segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Postal de Natal

Este ano optei por não formular votos natalícios nem de desejos de prosperidade para o novo ciclo temporal que se inicia por estes dias. Não o fiz nesta coluna, nem noutras onde habitualmente partilho algumas cogitações com quem ainda lê e cultiva a reflexão crítica. Compartilhar… Este é o objectivo! Se o alcanço ou não só mesmo os leitores o poderão dizer. Alguns dizem que sim, outros que nem por isso, outros são liminarmente contra… o que quer que seja e, outros ainda, não dizem nada mas vão lendo. O que em si mesmo é bom não porque o texto nasceu aqui deste lado mas porque alguém se apropria dele, lendo-o e ajuizando como muito bem entender. E, é nesse momento que as palavras ganham importância. Por ora não têm importância, são apenas minhas… as palavras, Palavras sem nexo à procura mais, de uma lógica, que do formalismo linguístico que as ordena lhes dá sentido e rigor, isto tudo sem deixar, porém, de ter em vista uma ética social e política de intervenção para elas… as palavras.
A opção de não ter dedicado algumas palavras a esta quadra foi consciente. Este ciclo repetitivo de desejar por altura do Solstício de Inverno o que todos deveríamos ter, dada a nossa condição humana, já me enfastia um pouco.
Enfastiado! Foi assim que me senti com a mensagem de Natal do Presidente do Governo Regional. Bonitas e adequadas palavras de esperança num cenário de prosperidade e conforto. Mas foram só bonitas… as palavras adequadas à quadra de renovada esperança e de expressão de solidariedade com os desprovidos da sorte. Um bonito Postal de Natal este que o Presidente do Governo Regional ofereceu aos açorianos espalhados pelo Mundo e aos residentes nas ilhas de bruma.
Ao bonito Postal de Natal que Carlos César ofereceu aos açorianos faltou, a meu ver, o anúncio de que em 2009, e por aí em diante, as desigualdades sociais acabariam, que o rendimento das famílias cresceria e que o desenvolvimento harmónico voltaria a ser uma prioridade do seu governo.
Um Postal de Natal desenhado por um dos assessores presidenciais que pululam em Santana ao qual faltou a ética moral e política de intervenção, mas ao qual não faltou o formalismo estético e linguístico apropriado à quadra natalícia.
Aníbal Pires, In Açoriano Oriental, 29 de Dezembro de 2008, Ponta Delgada

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Está a chegar

Janeiro está à porta e com ele o “Magalhães” chega aos Açores. Já ouvi e li que chega com algum atraso. Mas será mesmo que a distribuição gratuita do famoso portátil está atrasada? Ou aquilo que se ouve e lê por aí não passa da velha conversa de português (ilhéu ou continental) que nunca está satisfeito e tem sempre uma criticazinha para fazer, mesmo perante uma medida que pretende universalizar o acesso às ferramentas informáticas e às novas tecnologias de informação e comunicação. O que só pode ser bom! Julgo eu. Tendo em devida conta tudo o que o Eng. José Sócrates já fez e disse sobre a importância do choque tecnológico e sabendo-se, por testes realizados por auditorias externas, que um dos atributos do “Magalhães”, é a resistência ao choque, isto sem ter sequer em conta que o portátil, com nome de navegador, está perfeitamente adaptado às condições de elevada humidade que caracteriza a Região pois, ao que parece para além de resistir muito bem ao choque o “Magalhães” é hidrofóbico. Devíamos estar todos satisfeitos mas… Enfim! Acho que isto já é má vontade ou não ter mais nada que fazer do que criticar tudo o que os governos do PS, na Região e na República, se propõem levar a cabo para nos tirarem do secular atraso a que estamos votados desde o fim da epopeia dos descobrimentos.
Boa vontade só mesmo os professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB). Para preparar a chegada do “Magalhães” haja tempo, boa vontade e uma boa dose paciência pois aquilo que espera os professores do 1.º CEB não é tarefa menor. Só o processo de pré-registo dos alunos, a ser feito pelo professor da turma, é composto de 11 acções que bem vistas as coisas deveriam ser feitas pelos vendedores do fabricante do “Magalhães” e pelos operadores móveis de comunicações. Fica por se saber qual o enquadramento que esta actividade dos professores do 1.º CEB tem no actual modelo de avaliação e qual o correspondente registo e notação na grelha ou, se aos docentes será atribuída uma comissão pecuniária pelas vendas realizadas.
As vantagens da introdução do “Magalhães” no 1.º CEB constituem, sem sombra de dúvidas, uma revolução no processo ensino e aprendizagem. Nada será como antes! Daqui até à dispensa dos professores e mesmo do espaço físico que hoje conhecemos como Escola vai um pequeno passo e o fim do pesadelo de Secretárias e Ministras da Educação.
Só tenho mesmo uma, ou melhor duas dúvidas sobre o sucesso e o processo de distribuição gratuita do famoso computador portátil de tecnologia portuguesa contra choques e infiltrações líquidas.
A primeira dúvida relaciona-se com o contrato de fornecimento celebrado com o fabricante e distribuidor. Não tendo havido concurso público quais são os prazos a que a empresa está obrigada para provir todos os aluno do 1.º CEB deste imprescindível instrumento do sucesso escolar!?
A segunda dúvida relaciona-se com a universalidade do acesso ao “Magalhães”. Não é por nada mas afinal o portátil não vai ser distribuído gratuitamente a todos os alunos. A “borla”, na Região, é apenas para os alunos que estão integrados nos escalões 1, 2 e 3 da Acção Social Escolar. Os alunos dos 4.º e 5.º escalões pagarão, respectivamente, 20 e 50 euros. Não tenho, por princípio, nada contra esta comparticipação das famílias mas não tenho a certeza (daí a dúvida) que assim se garanta que todos vão aceder a esta inovadora maravilha saída do prometido choque tecnológico. E depois, bem e depois tenho na lembrança o fracasso do programa regionalizado da e-Escola, o mau exemplo sénior, a pender sobre o programa e-Escolinha desenhado para os infantis.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Finalmente… o Estatuto

