecto de um dos muitos lagos que salpicam a floresta (Kiruna, Suécia, 2006)


Com a luz do sol da meia-noite (Kiruna, Suécia, 2006)

Dia de reflexão (2)

A teoria do choque aplicada ao "tamiflu" ou como se criam necessidades.
O vídeo vale a pena e também vale a pena abordar a obra de Naomi Klein sobre a doutrina do choque. O livro anda por aí com o título: "A Doutrina do Choque: a Ascensão do Capitalismo de Desastre"

Dia de reflexão (1)

E porque hoje é dia de reflexão fica aqui um texto de Brecht para os indecisos

O Analfabeto Político

O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe,
da farinha, da renda de casa, dos sapatos, dos remédios,
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e
enche o peito de ar dizendo que odeia a política.
Não sabe, o idiota,
que da sua ignorância política
nasce a prostituta, o menor abandonado,
e o pior de todos os bandidos
que é o político vigarista, aldrabão,
o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.

(Bertold Brecht)

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Tributo a Che Guevara

Passam hoje 42 anos sobre o assassinato de Ernesto Che Guevara.

Fica aqui o tributo do "momentos" ao Comandante Che Guevara.
A tua memória perdura.
Hasta Siempre Comandante!

Contributos solidários

O Manuel Freire e o Samuel Quedas (Cantigueiro) estiveram ontem no Teatro Faialense numa festa comício da CDU.
Bons e solidários amigos que nunca trocaram as ideias por um prato de lentilhas.
Bons e solidários amigos que fazem da palavra e da música uma arma.
Bem hajam!

Não disponho de outro registo vídeo. Fica esta interpretação de "A Lágrima de Preta", de Antonio Gedeão numa comemoração do 25 de Abril, em Santarém.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Omeletas em S. João dos Angolares

As eleições para as autarquias locais são, pela sua natureza, mais envolventes e mais participadas, desde logo, pelo número de candidatos envolvidos, mas também, pela aproximação aos problemas locais e aos interesses e anseios das comunidades rurais e urbanas. Excluo desta reflexão as grandes urbes pois, nesse caso as disputas confundem-se com a macro política. Em Lisboa e no Porto, ou mesmo em Ponta Delgada ou Angra do Heroísmo, está muito mais em causa do que os projectos autárquicos colocados a sufrágio popular.
Mas, se por um lado, as eleições autárquicas têm um cariz democrático inegável, são também as eleições para o poder local que tornam mais visível o uso e abuso dos poderes, o clientelismo e o caciquismo, que por vezes configura crime punível por lei. A coacção sobre os eleitores nalguns casos pode chegar à compra de votos.
Nas últimas eleições autárquicas chegou ao meu conhecimento que um candidato a uma freguesia pagava os votos mediante a apresentação de uma foto do boletim depois de assinalada a intenção de voto (registada com o telemóvel). É claro que quem me facultou a informação não se mostrou disponível para testemunhar publicamente este inovador método de comprar a liberdade dos cidadãos. Porque será?
Quando tive conhecimento desta estória, passada numa das nossas ilhas em 2005, veio-me à lembrança uma outra, também insular mas, mais antiga e mais a Sul.
Em Setembro de 2001 cheguei a S. Tomé e Príncipe um dia depois da tomada de posse do então eleito Presidente daquele país. Alguns dias depois na Roça de S. João encontrei-me ocasionalmente com um dos quadros políticos apoiante da candidatura presidencial que tinha saído derrotada. Depois dos primeiros momentos de conhecimento e já num ambiente descontraído, lá perguntei como é que o candidato apoiado pelo partido que detinha a maioria parlamentar e assumia o poder executivo tinha sido derrotado. A resposta foi simples e directa: A meio da última semana de campanha já não tínhamos dólares para dar às pessoas e aos outros nunca faltou dinheiro.
Dólares!? - Sim. Dólares. Compraram-se votos com dólares!? Sim. Claro que sim. Fiquei estupefacto. Bem! Estamos em África e num dos países mais pobres do Mundo. Pensei para comigo enquanto recuperava do choque. Foi o dinheiro, não o projecto político que decidiu aquela eleição assim não admira que este paraíso tropical esteja nos últimos lugares da tabela Mundial no que diz respeito à pobreza e ao desenvolvimento.
A conversa foi muito elucidativa e a estória é longa não cabe neste espaço, quem sabe talvez um dia sobre tempo e lugar para contar esta e outras estórias.
Na nossa democracia de país primeiro-mundista comprar votos com dinheiro não é uma prática comum. Logo não precisamos de observadores internacionais para validarem os nossos actos eleitorais. Mas… vá-se lá saber porquê, em tempo de eleições vem-me à lembrança aquela tarde em S. João dos Angolares à volta de uma salada de búzios do mar e duma omeleta de folhas de micocó (planta afrodisíaca) tudo regado com criolas (cerveja santomense) geladas e uma esclarecedora conversa sobre campanhas eleitorais.
Aníbal C. Pires, IN A UNIÃO, Angra do Heroísmo, 08 de Outubro de 2009

