quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Insuficiência nas políticas de emprego jovem

Imagem retirada da Internet
O (des)emprego jovem é uma preocupação comum no discurso político. Recentemente uma deputada portuguesa eleita para o Parlamento Europeu (PE), na candidatura do PSD, levou a questão a plenário, em Estrasburgo, e apresentou a sua visão, quer do problema, constatando-o, quer apresentando o seu contributo para uma eventual solução. A intervenção da deputada do PE foi proferida no âmbito do debate sobre a “Execução da Iniciativa para o Emprego dos Jovens nos Estados-Membros”.
Não tinha grande expetativa sobre a este contributo pois a família política a que a deputada pertence é, não só uma das responsáveis pelas políticas que estão na origem do elevado desemprego, mas também pela sua manutenção. Sem grande expetativa, mas ainda assim fui à procura da intervenção, não fosse haver alguma novidade no discurso do Partido Popular Europeu (PPE). Mas não, nada de novidades apenas a repetição de um conjunto de princípios, com os quais até posso concordar, contudo insuficientes para resolver uma questão que se está a transformar num drama para milhões de jovens no espaço europeu.
Formação, estágios e oferta de emprego. Estamos de acordo senhora deputada e, também subscrevo que a principal finalidade da utilização indevida dos estágios se destina a mascarar os números do desemprego, assim como considero que neste “tripé” existe um profundo desequilíbrio. Existe formação, existem variadíssimos programas de estágio e de mobilidade para os jovens, mas a oferta de emprego não acompanha procura. Pois é senhora deputada, mas também não é com mais e diferenciada formação, embora os modelos de formação necessitem de reformulação, que a oferta de emprego vai aumentar, nem a precariedade vai diminuir.
Imagem retirada da Internet
O aumento da oferta de emprego para os jovens e a diminuição da precariedade não dependem apenas das constatações que faz. Para atingir esses objetivos, que até comungo consigo, não podemos continuar na senda da desregulação do mercado de trabalho, nem alimentar a ideia de aumentar os horários de trabalho e a idade para a aposentação. Tem de ser exatamente ao contrário. A precariedade combate-se com regulação do mercado de trabalho, garantindo apenas e tão só o que está consagrado na carta dos Direitos Humanos, e a oferta de emprego com o aumento da produção, mas sobretudo com a diminuição do horário semanal de trabalho e com a diminuição da idade para a reforma. Sendo que as últimas duas variáveis estão já ser implementadas nos países do norte da Europa.
A evolução científica e tecnológica permitiu e vai continuar a permitir, na generalidade das atividades económicas, a redução do número de trabalhadores. Era expetável e desejável que os avanços científicos e tecnológicos produzissem esse efeito, bem assim como essas transformações tivessem repercussões na redução dos horários de trabalho e na idade limite para a aposentação, o que não veio a acontecer. Ou melhor, desta mudança de paradigma apenas beneficiou o capital reduzindo a variável custo do trabalho. Para os trabalhadores não sobrou nada, bem pelo contrário em simultâneo foram introduzidas alterações que levaram à desregulação do mercado de trabalho, ao aumento do número de horas de trabalho semanal e da idade da reforma e, por conseguinte, as ofertas de emprego volatizaram-se, quer se trate de trabalho indiferenciado, quer se trate de trabalho qualificado.
Estamos a deixar para trás um ciclo prolongado de retração económica e o clima no espaço europeu é favorável ao crescimento, naturalmente a oferta de emprego terá tendência a subir, mas enquanto não se encarar como parte da solução para o problema do desemprego a divisão equitativa, entre o capital e o trabalho, dos ganhos resultantes da evolução científica e tecnológica o problema vai subsistir e não há iniciativa para o emprego jovem que nos valha.
Ponta Delgada, 29 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 31 de Janeiro de 2018

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

... da oferta e da procura

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires











Fragmento de texto a publicar na imprensa regional e no momentos. Aqui mesmo como é habitual.














(...) Formação, estágios e oferta de emprego. Estamos de acordo senhora deputada e, também subscrevo que a principal finalidade da utilização indevida dos estágios se destina a mascarar os números do desemprego, assim como considero que neste “tripé” existe um profundo desequilíbrio. Existe formação, existem variadíssimos programas de estágio e de mobilidade para os jovens, mas a oferta de emprego não acompanha procura. Pois é senhora deputada, mas também não é com mais e diferenciada formação, embora os modelos de formação necessitem de reformulação, que a oferta de emprego vai aumentar, nem a precariedade vai diminuir.
O aumento da oferta de emprego para os jovens e a diminuição da precariedade não dependem apenas das constatações que faz. Para atingir esses objetivos, que até comungo consigo, não podemos continuar na senda da desregulação do mercado de trabalho, nem alimentar a ideia de aumentar os horários de trabalho e a idade para a aposentação. (...)

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Transferir competências para as autonomias

Foto by Aníbal C. Pires
Passados que estão mais de 2 anos sobre a entrada em vigor do atual modelo de Obrigações de Serviço Público (OSP) e da liberalização das rotas de ligação entre o continente e as ilhas de S. Miguel e Terceira, com as vantagens e desvantagens que daí decorreram, importa perceber como variou o valor pago pelo Estado, uma vez que era esperado, assim nos foi dito, que o mercado se encarregaria de contribuir para a diminuição desses custos. Tal não veio, contudo, a verificar-se, não porque o custo final para os passageiros tivesse aumentado, mas porque o modelo prevê alguns mecanismos que são um sugadouro de dinheiros públicos pagos pela República, aliás a quem compete assegurar o pagamento do subsídio social de mobilidade.
O assunto discute-se na opinião pública regional e é objeto de alguma preocupação nos meios políticos regionais pois, no âmbito da audição numa Comissão Parlamentar, o ministro das Infraestruturas e do Planeamento defendeu que o subsídio social de mobilidade deve ser, no futuro, definido no âmbito das autonomias e competências regionais dos Açores e da Madeira garantindo, no entanto, a manutenção do financiamento estadual.
Mas não se ficou por aqui, o ministro Pedro Marques foi adiantando que o valor pago pelo Estado quase tinha triplicado, e que os cidadãos pagam o mesmo ou mais do que pagavam antes das alterações que vigoram desde 2015. Não será bem assim no caso dos Açores, digo eu, mas não é o pouco rigor das afirmações do ministro que me preocupa e nos deve preocupar.
Das palavras do ministro pode deduzir-se que a disponibilidade do Estado, para suportar os elevados custos deste modelo, está a chegar ao fim, daí ter proposto para que em em sede de revisão do atual paradigma essa competência fosse transferida para as Regiões Autónomas, sempre em nome do aprofundamento das autonomias regionais. Fica bem e, neste caso, é muito conveniente.
A necessidade de rever o modelo é uma evidência e por cá sempre se levantaram algumas vozes contra, coro que tem vindo a engrossar seja pela burocracia dos procedimentos para reaver o valor pago para além dos 134 euros, seja pelos encaminhamentos gratuitos de quem nos visita que retiram lugares aos residentes pagantes, seja pelo anacronismo de um modelo que permite a quem viaja do exterior visitar, sem mais custos, outra ilha e os residentes continuarem a pagar valores exorbitantes para viajar entre ilhas. Ou ainda, por não ter sido instituído um teto máximo às tarifas, para residentes, nas rotas liberalizadas aceitando, assim, uma imposição das companhias aéreas de baixo custo.
O atual modelo de transportes aéreos demonstra, também e de forma clara, a necessidade de encontrar soluções para diminuir o custo do transporte aéreo interilhas pois, é completamente anacrónico que o valor pago por um residente nos Açores para viajar entre duas ilhas da Região seja superior ao que, o mesmo residente, paga para se deslocar para Lisboa ou para o Porto.
Ponta Delgada, 28 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 29 de Janeiro de 2018