Após a confirmação, pela Assembleia da República, no passado dia 19 de Dezembro, do texto que consagra a 3.ª Revisão do Estatuto Político Administrativo da Região Autónoma dos Açores o Presidente da República irá, obrigatoriamente, promulgá-lo nos próximos dias. A Região ficará, finalmente, dotada das competências que a revisão constitucional de 2004 lhe conferiu. O que não significa que a saga à volta desta revisão estatutária tenha chegado ao fim pois não falta por lá, e por cá, quem esteja disposto a prolongar uma novela cujos argumentistas são conhecidos.
A intransigência do PS em manter no Estatuto duas normas (art. 114 e o ponto 2, do art.º 140) que ferem o texto constitucional e que, politicamente, nada acrescentam ao processo de aprofundamento da autonomia regional, ou seja, são questões meramente acessórias mas que serviram de mote ao Presidente da República para o veto político e que poderão prolongar no tempo e na agenda política um questão menor face ao essencial dos problemas que afectam a Região e o País.
À coerente intransigência do PS, respondeu o PSD com a incoerência de quem votou por duas vezes sim e agora responde com um “nim” de alinhamento com a posição política do Presidente da República. O CDS/PP e o BE tiveram, em todo este processo, uma coerência acrítica, aliás como é seu apanágio. Para estas duas forças políticas, funciona a lógica pragmática de que os fins justificam os meios. É tudo uma questão de ganhar ou perder influência eleitoral e protagonismo. O PPM tentou! É inegável que o líder regional diligenciou o apoio dos seus pares na AR mas… também aqui um outro tipo de pragmatismo se sobrepôs aos princípios da lealdade e da solidariedade.
O PCP foi crítico e coerente em todo o processo. Desde o primeiro momento se opôs ao conteúdo das normas da polémica e propôs a sua eliminação, por as considerar inconstitucionais. Desde sempre votou favoravelmente o texto estatutário na sua globalidade. O PCP confirmou a sua posição crítica e a sua coerência, no passado dia 19 de Setembro, e conferiu ao Estatuto uma legitimidade política qualificada que sem o seu apoio e voto nunca teria.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Celebrar o quê? Para quê?