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Tributo a Amália

Passam dez anos sobre amorte de Amália Rodrigues.
"momentos" deixa aqui o seu tributo à MULHER.


E à FADISTA que tão bem soube interpretar a alma portuguesa.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Para os viajantes

Aqui ficam as boas vindas aos viajantes. Numa canção que traduz, nos sons e nas palavras, toda a alma da cidade luz.
La Bohème, de Charles Aznavour.

domingo, 4 de outubro de 2009

La Negra - Pequena homenagem

Morreu hoje, em Buenos Aires, Mercedes Sosa (La Negra).
Fica aqui uma singela homenagem e a certeza que Mercedes Sosa continua viva no coração do seu povo e dos povos oprimidos do Mundo.
Hasta Siempre!

sábado, 3 de outubro de 2009

Tóxicos presidenciais e outros

Algo vai mal lá para os lados de Belém e ao contrário da opinião generalizada dos habitantes deste país julgo que existem razões de preocupação, desde logo porque Cavaco Silva não é um cidadão qualquer, Cavaco Silva é o Presidente da República Portuguesa e isso confere-lhe um estatuto que o coloca acima das meras querelas político-partidárias em tempo de eleições ou, em qualquer outro tempo político. Do Presidente da República esperamos, a todo o tempo, uma actuação imparcial e de arbitragem institucional, no restrito cumprimento das suas competências constitucionais.
A toxidade introduzida na campanha eleitoral das legislativas pelo denominado caso da “escutas” à Presidência da República, o silêncio presidencial que durou até ao início da campanha para as autárquicas, os “timings” dos vetos e promulgações presidenciais são tudo menos rotinas de calendário ou ingenuidades de Cavaco Silva. Mas nem só a Presidência da República poluiu o espaço público nacional, outros protagonistas e outros poderes contaminaram a pré e a campanha eleitoral com “produtos tóxicos” que, não tendo todos o mesmo impacto e dimensão, tinham em comum o objectivo de afastar a atenção dos cidadãos. Os politólogos, analistas e comentadores foram alimentando e empolando o acessório, assim como uma espécie de especuladores bolsistas, deixando de fora da discussão e da análise as questões que verdadeiramente estavam à discussão.
Os resultados eleitorais aí estão a dar conta de quem nem tudo correu bem aos estrategas e assessores de marketing. O povo penalizou o que tinha de ser penalizado e derrotou o que tinha de ser derrotado demonstrando, aos mais cépticos, que a sabedoria dos eleitores vai muito para lá da erudição dos politólogos e respectivos sucedâneos que agora centram as suas análises na preocupação das condições de governabilidade face às maiorias aritméticas pondo de lado, uma vez mais, o essencial – a construção de plataformas de entendimento parlamentar com base em projectos políticos que correspondam à vontade expressa nas urnas pela maioria dos eleitores.
A governabilidade depende das opções políticas que vierem a ser traduzidas no programa do futuro governo. Programa que fruto dos resultados eleitorais não pode ser o decalque do programa eleitoral do PS. A maioria dos eleitores votou à esquerda mas é à direita que os apelos lineares da aritmética poderão ser mais fortes e simplificadores. As qualidades e opções políticas de José Sócrates, e deste PS, estão à prova agora que o diálogo tem de dar lugar à arrogância e a democracia pode funcionar em toda a sua plenitude se a vontade maioritária dos eleitores for respeitada. Se assim for a governabilidade está assegurada, se assim não for aprofunda-se o descrédito dos cidadãos e é a própria democracia que sai empobrecida.
O Presidente da República falou ao país. Se antes das palavras clarificadoras e elucidativas de Cavaco Silva o assunto configurava alguma gravidade e gerava muita expectativa agora, depois do cabal esclarecimento dos factos, a “coisa” eleva-se a nível de importância de assunto de Estado, embora a expectativa dos portugueses tenha baixado para um patamar que se pode situar entre o nada e a coisa nenhuma.
Como afirmei no primeiro parágrafo julgo existirem sérios motivos de apreensão na actuação presidencial e espero que do Palácio de Belém não continuem a emanar “produtos tóxicos” que contaminam a essência do sistema político, que é parlamentar, e prejudicam a democracia.
Ao Presidente da República cabe-lhe a arbitragem institucional e a defesa da Constituição. É dentro da fronteira constitucional que Cavaco Silva se deve ficar.
Aníbal C. Pires, Lisboa, IN A UNIÃO, 02 de Outubro de 2009, Angra do Heroísmo