domingo, 28 de janeiro de 2018

... da importância das palavras

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires





Excerto de texto a publicar na imprensa regional e no blogue momentos






(...) Mas não se ficou por aqui, o ministro Pedro Marques foi adiantando que o valor pago pelo Estado quase tinha triplicado, e que os cidadãos pagam o mesmo ou mais do que pagavam antes das alterações que vigoram desde 2015. Não será bem assim no caso dos Açores, digo eu, mas não é o pouco rigor das afirmações do ministro que me preocupa e nos deve preocupar. 
Das palavras do ministro pode deduzir-se que a disponibilidade do Estado, para suportar os elevados custos deste modelo, está a chegar ao fim, daí ter proposto para que em em sede de revisão do atual paradigma essa competência fosse transferida para as Regiões Autónomas, sempre em nome do aprofundamento das autonomias regionais. Fica bem e, neste caso, é muito conveniente. (...)

sábado, 27 de janeiro de 2018

É este o tempo de dizer, Basta - crónicas radiofónicas

Foto by Aníbal C. Pires (2017)





Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM

Hoje fica o texto da crónica emitida a 18 de Novembro de 2017 que pode ser ouvida aqui










É este o tempo de dizer, Basta

Nestes breves minutos que hoje partilho consigo é incontornável não me referir aos motivos que estão na origem da greve geral dos educadores e professores. Greve que não tendo tido grande expressão nos Açores, constituiu uma demonstração nacional de que chegou a altura em que os docentes estão a dizer basta. Basta de os continuarem a maltratar e a exigir o que eles não podem dar.
Partilho esta questão consigo, desde logo, porque sou professor, mas também porque fui aluno e encarregado de educação. Mas faço-o, sobretudo, porque sou um cidadão que não abdica de ter opinião sobre as condições de trabalho dos educadores e professores, as suas carreiras e os efeitos perversos que a desvalorização, material e imaterial, da profissão docente tem na qualidade do ensino na Escola pública.
A relação não é direta, mas ninguém espere que um grupo de profissionais, que desde de 2009 não tem uma atualização salarial e, que desde de 2011 tem congelado o tempo de serviço e a progressão nas carreiras, esteja motivado para o desempenho da sua profissão. Isto para além das alterações ao regime de aposentação, à funcionalização da docência, à sobrecarga horária, às alterações ao modelo de formação contínua, ao desinvestimento na Escola pública.
São estes cidadãos, os educadores e professores, que acolhem diariamente os nossos filhos e que se desdobram em estratégias para superar as ausências, desde logo, a ausência da maioria das famílias no acompanhamento do percurso escolar dos filhos ou educandos. Famílias que se demitiram do seu papel na educação dos filhos e exigem à Escola que as substitua, sabendo-se que a família não é, de todo, prescindível no processo de desenvolvimento e estruturação psicológico das crianças e jovens.
São estes cidadãos, os educadores e professores, que diariamente superam os efeitos do desinvestimento na Educação e criam as condições para poderem exercer a sua profissão. Não é fácil, nada fácil.
E já reparou que quando deixa os seus filhos na Escola encontra lá educadores e professores que mais parecem os avós dos seus filhos. Mas não são os avós dos seus filhos, note bem, embora já tenham netos, idade e tempo de serviço para estarem aposentados. E estariam reformados não tivesse sido a quebra, pelo Estado, das regras da aposentação que prejudicaram todos os docentes, mas que penalizam em particular os educadores e os professores do 1.º Ciclo do Ensino Básico que não usufruindo das reduções de horário letivo se aposentam com a mesma idade.
O envelhecimento dos educadores e professores constitui uma questão que não é despiciente. Está a dizer-me que nunca tinha pensado nisso, mas é bom que pense pois trata-se de quem procura, com um grande esforço, ensinar os seus filhos que nem sempre estão disponíveis e recetivos para ouvir um sexagenário professor.
Os educadores e professores lutam pela sua dignidade profissional. Mas esta é, também, uma luta de todos os que acreditam na Escola como pilar estruturante da sociedade, uma luta de todos quantos depositam confiança nos educadores e professores quando, pela manhã, deixam os seus filhos e educandos na Escola.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 18 de Novembro de 2017

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

A CT da Azores Airlines veio a terreiro

Foto by Aníbal C. Pires (Outubro, 2016)
Finalmente a voz da Comissão de Trabalhadores da SATA Internacional/Azores Airlines (CTSIAA) fez-se ouvir através de uma carta aberta dirigida à Secretária Regional dos Transportes. Diz o nosso povo que “tarde é o que nunca chega”, mas neste caso parece-me a CTSIAA já não chega a lado nenhum, aliás a posição tornada pública está eivada de lugares comuns ditas em modo de vagas preocupações e, no que concerne à privatização, Pois que seja. Dizem os dirigentes da CTSIAA.
Segundo a CTSIAA esta carta aberta destina-se e passo a citar, (…) requerer a maior prudência e transparência na abertura de capital a privados, assegurando-se os superiores interesses da companhia, do povo açoriano e dos trabalhadores da SIAA. (…)
Dispenso-me de comentar.
Também eu estou preocupado, e não é de agora. As minhas preocupações vêm de longe e quanto à privatização, a minha opinião é, Não. E não é por nenhuma razão de ordem dogmática. Ao longo dos últimos anos tive oportunidade não só de afirmar a minha posição quanto a uma eventual privatização, mas também de a justificar.
Que a empresa tem dificuldades de tesouraria, que necessita de ser capitalizada, que necessita sobretudo de uma estratégia comercial que não balance ao sabor das conveniências e de interesses espúrios, tudo isso é do domínio público.
Que podia ter sido evitado, Podia. Que existem outras soluções para além da abertura ao capital privado, Existem. Existem e não foram sequer tentadas.
Lamentável.