A época natalícia e o limiar de um novo ciclo temporal ou, de outro ponto de vista, o fim de mais um ano, aconselham a escritas onde os votos: de prosperidade, de fé e esperança na família, na amizade, no amor ao próximo e à próxima, na solidariedade, na paz, na diminuição das emissões de gases com efeito estufa, na demissão do Governador do Banco de Portugal, ou mesmo na formulação de votos para que José Sócrates seja convidado para conselheiro do novo Presidente dos EUA e a D. Maria de Lurdes Rodrigues para ajudante de campo da Secretária de Estado que Barack Obama escolheu para disciplinar o Mundo.
Sei que me ficaria bem, que seria politicamente correcto, que só teria a ganhar se alinhasse mas não, este ano não! Não alinho… Desalinho.
Não que o Solstício de Inverno não mereça uma referência e merece! Merece uma honrosa menção pela renovação cíclica do tempo e da vida pois, tudo o resto é produto de consumo e, como em tempo de crise o gasto tem de ser limitado ao essencial vou deixar-me de luxuosas formulações de votos efémeros uma vida repetidos.
Não faz muito sentido celebrar a família num quadro político que de algum tempo a esta parte tende a destruí-la. Veja-se a liberalização das relações laborais com o Código de Trabalho e o seu agravamento na versão socrática. A celebração é a luta pela família e pela reposição dos direitos que lhe foram paulatinamente sonegados.
Não faz muito sentido celebrar o amor se não nos deixam tempo para amar. Com o novo Código Laboral o horário de trabalho pode chegar às 60 horas semanais. Quem é que tem tempo para cultivar a amizade!? Quem é que tem tempo para amar!? Sim, porque é preciso tempo para a amizade, porque é preciso tempo para amar. A celebração é a luta por um tempo nosso, por um novo tempo, um tempo que estruture a vida, o trabalho, a família, a amizade, o amor.
Não faz muito sentido celebrar a prosperidade num país com 18% da população a viver abaixo do limiar da pobreza. A celebração é a luta pela distribuição equitativa da riqueza e para que Portugal deixe de ser o país da União Europeia onde se verificam as maiores desigualdades sociais e económicas.
Não faz muito sentido celebrar a paz se nada fazemos para a construir e aceitamos acriticamente a escalada militarista dos Estados Unidos e da União Europeia. A celebração é luta pela construção da paz, pela desmilitarização, pelo cumprimento das Resoluções das Nações Unidas.
Não faz muito sentido celebrar a solidariedade se promovemos e cultivamos o individualismo e a competitividade exacerbada. A celebração é a luta contra a obsessão de tudo mensurar e tudo quantificar sem avaliar os impactes das medidas e das acções. A celebração é a luta pelo trabalho cooperativo, pelo dever social de partilhar o conhecimento
Não faz muito sentido celebrar quando o Mundo agoniza lentamente sob o espectro: da guerra, do aquecimento global, das pandemias, da pobreza…, da desumanidade. A celebração é a luta pela sobrevivência do planeta, pela sobrevivência da humanidade.
A esperança não foi abalada e, se possível direi que até sai reforçada. Um Mundo Melhor é Possível e então se for sem os Constâncios, as Marias de Lurdes Rodrigues e os Sócrates será, francamente melhor.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Futuro em tom cinzento

Temos assistido, nos últimos anos à crescente desvalorização dos rendimentos do trabalho, que conjugada com a alta da taxa de inflação e com os efeitos da crise financeira internacional deixam as famílias e as pequenas e médias empresas à beira de uma crise de nervos.
À crise internacional, reconhecidamente, a Região não ficou imune e os seus efeitos há muito se sentem, quer na diminuição do rendimento disponível das famílias, quer nas imensas dificuldades porque passam os pequenos e médios empresários. E esta realidade, ou seja, os efeitos que a crise financeira internacional e da sua extensão à actividade económica produzem na Região Autónoma dos Açores são reais. E há muito que vínhamos a afirmá-lo com a propriedade de quem procura intervir no pano político com conhecimento da realidade sentida e vivida pelos trabalhadores, pelas famílias, pelos pequenos e médios empresário e, não apenas porque a RTP Açores o tivesse mencionado por 32 vezes no mesmo serviço noticioso, nem mesmo pelo facto do Senhor Presidente do Governo Regional finalmente o ter admitido.
É hoje claro para todos que a crescente desvalorização dos rendimentos do trabalho, em ligação com os efeitos da crise financeira e uma elevada taxa de inflação regional nos mantêm, apesar do crescimento do PIB regional, como uma das regiões do país e da União Europeia onde as desigualdades na distribuição da riqueza são mais profundas, ou seja, continuamos hoje, como em 1996, a ser uma das regiões mais pobres e desiguais da formação social, económica e política (Portugal e a União Europeia) onde nos inserimos.
E, quanto a esta questão, tal como a outras, o X Governo Regional no seu Programa diz um incontável número de vezes que vai conseguir, continuar e aprofundar as mesmas receitas que tem aplicado até agora.
Bem! Não tenho dúvidas que as ilhas açorianas são ilhas de futuro mas, um futuro bem menos cor-de-rosa que aquele que o X Governo Regional prometeu e promete às açorianas e aos açorianos.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Enxovalhos