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Conquista de todos os dias

Depois deste período de afastamento voluntário estou de regresso para continuar a partilhar opinião sobre o nosso quotidiano “glocal” e, mormente, perdoem se vos pareço pretensioso, a contribuir para a reflexão crítica do que nos envolve e conforma as nossas vidas, aliás à poucos dias aconteceu um desses momentos únicos em que a oportunidade esteve nas nossa mãos. As opções feitas individualmente no recato das assembleias de voto ditaram a conformação do nosso futuro próximo.
Os resultados eleitorais do passado determinaram, não sei bem o quê uma vez que estou a escrever quando faltam 3 dias para as eleições legislativas, não tenho dons premonitórios e, como tal, não arrisco qualquer vaticínio. Quanto ao que gostaria que se viesse a verificar não vale a pena sequer tecer quaisquer considerações pois julgo que os meus desejos eleitorais são do domínio público e esta foi, apenas, mais uma das muitas batalhas políticas que travei na luta incessante por uma sociedade mais justa e solidária.
A campanha eleitoral para as legislativas foi recheada de ruídos, estrategicamente introduzidos, para beneficiar eleitoralmente os partidos que desde o 1.º governo constitucional têm, alternadamente, governado o País e a Região. Os eleitores assistiram à discussão do acessório com claro prejuízo para a essência dos projectos políticos provocando, quiçá ardilosamente, o empobrecimento do debate político e o confronto de ideias. Ficam, todavia, os registos de promessas feitas e compromissos assumidos. Promessas e compromissos que os cidadãos têm obrigação de exigir que sejam rigorosa e escrupulosamente cumpridos. Exigência e vigilância que deve ser exercida desde já e ao longo do mandato que agora foi conferido aos novos deputados e ao governo que vier a ser empossado. A democracia pratica-se todos os dias. É assim como o treino dos atletas de alta competição, ou se treinam todos os dias com dedicação e empenhamento ou os resultados nunca serão bons, nem sequer aceitáveis.
A democracia portuguesa tem vindo a definhar por falta de exercício. Exercício dos direitos de cidadania e de participação política e, com essa demissão estamos a colocar em perigo a própria liberdade individual. Os sintomas do cerceamento e estiolamento da liberdade individual emergem sussurrados na precariedade que caracteriza as relações laborais ou, no avisado conselho de um colega que nos diz: olha que aqui trabalha um familiar de um assessor de fulano ou sicrano, por isso o melhor é estares quedo e mudo.A participação política e o exercício pleno da cidadania não podem reduzir-se ao acto de ir ou não ir votar. A participação política e o exercício pleno da cidadania tem de se tornar uma prática diária e entrar no nosso modo de vida. A democracia precisa de ser alimentada pela intervenção cívica e a liberdade é uma luta que se conquista todos os dias não é um bem perene.
Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, Ponta Delgada, 02 de Outubro de 2009

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Prenda para a Margarida

A melhor herança que posso transmitir aos meus filhos e netos é um legado imaterial.
Dos valores e os princípios com que pauto a minha vida.
De luta! E da esperança de que é possível… mudar o final.

Fica esta mensagem de Ana Carolina que sendo dirigida à sociedade brasileira é aplicável à humanidade.
Vamos mudar o final!

Um ano


Junto da neta (Margarida como a minha avó materna) que hoje completa o seu primeiro aniversário.