Para quem estiver interessado pode encontrar Aqui um conjunto de textos que fui escrevendo nos últimos anos sobre a SATA.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 25 de Janeiro de 2018

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

À margem

Foto by Anibal C. Pires (2017)
Hoje é um daqueles dias cinzentos em que o melhor local para estar é no aconchego do meu recanto. Ler, ouvir música, talvez um filme. Tudo isto antes ou depois de cumprir o meu horário de trabalho e de um passeio à beira mar, nem sempre, ou necessariamente por esta ordem.
Gostava que fosse sempre assim, mas nem sempre acontece, quer nos dias cinzentos, quer nos dias que se enchem de luz e os verdes e azuis predominam. Nem sempre assim acontece por solicitações de origem diversa às quais procuro responder, tantas e tantas vezes com prejuízo do meu tempo e dos meus pequenos prazeres. Não me estou a queixar do uso que fazem do meu tempo, embora necessite dele para mim, disponibilizo-o de boa vontade sem ficar preso a qualquer sentimento de perda.
Para ter tempo para dar libertei-me de alguns passatempos que me ocupavam tempo e eram uma inutilidade, para além de me indisporem. Refiro-me concretamente ao consumo de conteúdos televisivos em tempo real. Não vejo televisão e gosto de passear pelos dias cinzentos. É estranho, pois que seja. Estas minhas opções não me tornam um marginal, quando muito pertenço a uma minoria que se está a antecipar ao fim anunciado do consumo de televisão, tal como o conhecemos hoje. Quanto ao meu gosto de passear pelos dias cinzentos, não tenho explicação, Gosto e pronto.
Se por vezes me sinto à margem, sem dúvida. Não tanto quando passeio pelos dias cinzentos, mas porque nem sempre tenho opinião sobre o que, em determinado momento, domina a discussão pública.
Foto by Madalena Pires
Conheces aquele programa de televisão a Supernanny, Não, nunca vi, nem faço tenção de ver. Mas sei que a audiência aumentou e as instituições que têm a seu cargo a defesa dos superiores interesses das crianças, bem assim como outras organizações da chamada sociedade civil estão a tratar de repor, julgo eu, a legalidade, acabando com o programa. Se não me questiono, Claro que sim. Estranho mesmo é como aquele conteúdo televisivo, e muitos outros, tenha audiência que justifique a sua emissão, mas isso é uma outra discussão para ter num dia em que o cinzento se ausente, não do dia, mas das mentes que consomem, ia dizer sem critério, mas não seria muito rigoroso porque existe um critério subjacente à visualização de um, ao invés de outro programa televisivo, pois a oferta tem um espetro temático alargado.
Não me considero um marginal procuro apenas cultivar a minha liberdade individual. Sinto-me melhor quando, nos dias cinzentos, descortino a luz que atravessa os filtros do nevoeiro informacional e se reflete de azul naquele pedaço de mar, ou cintila em gradientes de verde num pedaço da paisagem. É tão mais aliciante passear pelos dias cinzentos e encontrar o nosso próprio caminho por entre as neblinas que aos poucos se dissipam e deixam que observe a policromia luxuriante da vida.
Os dias cinzentos convidam-me a sair e procurar por perto o que não descortino à distância e isso faz-me bem ao corpo e à alma. É um prazer sempre renovado de descoberta e aprendizagem.

Ponta Delgada, 22 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 24 de Janeiro de 2018

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

... antecipar

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 1993) - arquivo pessoal








Excerto de texto a publicar na imprensa regional e no blogue momentos















(...) Para ter tempo para dar libertei-me de alguns passatempos que me ocupavam tempo e eram uma inutilidade, para além de me indisporem. Refiro-me concretamente ao consumo de conteúdos televisivos em tempo real. Não vejo televisão e gosto de passear pelos dias cinzentos. É estranho, pois que seja. Estas minhas opções não me tornam um marginal, quando muito pertenço a uma minoria que se está a antecipar ao fim anunciado do consumo de televisão, tal como o conhecemos hoje. Quanto ao meu gosto de passear pelos dias cinzentos, não tenho explicação, Gosto e pronto. (...)

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Ainda e sempre o tempo

Foto by Madalena Pires
Não pretendo dizer-lhe como deve usar o seu tempo. Faça o que muito bem entender com ele, utilize o seu tempo como muito bem lhe aprouver, mesmo que a sua opção seja deixar passar o tempo. Mas se nada tenho a ver com o que faz do seu tempo, preocupo-me com meu.
Somos moldados pelo tempo que vivemos e pela forma como o preenchemos. O tempo da nossa existência é finito, É precioso. O tempo, por ser finito, é o bem mais valioso de que dispomos e desperdiçá-lo é um luxo. Luxo a que não me quero dar, nem a este nem a outros luxos passíveis de comercialização.
Sendo o bem mais precioso o tempo não é objeto de compra e venda e, o seu valor não é cotado em bolsa. Se o tempo fosse transacionável a cimeira Davos, do Fórum Económico Mundial, teria já encontrado um qualquer expediente para nos extorquir tempo, como nos têm subtraído dignidade.
Não quero que o tempo passe por mim sem dele tirar partido, quero aproveitar cada instante e vivê-lo intensamente, ainda que não seja o único senhor do meu tempo procuro viver a parte que me cabe escolhendo o que fazer com o meu tempo. Trata-se, está bom de ver, de opções. Escolhas pessoais e intransmissíveis que determinam os caminhos que trilhamos ao longo da nossa existência. Bem sei que existem algumas variáveis que não podemos controlar, mas também sei que uma parte substancial da nossa vida resulta diretamente das nossas escolhas.
Disse logo no primeiro parágrafo que não quero saber como utiliza o seu tempo, nem tenho que o fazer, mas não deixo de me preocupar com o desperdício do tempo com alguns passatempos. Passatempos que não são tão inócuos como podem parecer, e nos querem fazer querer. Alguns passatempos tiram-nos tempo e oportunidades, tempo e oportunidades irrepetíveis.
Inquieto-me com o desperdício de tempo e procuro evitá-lo como faço com outros bens que, não sendo tão preciosos, têm valor um valor material ou imaterial. Esta inquietação resulta, em grande parte, do exercício da minha profissão. Os professores são observadores privilegiados da utilização do tempo e do seu desperdício, desde logo do seu próprio tempo. Mas é a utilidade que os jovens dão ao seu tempo, por imposição ou opção, que me perturba.
Foto by Aníbal C. Pires
Por estes dias fui chamado a fazer uma aula de substituição que, não sendo a melhor das tarefas docentes, confesso que fui com agrado. Gosto de partilhar o meu tempo com os alunos e a informalidade de uma aula de substituição pode resultar num bom aproveitamento do tempo, quer para o docente, quer para os alunos. Tenho, porém, consciência de que as aulas de substituição são um desperdício de tempo.
Após uma breve apresentação e numa tentativa, nem sempre bem-sucedida, de aproximação surgiram as primeiras propostas, feitas pelos alunos, para ocupar o tempo. Sim, para passar o tempo. Podia ter aceite e tudo seria mais fácil para mim, mas eu não gosto de ocupar o tempo, procuro dar-lhe utilidade e, por isso, recusei. Recusei amigavelmente e procurei encontrar uma solução que não contrariasse, de todo, a proposta feita pelos alunos. Aceitaram sem grande relutância, mas passados os primeiros momentos as manifestações de desagrado começaram a fazer-se sentir. Não gostaram da abordagem nem do itinerário por onde os tentei conduzir e, senti que grande parte daquele desagrado era geracional.
E outras preocupações emergiram que não o tempo e como cada um de nós o vive. Mas o tempo que eu já vivi e o que os meus alunos de ocasião ainda não viveram. Separam-nos várias gerações e aquele grupo alunos não sentiu nada em comum comigo, nem eu tive engenho e arte para lançar pontes que nos facilitassem o entendimento.
Já tinha percecionado, em contextos diferentes, esta sensação de que olham para mim como alguém que está a mais e que não tem nada de novo para acrescentar. Alguém que, por ter acumulado muito tempo de vida, deve retirar-se, pois, as suas aptidões não se coadunam com as mudanças operadas nas instituições. Não estando de acordo com os pressupostos, não posso deixar de concordar com a ideia de que me devo afastar. E eu bem queria retirar-me e ser senhor do meu tempo, e assim deveria ser. Não porque me sinta incapaz, mas por direito próprio. Direito que me foi subtraído por uma qualquer decisão tomada numa cimeira de Davos, ou em qualquer outra onde os donos do Mundo e os seus acólitos se reúnem.
O envelhecimento do corpo docente é uma variável que deve ser equacionada nos estudos sobre as questões da educação. Não vou desenvolver o assunto, nem se trata de uma reivindicação corporativa, é tão-somente uma preocupação que sendo minha, não é exclusiva, é comum a outros cidadãos.
O envelhecimento do corpo docente na Escola Pública deve objeto de reflexão de todos, desde logo dos responsáveis pelas políticas educativas, mas sobretudo das famílias.
Ponta Delgada, 21 de Janeiro de 2018


Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 22 de Janeiro de 2018 

... do tempo

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires





Fragmento de texto a publicar na imprensa regional e no momentos. Aqui mesmo como é habitual.






(...) Disse logo no primeiro parágrafo que não quero saber como utiliza o seu tempo, nem tenho que o fazer, mas não deixo de me preocupar com o desperdício do tempo com alguns passatempos. Passatempos que não são tão inócuos como podem parecer, e nos querem fazer querer. Alguns passatempos tiram-nos tempo e oportunidades, tempo e oportunidades irrepetíveis. 
Inquieto-me com o desperdício de tempo e procuro evitá-lo como faço com outros bens que, não sendo tão preciosos, têm valor um valor material ou imaterial. Esta inquietação resulta, em grande parte, do exercício da minha profissão. Os professores são observadores privilegiados da utilização do tempo e do seu desperdício, desde logo do seu próprio tempo. Mas é a utilidade que os jovens dão ao seu tempo, por imposição ou opção, que me perturba. (...)

sábado, 20 de janeiro de 2018

O Justo Equilíbrio - crónicas radiofónicas

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2018) by Madalena Pires








Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM

Hoje fica o texto da crónica emitida a 11 de Novembro de 2017 que pode ser ouvida aqui













O Justo Equilíbrio

Reuni alguns dados sobre vários assuntos para hoje partilhar consigo. Diferentes temáticas todas elas mais ou menos interessantes, atuais e relevantes conforme o ponto de vista e o gosto de cada um de nós.
A Web Summit, a redução da taxa do desemprego, a qualidade e o rendimento do trabalho o Orçamento Geral do Estado, mas também as propostas de Plano Anual e Orçamento da Região Autónoma dos Açores para 2018, o espúrio anúncio do encerramento do IMAR e do fim da rota da Azores Airlines que liga a Terceira a Madrid, ou ainda da realização, hoje mesmo, do Azores Challenge Trail para daí partir para a importância da atividade física na preservação da saúde, ou seja, na promoção do nosso bem estar físico e psicológico.
Tudo isto e mais outros tantos tópicos faziam parte das minhas notas para este nosso encontro semanal.
Tudo arrumadinho e pronto para iniciar esta nossa conversa quando me veio à lembrança que hoje é dia de S. Martinho. Coloquei os apontamentos de lado, ficarão para uma outra oportunidade, e decidi-me, espero que seja do seu agrado, por partilhar consigo uma breve reflexão que escrevi no passado mês de Agosto à qual dei o título “O justo equilíbrio”.
Temos sentimentos que nos alegram ou entristecem e, provocam-nos bem ou mal-estar consoante a sua natureza.
Os sentimentos induzem o pensamento e o comportamento. Por outro lado, as emoções são, segundo alguns pensadores, uma forma radicalizada que os sentimentos podem assumir.
E o que é levado ao extremo pode induzir comportamentos irracionais. Todos temos consciência, uns mais outros menos, de comportamentos ilógicos. Todos, de uma forma mais ou menos intensa, já nos comportámos fora do que seria desejável e benéfico para nós, ou seja, fomos, em algum momento, irracionais. A emoção sobrepôs-se a outros fatores que deveriam ter mediado a ação e, por consequência o comportamento.
Não interessa tanto se os outros assim o observaram, embora os outros também devam ser considerados, afinal não vivemos sozinhos mesmo que possamos não ser muito sociáveis ou que, pura e simplesmente, os outros, não nos importem. O que levado ao extremo pode resultar por escolher ficar à margem, optar pela autoexclusão.
Não tenho nada contra os eremitas, até admiro a sua capacidade de viverem sós e afastados, ou pelo menos, reduzindo as suas relações sociais ao essencial, mas não a considero uma decisão razoável para mim, embora passe muito tempo comigo mesmo.
Ir atrás das emoções pode ser caótico. As emoções afastam a racionalidade do comportamento. Racionalidade que sendo, no meu dicionário de sinónimos, calculismo, frieza e insensibilidade, ou mesmo a ausência de sentimentos não pode, porém, deixar de ser considerada num dos pratos da balança quanto determinamos o que fazer, o que dizer, ou como optar. No outro prato da balança deve estar, sempre, a emoção.
É no justo equilíbrio entre a razão e a emoção que se encontram as melhores decisões, sejam as decisões do momento e aparentemente inócuas, sejam as decisões que afetam de forma irreversível o nosso futuro.
Tenha sentimentos, mas não corra atrás das emoções.
Apaixone-se. Mas ame, sobretudo, ame desmedidamente

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 11 de Novembro de 2017

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Em Lisboa, Um Perigoso Leitor de Jornais