Para a opinião pública, muito pela opinião publicada, passou a ideia de que a “palhaçada” que alguns dos ortodoxos e iluminados deputados do PS montaram à margem, dos seus próprios pares partidários, de aprovar o Programa do X Governo Regional sem o colocar à votação da ALRAA, acabou com uma negociata com os partidos da oposição que ao fim da manhã de sexta-feira não se indignaram, não fizeram declarações de voto como “seria de esperar”, olvidando os protestos e a indignação que foi manifestada pela oposição na tarde de quinta-feira quando a surpresa e a estupefacção invadiram o hemiciclo da ALRAA com a decisão anunciada por Francisco Coelho.
O enxovalho a que o PS se sujeitou foi suficientemente penalizador não precisava das vergastadas da oposição.
Mas qual foi então a suposta negociata!? A intenção de agendamento, com pedido de urgência e dispensa de exame em Comissão, da proposta do PS de revisão da orgânica da ALRAA, foi retirada.
Isto quer dizer o quê?
Que o PS deixou cair a proposta de revisão da orgânica? Não.
Que o PS está disponível para encontrar outras soluções, no seio da ALRAA, de contenção da despesa sem estrangular a alma do trabalho parlamentar? Não.
O resultado prático da suposta negociata é apenas o adiamento da revisão da orgânica. Não foi em Dezembro será em Janeiro.
A intransigência do PS só mudou de data.

Novo programa velhas políticas

O Programa do X Governo Regional configura a continuação de um modelo de desenvolvimento que o tempo tem mostrado ser errado e que tem vindo a agravar, ao invés de resolver, os problemas dos cidadãos e a aprofundar as assimetrias regionais.
Um modelo errado porque, face a uma crise de que ninguém consegue prever as dimensões e as consequências, opta por tentar fazer crescer as receitas da Região desbaratando o património regional, através de privatizações do sector empresarial da Região, sacrificando alavancas fundamentais para o desenvolvimento, em troca de duvidosos equilíbrios orçamentais de curto prazo.
É um modelo errado porque procura manter a competitividade das empresas da Região através da manutenção de baixos salários, facto que é provado, não só, pelas assimetrias salariais entre os trabalhadores açorianos e continentais, mas também, entre os trabalhadores açorianos conforme as ilhas onde vivem e trabalham, como também pela crescente proximidade entre o salário médio e o salário mínimo regional. Ou seja, nos últimos anos, ainda antes da famigerada crise, iniciou-se um ciclo de desvalorização do trabalho a que este Programa dá uma indisfarçada continuidade. Tendo em consideração que a produtividade dos trabalhadores tem vindo a registar acréscimos e que a riqueza bruta tem crescido, mostra-se essencial que os rendimentos dos trabalhadores sejam objecto de uma significativa valorização. Sem o aumento do poder aquisitivo dos trabalhadores e das suas famílias não haverá desenvolvimento económico sustentado.
O Programa do quarto Governo de Carlos César sustenta-se num modelo errado porque não dá o firme e necessário combate à precariedade laboral no nosso arquipélago e, através da extensão do período dos estágios do programa “Estagiar L”, contribui para a eternização da situação de precariedade, com graves prejuízos para os jovens e as suas famílias
É um modelo errado porque desvaloriza os sectores produtivos, não procurando defender os interesses dos produtores, nomeadamente os da fileira do leite, que vêem o PS – que prometia no seu programa eleitoral defender as quotas leiteiras – baixar os braços e aceitar o fim do sistema de quotas, acenando-lhes com um vago “programa de apoio à transição”. Mas também o sector das pescas é desvalorizado e lançado na incerteza com as alterações que se perspectivam na Subsecretaria das Pescas e a preocupação fundamentalista da componente ambiental em detrimento de uma economia do Mar equilibrada e sustentada onde os equilíbrios ambientais e a actividade piscatória se podem complementar, aliás como sempre aconteceu ao longo dos tempos. A gestão de proximidade pelas populações ribeirinhas, que nos foi subtraída com a perda de soberania das 200 milhas, foi sempre o melhor garante de sustentabilidade do sector e do equilíbrio dos ecossistemas dos nossos mares.
É um modelo errado porque atrás da miragem de turistas com “propensão marginal interessante para gastar dinheiro em tempo de férias”, expressão que o Governo não esclareceu, apesar da insistência para que o fizesse, mas ao que suponho aquilo que o governo pretende são turistas de mãos largas e bolsos recheados – que a actual crise económica tornará certamente raros.
O PS de Carlos César continua a afastar-se de um modelo económico regional sustentável e diversificado que deveria ancorar-se no que nos pode, efectivamente, garantir a procura e o aumento de visitantes, ou seja, aquilo que nos torna diferentes de um qualquer outro destino turístico – o nosso património cultural, paisagístico e ambiental. Na mesma medida em que nos vamos tornando num “não lugar” irá diminuir, na mesma proporção, a procura do destino Açores tenham ou não os nossos visitantes tendências marginais interessantes.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Programa e programinhas

O novo Governo Regional apresentou, no passado dia 3 de Dezembro, o programa de Governo para o próximo quadriénio. Esta semana a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA) vai proceder à sua apreciação, discussão e aprovação. Apreciação! Com certeza. Aprovação! Sem dúvida. Discussão! Assim, assim que o tempo é pouco e o programa é do Governo e da maioria absoluta que o aprovará. Não é, como se sabe, das oposições. Resta a apreciação de um documento orientador do modelo de desenvolvimento para os Açores proposto pelo velho PS de Carlos César, que já foi Programa Eleitoral, em primeira versão, agora Programa de Governo, em versão final, mas nem por isso mais rica do que a versão que foi escrutinada pelos eleitores.
O Programa de Governo, para além de estar empobrecido face ao Programa Eleitoral do PS Açores, não consegui vislumbrar a anunciada ligação das ilhas ocidentais ao cabo de fibra óptica nem, tão pouco, a cobertura regional de Centros de Dia e Noite para Idosos, o Programa do X Governo Regional, como dizia, é uma declaração de intenções na continuidade do modelo de desenvolvimento que acentuou desigualdades sociais e económicas entre os cidadãos, que acentuou assimetrias regionais, que continua a desvalorizar o sector produtivo e, sobretudo, dá continuidade ao, já longo ciclo, de desvalorização do trabalho e de concentração da riqueza.
Mas não quero parecer derrotista e muito menos ser acusado de não ter encontrado nada interessante e digno de referência no programa e na listagem de programinhas do X Governo Regional, assim, transcrevo do Programa aquilo que é uma novidade estratégica para o sector de actividade que, desde 2000, é a “menina dos olhos” dos governos de César e que poderá dar o alento que faltava ao sector do Turismo na Região.
“(…) A promoção do destino Açores deverá incidir, especialmente, em destinos emissores ricos, populosos, com boas ligações aéreas directas para os Açores, cujos habitantes tenham o hábito de viajar fora da chamada época alta e várias vezes ao ano, que tenham uma propensão marginal interessante para gastar dinheiro em tempo de férias, e que (…)”. Não restem dúvidas com a captação de turistas com este perfil “estamos safos”, tudo o resto passará a ser acessório… A minha alma espanta-se com tamanha visão de futuro!
Aníbal Pires, In Açoriano Oriental, 08 de Dezembro de 2008, Ponta Delgada