Um Perigoso Leitor de Jornais, romance baseado em factos reais, da autoria de Carlos Tomé, é apresentado em Lisboa, já hoje, dia 19 de Janeiro, pelas 21h 30mn..
A Casa dos Açores de Lisboa acolhe e promove este evento literário ao qual, para quem estiver por Lisboa ou arredores aconselho a ir e a adquirir um exemplar do livro que é apresentado.
Quem ler vai ficar surpreendido, não só pela escrita fluida e realista do autor, mas sobretudo pela temática que aborda. Carlos Tomé não só resgata a estória do seu avô, o autor resgata para a memória coletiva regional e nacional uma das muitas estórias de que foi feita a luta contra o fascismo em Portugal..
Trata-se da estória de mais de duas dezenas de micaelenses presos na cidade de Ponta Delgada, em 1938, e condenados ao degredo no forte de S. João Baptista, em Angra do Heroísmo, grupo do qual fazia parte Carlos Ildefonso Tomé, avô do autor, carteiro de profissão.
No forte de S. João Baptista, em Angra do Heroísmo, Carlos Ildefonso Tomé foi enclausurado na ala onde estavam alguns dirigentes comunistas, entre os quais Pires Jorge, com quem manteve uma relação de amizade e camaradagem.
Um Perigoso Leitor de Jornais constitui um importante e genuíno contributo para a compreensão social e política de uma época da nossa história coletiva sobre a qual existem poucos estudos e muitas tentativas de branqueamento.
Quando assisti ao lançamento do livro em Ponta Delgada escrevi uma publicação que pode ser lida aqui

quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Dos usos da cannabis

Imagem retirada da Internet
Há alguns dias atrás a opinião pública foi inquinada com a discussão na Assembleia da República de um diploma do BE e do PAN sobre o uso terapêutico da cannabis. Uma discussão que trazia associada alguns aspetos ligados ao uso daquela substância para efeitos recreativos que, sendo importante, é bem distinto da alegada pretensão do BE e do PAN e, diria, faz parte de uma outra e necessária discussão. Por outro lado, sabe-se que a lei já permite a comercialização de medicamentos que contêm cannabis, e outras substâncias, como por exemplo o ópio, sem que a Assembleia da República tenha de se pronunciar especificamente sobre autorizações pontuais.
Para que fique claro o INFARMED, autoridade a quem compete a certificação dos medicamentos, pode sem nenhuma alteração à lei autorizar a comercialização de medicamentos tendo por base a cannabis. O uso da cannabis ou de qualquer outra substância para fins terapêuticos é uma questão essencialmente técnica e científica e não uma questão política.
O BE e o PAN pretenderam, assim, que a Assembleia da República se substituísse ao INFARMED, o que não me parece razoável, mas o BE e o PAN não tiveram coragem de assumir, sem equívocos, que a alteração que subscreveram pretendia ir além das questões terapêuticas para abrir, de forma encapotada, caminho ao uso da cannabis para fins recreativos.
Está chegada a altura de fazer uma declaração de princípio. Sem nenhuma reserva defendo que o uso da cannabis para fins recreativos deve ser objeto de um quadro legal que permita, não só a plantação, mas a também a sua comercialização. Simplificando, pessoalmente defendo o uso da cannabis, comercializada legalmente, para fins recreativos.
Imagem retirada da internet
A plantação, a transformação e a comercialização da cannabis para fins recreativos, como atividade legalizada, será desde logo uma importante medida de combate ao tráfico desta e de outras substâncias. Mas a adoção de medidas, estas sim, políticas que criem um quadro legal e regulamentar do uso da cannabis para fins recreativos não se fica apenas por isso. Sem sequer regressar à questão da saúde, o cultivo, a transformação e a comercialização da cannabis para uso recreativo pode constituir-se como uma atividade económica interessante, desde logo para a Região, pois como se sabe a planta de que falamos e que se cultiva, ilegalmente nos Açores, tem procura nos mercados onde a sua comercialização para uso recreativo está legalizado. E na verdade a cannabis é cultivada por aí em todos os rincões das nossas ilhas, basta atentar à ação policial e à geografia dos eventos de descoberta e destruição de plantações para sustentar esta afirmação.
A delicadeza desta discussão obriga, necessariamente, a um aprofundamento e esclarecimento das vantagens e eventuais efeitos indesejáveis do uso pessoal e recreativo, uma vez que para fins terapêuticos estamos esclarecidos e dotados dos instrumentos necessários e suficientes para que a autoridade nacional possa certificar medicamentos com base na cannabis.
Ponta Delgada, 16 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 17 de Janeiro 2018

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

... da clarificação

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires




Fragmento de texto a publicar na imprensa regional e no momentos. Aqui mesmo como é habitual.






(...) Está chegada a altura de fazer uma declaração de princípio. Sem nenhuma reserva defendo que o uso da cannabis para fins recreativos deve ser objeto de um quadro legal que permita, não só a plantação, mas a também a sua comercialização. Simplificando, pessoalmente defendo o uso da cannabis, comercializada legalmente, para fins recreativos.
A plantação, a transformação e a comercialização da cannabis para fins recreativos, como atividade legalizada, será desde logo uma importante medida de combate ao tráfico desta e de outras substâncias. Mas a adoção de medidas, estas sim, políticas que criem um quadro legal e regulamentar do uso da cannabis para fins recreativos não se fica apenas por isso. (...)

Na senda da destruição da economia produtiva

Imagem retirada da Internet
SOMAGUE na Terceira, SINAGA em S. Miguel e, agora a COFACO no Pico. Trata-se de despedimentos com tudo o que isso significa em termos sociais e económicos nas pequenas economias insulares, trata-se do fim, no caso da SINAGA e da COFACO, de atividades industriais que transformavam produtos da terra e do mar.
Apesar das dificuldades conhecidas, em qualquer dos casos, o desfecho não tinha que ser forçosamente assim. No caso da SOMAGUE os despedimentos, uma centena nos Açores sendo a maioria na ilha Terceira. Este despedimento coletivo foi justificado pela SOMAGUE com fazendo parte de uma reestruturação global da empresa. As vítimas desta reorganização foram os trabalhadores, mas os gestores e estrategas empresariais foram os responsáveis pelas dificuldades traduzidas na diminuição da atividade e, por conseguinte, da quebra das receitas que se têm verificado desde 2015. Não existe perigo de insolvência e mais mês menos mês, mais ano menos ano a SOMAGUE voltará a recrutar trabalhadores. Novos contratos, menos direitos, menos custos do trabalho. Esta é a velha fórmula que generalidade dos empresários portugueses utiliza para aumentar a sua competitividade. Entretanto a SOMAGUE continuará a sustentar a sua atividade à custa das obras públicas que lhe forem adjudicadas.
A escassez de matéria prima, as regras europeias e a liberalização do mercado internacional acentuaram as dificuldades financeiras da SINAGA, todos percebemos que era necessário encontrar uma solução, assim não podia continuar. Mas ao invés de modernizar e diversificar a atividade transformadora, como chegou a estar anunciado, a opção foi o encerramento da atividade fabril e os despedimentos.
Imagem retirada da Internet
O início de 2018 trouxe a confirmação do que há muito se suspeitava. A COFACO Pico tal como a conhecemos encerra, e os seus cerca de 200 trabalhadores vão ser despedidos.
Vai ser construída uma nova fábrica e, ao que diz por aí, até já tem garantia de financiamento por fundos públicos e comunitários. Não deixa de ser paradoxal que uma empresa que encerra e despede todos os trabalhadores beneficie de financiamento público para voltar a abrir com a mesma atividade, embora reduzindo o leque dos produtos transformados, ou seja, a nova fábrica vai fazer, apenas, conserva de lombos de atum. Esta opção requer menos especialização e menos trabalhadores.
O processo da COFACO esteve sempre envolto numa nuvem de contradições e as respostas políticas do Governo regional esboroaram-se no limiar de 2018. E não foi a primeira vez que aconteceu, todos nos lembramos do encerramento da unidade fabril da COFACO na ilha do Faial, mas a Região continua a não exigir que a empresa cumpra as suas responsabilidades sociais e, para além disso ainda facilita o acesso ao financiamento público.
Os trabalhadores da COFACO e a população da ilha do Pico foram surpreendidos com esta decisão, por quanto o Governo Regional, sempre deu garantias de que não ocorreriam alterações que colocassem em causa a continuidade da empresa e que os postos de trabalho estavam assegurados. A administração da COFACO corroborava estas afirmações e foi desenvolvendo uma estratégia de desagregação da estrutura organizacional e do capital social da COFACO. Foi criada uma nova empresa, para substituir a COFACO no Pico, com o estatuto de PME e, é esta nova empresa que se candidata aos fundos comunitários e à comparticipação do orçamento regional para a construção da nova fábrica.
É inadmissível que o Governo Regional aceite, sem reservas, esta manipulação dos instrumentos legais, utilizados de forma pouco clara e na fronteira da ilicitude, e não tenha procurado contrariar esta estratégia empresarial que vai produzir impactos sociais e económicos dramáticos na ilha do Pico.
Horta, 14 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 15 de Janeiro de 2018