sábado, 6 de dezembro de 2008

Contradições

Os actos contrariam as palavras e os tiques autoritários do PS Açores são expressos das mais variadas formas.
Contradizendo o conteúdo do discurso de Carlos César, na tomada de posse do X Governo Regional, quando este se referiu ao novo quadro parlamentar e ao acréscimo de dinamismo que a pluralidade trará para o aprofundamento do debate político, eis que o líder da bancada da do PS Açores, no dia seguinte às palavras de César, veio a terreiro apresentar uma proposta que fere a essência da democracia parlamentar.
A proposta apresentada visa a alteração da orgânica da Assembleia no que concerne à subvenção para a actividade parlamentar e ao pessoal de apoio técnico e administrativo dos grupos e representações parlamentares, diminuindo-os substancialmente.
O Grupo Parlamentar do PS sustenta a sua proposta na necessidade da contenção da despesa pública afecta ao Parlamento Regional, princípio com o qual estou de acordo embora, esta aparente boa fé do PS Açores seja, em minha opinião, redutora e completamente extemporânea.
Redutora porque a redução da despesa incide apenas e só sobre o apoio ao trabalho parlamentar, afinal a essência daquele órgão, extemporânea porque o aumento da despesa decorreu da alteração à Lei Eleitoral e a actual orgânica do Parlamento regional foi aprovada posteriormente à Lei Eleitoral.
Pode, assim, inferir-se que o PS Açores não esperava nem desejava estes resultados eleitorais, nem a actual composição da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), aliás a fragilidade do argumento do PS Açores é evidenciada pelo facto de, no início de 2008, o anterior Parlamento Regional ter aprovado um aumento de 300,00€ mensais nas despesas de representação dos deputados.
A proposta, da maioria parlamentar, de alteração das condições de funcionamento do exercício da actividade parlamentar constitui um golpe que empobrece a vida democrática e menoriza o Parlamento Regional. Esta proposta só pode ser explicada pela manifesta incomodidade que o PS Açores revela face à pluralidade da actual Assembleia e pela tentativa de impor limitações normativas àquilo que foi a vontade democrática manifestada pelo povo açoriano.
A argumentação da proposta do PS é demagógica e está eivada de um cinismo autoritário pois foi o PS, na República, que impôs o regime de subvenções milionárias, hoje em vigor na Lei de Financiamento dos Partidos Políticos.
A contenção da despesa da ALRAA pode e deve ser equacionada pois, como em qualquer organização, haverá, por certo, algumas despesas que podem ser suprimidas, como por exemplo as despesas de representação dos deputados, sem que seja afectada a principal actividade, no caso vertente, a acção e a iniciativa parlamentar de todos os partidos com assento na ALRAA.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

A globalização da desgraça

Com a impossibilidade de esconder por mais tempo a falência do capitalismo neoliberal, também conhecido por economia de mercado, para não ferir susceptibilidades, eis aí a crise financeira em todo o seu selvagem esplendor. Feroz sim mas, para ser rigoroso, é necessário dizer que à crise ainda falta parte do aparato, quer nos efeitos, quer na extensão. Digamos que, com as medidas anunciadas, os tempos que se avizinham não vão ser fáceis para os mesmos de sempre. Enquanto dura, a crise, há que aproveitar o choque provocado nos “mercados”, mais que o baque provocado nos cidadãos, ainda hoje em choque pela situação a que isto chegou, para reinventar o capitalismo e difundir as balelas do costume para que nada mude a não ser a linguagem e, continuem a ser os mesmos a acarretar com os efeitos da crise que, sendo financeira, começa já a produzir efeitos na economia produtiva.
Não deixa de ser interessante, embora dramático, ver como os analistas e os decisores abandonaram a tese do défice e do controlo da inflação que justificaram sacrifícios para os trabalhadores, para as populações e para os pequenos e médios empresários, quer pela via da sobrecarga fiscal, quer pelo aumento do preço do dinheiro (juros), quer ainda por uma política salarial e laboral de desvalorização do trabalho. Enquanto isto a actividade bancária e as seguradoras apresentavam, no auge da crise, chorudos lucros, que engordavam de trimestre para trimestre, e a concentração da riqueza a acentuar-se a um ritmo sem precedentes de onde, naturalmente, resultou o aumento das desigualdades sociais e económicas. O sucesso de alguns é a desgraça de muitos.
As virtualidades da globalização estão à vista! A desgraça foi, em definitivo, globalizada. Já não precisamos de olhar para o Sul do subdesenvolvimento e fazer campanhas de angariação de géneros e ficar de consciência tranquila. Ao Norte desenvolvido e civilizado não faltam cidadãos para alimentar, para cuidar. Em Portugal mais de 15% da população vive abaixo do limiar da pobreza, nos Estados Unidos os pobres já são 35 milhões, 12% da população e, 60% destes cidadãos estão em permanente situação de insegurança alimentar, ou melhor, passam fome. Os banqueiros continuam a engordar e desta vez vieram comer a mão do Estado. Estado que, segundo os ideólogos neoliberais, devia reduzir-se à sua insignificância, face à magnitude e pujança da auto-regulação social e económica da economia de mercado.
Aníbal Pires, IN Açoriano Oriental, 01 de Dezembro de 2008, Ponta Delgada