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

... do capital sem risco

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires








Excerto de texto a publicar na imprensa regional e no blogue momentos


(...) Os trabalhadores da COFACO e a população da ilha do Pico foram surpreendidos com esta decisão, por quanto o Governo Regional, sempre deu garantias de que não ocorreriam alterações que colocassem em causa a continuidade da empresa e que os postos de trabalho estavam assegurados. A administração da COFACO corroborava estas afirmações e foi desenvolvendo uma estratégia de desagregação da estrutura organizacional e do capital social da COFACO. Foi criada uma nova empresa, para substituir a COFACO no Pico, com o estatuto de PME e, é esta nova empresa que se candidata aos fundos comunitários e à comparticipação do orçamento regional para a construção da nova fábrica. (...)

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Empobrecer - crónicas radiofónicas

Foto by Aníbal C. Pires




Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM

Hoje fica o texto da crónica emitida a 4 de Novembro que pode ser ouvida aqui






Empobrecer

O anúncio do encerramento da SINAGA, enquanto unidade de produção de açúcar a partir da beterraba sacarina, não constituiu propriamente uma surpresa. As caraterísticas do mercado internacional do açúcar, as regras da União Europeia, os acordos de livre comércio, a diminuta área agrícola de produção da beterraba e, sobretudo a inércia do Governo Regional que, sobre a SINAGA fez o que costuma fazer quando a complexidade dos problemas ultrapassa a gestão corrente, Derrama dinheiro sobre o assunto e espera que, bem ou mal, o tempo resolva.
Em 2010 concordei com a intervenção da Região na SINAGA, ainda que, não nos moldes em que foi realizada. Apesar do meu acordo tinha, contudo, consciência de que não se podia ficar apenas por aí. A empresa necessitava de uma nova unidade de produção e não se podia limitar, apenas e só, à transformação da beterraba sacarina e à refinação do açúcar, tinha de diversificar a sua produção.
No momento e em sede própria assim o propus. Mas o Governo Regional fez sempre ouvidos moucos das minhas recomendações e o PS, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, encarregava-se de chumbar as minhas propostas e recomendações. Até que, corria o ano de 2016, não porque me tivessem ouvido, mas porque os interesses do momento assim o aconselhavam, foi o próprio Governo Regional, pela voz do então Secretário Regional da Agricultura, Luís Neto Viveiros, que anunciou a construção de uma nova unidade de produção para a SINAGA, à saída de uma audição da Comissão Parlamentar de Economia, realizada no dia 6 de Junho de 2016.
Como agora se constata, passado pouco mais de um ano, não passou disso mesmo, de mais um anúncio que se esfumou na memória de alguns cidadãos, mas que, em devida altura serviu um determinado objetivo, quiçá eleitoral pois, como sabem, 2016 foi ano de eleições regionais. Nada de novo no exercício do poder político sustentado por uma absoluta maioria decadente e acrítica. O poder executivo conta com a memória curta dos cidadãos e, os cidadãos mais atentos já se habituaram a destrinçar as alegorias da realidade e vão, cada vez em maior número, desacreditando na democracia e nos seus rituais. Do descrédito à abstenção vai um pequeno passo e, a democracia fenece.
A SINAGA não vai fechar portas, mas com esta decisão a agroindústria regional fica mais pobre. É uma atividade agrícola que fecha um ciclo que teve importância económica, é uma atividade industrial que como outras, ligadas ou não à agricultura, foram encerrando ao longo das últimas décadas, quer em S. Miguel, quer noutras ilhas da Região.
Reduzir a atividade económica produtiva regional é caminhar para o empobrecimento e não há Turismo que nos valha. Veja-se o exemplo das ilhas Canárias um dos destinos turísticos mais procurados e, no entanto, é uma das Regiões mais pobres da União Europeia. Isto para além do turismo ser uma atividade económica de grande incerteza, aliás os Açores estão a beneficiar, certamente do novo paradigma dos transportes aéreos, mas não só. Muitos dos destinos tradicionais na margem sul da bacia do Mediterrâneo, deixaram de ter procura devido à instabilidade que se instalou com a radicalização dos sistemas políticos que resultaram da chamada “Primavera Árabe”. Os Açores beneficiaram claramente com esse e outros fatores ligados à segurança do destino.
Quando em 1983 cheguei à ilha de S. Miguel, tive oportunidade de visitar uma fábrica de reciclagem de papel, ainda a reciclagem e a separação dos lixos não faziam parte dos nossos hábitos, nem os resíduos eram um chorudo negócio.
A fábrica produzia papel kraft e cartão reciclados. Não sei precisar qual foi o ano do seu encerramento, nem as razões que estiveram na origem da decisão, nem o número de postos de trabalho que, com o seu encerramento, se extinguiram, mas sei, e o tempo assim o demonstrou, que a cidade de Ponta Delgada, a ilha de S. Miguel e os Açores ficaram mais pobres.

Ponta Delgada, 02 de Novembro de 2017

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Sinais do tempo ou do mercado

Imagem retirada da internet
Não deixa de ser interessante embora dramático observar, por um lado o comportamento passivo da generalidade dos cidadãos, todos potenciais clientes/utentes, dos trabalhadores que nem sempre têm consciência que mais tarde ou mais cedo o cenário não será o que lhes desenharam, mas é, sobretudo, o comportamento ativo, mas contraditório, de alguns protagonistas e decisores políticos quando são anunciadas privatizações de empresas públicas e os elogios que tecem à decisão. As privatizações são aceites sem grandes reservas e em muitos casos até aplaudidas pois, daí espera-se maior eficiência e até a diminuição dos custos do serviço prestado, Nada de mais errado como o tempo tem vindo a demonstrar.
A privatização dos CTT é, talvez, o caso mais paradigmático. A qualidade do serviço diminuiu, as queixas dos clientes são mais que muitas e os custos para os utilizadores sofreram substantivos aumentos. Ainda assim os lucros não satisfazem os investidores privados e aí temos uma anunciada reestruturação que prevê o encerramento de mais 22 postos de atendimento e o despedimento de largas centenas de trabalhadores.
As reações não se fizeram esperar, desde logo dos trabalhadores os primeiros visados, mas também das populações e de alguns protagonistas políticos que agora, para responderem ao descontentamento dos trabalhadores e das populações se desdobram em declarações contra a reestruturação, sabendo-se que quando podiam e deviam travar o processo de privatização, então sim, deveriam ter-se mobilizado para que tal não acontecesse. Mas não, a modernidade e progresso não é, segundo os próprios, sinónimo de detenção de empresa pelo Estado. Cá por mim que tenho outro entendimento do que deve ser o progresso e a modernidade defendi e defendo que os CTT devem pertencer à esfera pública, afinal trata-se de uma empresa lucrativa que presta um serviço público, que se quer de proximidade e com um serviço de qualidade.
Imagem retirada da internet
A recuperação dos CTT para o domínio público é um imperativo nacional, de soberania, coesão territorial e justiça social e de defesa do serviço postal público.
É necessário ter em consideração a voz dos trabalhadores e das populações e assumir que como solução a reversão da privatização da empresa CTT Correios de Portugal. O Governo da República não pode continuar a assistir a esta degradação e depredação dos CTT sem nada fazer, deixando prosseguir uma estratégia tendente ao esgotamento progressivo duma empresa com papel fundamental e insubstituível para o país e populações e que emprega mais de dez mil trabalhadores.
Considerando o papel que cabe aos Correios como instrumento insubstituível para a coesão social, económica e territorial do nosso país e que ao Estado cabe a responsabilidade de garantir que os serviços postais são assegurados em condições de igualdade a todos os cidadãos, sem discriminação de qualquer espécie, é imperativo que se inicie o processo de recuperação do controlo e gestão do serviço postal universal por parte do Estado, através da reversão da privatização dos CTT - Correios de Portugal. Esta é uma recomendação do PCP, já feita pelo seu Grupo Parlamentar, na Assembleia da República, aguardemos pelo seu desfecho.
Ponta Delgada, 09 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 10 de Janeiro de 2018

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Toada do mar e da terra - dia 15 no Faial


No próximo dia 15 de Janeiro, na cidade da Horta, pelas 21h, na Cedars House, terá lugar a apresentação pública do livro “Toada do mar e da terra – Volume I 2003/2008”, crónicas de Aníbal C. Pires e ilustrações de Ana Rita Afonso. A sessão será presidida por Sua Excelência a Presidente da ALRAA e a apresentação do livro será feita por Renata Correia Botelho.
Aqui fica o convite.

... encerrar e despedir

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) by Madalena Pires





Excerto de texto a publicar na imprensa regional e no blogue momentos






(...) As reações não se fizeram esperar, desde logo dos trabalhadores os primeiros visados, mas também das populações e de alguns protagonistas políticos que agora, para responderem ao descontentamento dos trabalhadores e das populações se desdobram em declarações contra a reestruturação, sabendo-se que quando podiam e deviam travar o processo de privatização, então sim, deveriam ter-se mobilizado para que tal não acontecesse. Mas não, a modernidade e progresso não é, segundo os próprios, sinónimo de detenção de empresa pelo Estado. Cá por mim que tenho outro entendimento do que deve ser o progresso e a modernidade defendi e defendo que os CTT devem pertencer à esfera pública, afinal trata-se de uma empresa lucrativa que presta um serviço público, que se quer de proximidade e com um serviço de qualidade. (...)

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Contra a maré populista

Imagem retirada da internet
Resistir até resisto, mas face ao desconhecimento e ausência de pensamento crítico que reina por aí, Desisto. Desisto apesar de estar médica e familiarmente aconselhado a não o fazer. E cá estou eu a pegar, mais uma vez, num assunto sobre o qual a generalidade dos meus concidadãos já tem opinião formada a qual não é coincidente com a minha, neste caso trata-se da lei do financiamento dos partidos. O juízo e a condenação estão feitos pelo povo e, a pena foi já aplicada pelo Presidente da República, a generalidade dos réus aceitou, sem recorrer do veto presidencial e da condenação popular, ou melhor, da condenação populista corporizada em Marcelo Rebelo de Sousa.
Mas será que todos os aspetos foram tomados em devida conta na formação da opinião pública. Tenho ideia que não e, sendo assim, houve um claro propósito de mistificar este assunto que, sem dúvida, diz respeito a todos nós e, como tal, ao funcionamento do sistema democrático.
No essencial, foram duas as questões que contribuíram para a condenação pela opinião pública das alterações à lei de financiamento dos partidos e que o Presidente da República assumiu como suas para justificar o veto político. A saber, i) o secretismo do processo; e, ii) a isenção do IVA. Estas duas questões foram suficientes para a condenação das alterações à aludida lei.
O que ficou por dizer foi muito mais e, diria eu, se tivesse sido dito talvez o resultado final não fosse o conhecido.
A revisão da lei de financiamento dos partidos aconteceu para dar cumprimento às indicações do Tribunal Constitucional e não porque qualquer um dos partidos que subscreveu a proposta e a aprovou tivesse tomado a iniciativa.
A lei data de 24 de Abril de 2003 e é, de facto, absurda, antidemocrática e inconstitucional pois, impõe limitações de atuação dos partidos, confunde fiscalização com ingerência e fere a liberdade de organização política. Chegado aqui julgo que os leitores estarão, com toda a legitimidade, a perguntar, Então porque é que os partidos a aprovaram. Bem, a lei não mereceu aceitação unânime, mas a sua aprovação ficou a dever-se ao facto de a lei consagrar elevados financiamentos públicos para a atividade partidária. Julgo chegado altura de me socorrer de alguns números da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos junto do Tribunal Constitucional para procurar demonstrar quais os partidos políticos que beneficiam com a atual lei.

No período de 2011 a 2015 pode verificar-se que do total de receitas, subvenções públicas e fundos próprios, as subvenções públicas representavam 82,7%, no caso do PSD, 69%, no caso do PS, 96% no caso do CDS/PP, 78,8%, no caso do BE e, 11,2%, no caso do PCP.
Estes números são suficientes para se perceber quem são os beneficiários e, por outro lado, qual partido que é visado com o texto da atual lei.
As alterações que foram introduzidas na lei e que mereceram a condenação pública, bem assim como o veto do Presidente da República, não alteravam esta comprovada matriz de dependência, da generalidade dos partidos políticos, das subvenções públicas, mas também não aumentavam o seu valor. As alterações abriam a possibilidade de maior iniciativa própria para recolha de fundos sem prejuízo do controlo existente, isto é, as alterações abriam a possibilidade de tornar os partidos menos dependentes das subvenções públicas. O financiamento público dos partidos terá de sofrer, em minha opinião, uma significativa redução. Ora isso, como se pode verificar, não interessa a todos os partidos.
Quanto à questão da devolução do IVA, já estava consagrada e em vigor, as alterações visavam por fim à discricionariedade de interpretação da Autoridade Tributária, apenas isso. Embora seja aconselhável fazer uma consulta ao Código do Iva e espantarem-se com a quantidade, podem ou não concordar, de atividades que estão isentas de IVA. Façam isso e talvez tenham algumas surpresas.
O tal secretismo foi apenas mais uma acha para atiçar o populismo de que a classe média é a principal intérprete. Com mais ou menos reserva, com mais ou menos publicidade nada acontece na Assembleia da República que não seja público. Alguém se distraiu, e não fui eu.
Foto by Aníbal C. Pires
Por fim, apenas mais uma ou duas notas genéricas sobre as questões do populismo que continuam a ser alimentadas, muitas vezes, por alguns cidadãos que pelas responsabilidades socias e culturais e, pela missão intrínseca ao seu ofício colocam em causa a imagem profissional de toda uma classe.
Nos últimos dias dei conta de algumas afirmações, com origem em educadores e professores, que há falta de outros argumentos para justificar as suas próprias opções enveredaram por um ataque cerrado aos deputados regionais com base em ideias feitas, mas totalmente erradas.
A aposentação dos deputados, o pagamento de subvenções vitalícias e a sua relação com regimes especiais de aposentação, bem assim como o designado subsídio de reintegração na vida ativa acabaram em 2005. Ou seja, quem recebe subvenções vitalícias são os ex-deputados que até 2005 reuniram condições para o efeito. Os regimes de assistência na doença e de ajudas de custo dos deputados nos Açores é idêntico ao da administração pública regional, os salários são públicos e indexados ao salário do Presidente da República, bem na Região Autónoma da Madeira existe um regime próprio, e o atual salário de deputado equipara-se ao salário de um educador ou professor no topo da carreira.
É lamentável que alguns educadores e professores, poucos, mas ainda assim alguns, seja tão permeável à manipulação e ao domínio, colocando em causa a imagem de toda uma classe profissional que tem por missão a transmissão do conhecimento e a promoção do pensamento crítico.
Ponta Delgada, 07 de Janeiro de 2018

Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 08 de Janeiro de 2018

domingo, 7 de janeiro de 2018

... das dependências do Estado

Aníbal C. Pires (S. Miguel, 2017) foto by Madalena Pires












Excerto de texto a publicar na imprensa regional e no blogue momentos













(...) Julgo chegado altura de me socorrer de alguns números da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos junto do Tribunal Constitucional para procurar demonstrar quais os partidos políticos que beneficiam com a atual lei.
No período de 2011 a 2015 pode verificar-se que do total de receitas, subvenções públicas e fundos próprios, as subvenções públicas representavam 82,7%, no caso do PSD, 69%, no caso do PS, 96% no caso do CDS/PP, 78,8%, no caso do BE e, 11,2%, no caso do PCP.
Estes números são suficientes para se perceber quem são os beneficiários e, por outro lado, qual partido que é visado com o texto da atual lei. (...)

sábado, 6 de janeiro de 2018

Rituais - crónicas radiofónicas

Foto by Aníbal C. Pires 





Do arquivo das crónicas radiofónicas na 105FM

Hoje fica o texto da terceira crónica que pode ser ouvida aqui





Rituais
Talvez ainda não lhe tenha dito, mas, se já o fiz, volto a dizer-lhe pois, nunca é demais quando gostamos. E eu gosto, Gosto de estar consigo.
Estamos a aproximar-nos, segundo o calendário comercial, das celebrações do Halloween. E quando falamos do Halloween, falamos de rituais pagãos ligados à morte. Assim sendo podemos e devemos falar também dos nossos rituais e, quiçá não dar tanta importância a um ritual importado e mercantilizado.
A vida além morte, ou algo semelhante a uma condição etérea, cedo incorporou o imaginário humano. As representações e construções socias mais ou menos elaboradas deram lugar a cultos e rituais, mais ou menos complexos, mas todos eles associados ao respeito pelos mortos e, também, à ideia de que esses entes, em determinados momentos do ano regressavam aos lugares onde tinham vivido ou, mesmo, que nem sequer se chegavam a ausentar convivendo connosco, ainda que, numa outra dimensão.
As religiões, em particular a católica, vieram introduzir alterações e combater os cultos pagãos à medida que foram colonizando e aculturando outros povos, contudo, e porque a própria sobrevivência e afirmação de algumas religiões está diretamente relacionada, não direi exclusivamente, mas profundamente, com ideia da vida além morte, também elas absorveram e, posteriormente, impuseram os seus próprios cultos e ritos. Veja-se no mundo católico o “Dia de Todos os Santos”, a 1 de Novembro, e o dia dos “Fiéis Defuntos”, a 2 de Novembro.
No Mundo português, continental, insular e mesmo em alguns dos territórios colonizados encontramos manifestações que os povos foram recriando, mesclando o pagão e o religioso. No interior e norte do Continente português, nos Açores e em Cabo Verde, nos meses que antecedem o dia dos “Fiéis Defuntos, encomendam-se as almas procurando, não só, dar-lhes o eterno descanso, mas também garantindo para si as benesses de entrada direta para o paraíso celestial. Chegado Novembro as casas abrem-se as mesas enchem-se de iguarias para que os mortos que nos venham visitar possam saciar a fome e partir em paz. Se a primeira tem um carácter mágico religioso, a segunda está diretamente ligada aos rituais pagãos que herdamos dos celtas e às oferendas a vizinhos e visitantes de ocasião.
Os tempos e as novas teologias encarregaram-se de transformar as genuínas manifestações populares que estiveram na origem do culto da morte e que, em minha opinião, se relacionam, por um lado com o ciclo anual da órbitra da Terra à volta do Sol e tudo o que daí decorre nos períodos de transformação da natureza, e, por outro lado na liturgia dos cultos que as religiões monoteístas introduziram nestes ancestrais ritos.
Os “Santoros” da Beira Baixa, ou o “Pão por Deus” dos Açores, cujos contornos decorrem mais dos rituais pagãos do que do culto religioso, embora a hierarquia católica não os podendo vencer se tenha associado a eles, têm sido progressivamente substituídos pelas festividades do Halloween.
A génese do Halloween é a mesma de outros ritos pagãos, ou seja, o culto da morte e o respeito pelos mortos. A sua adulteração e a sua entrada no calendário comercial com tudo o que isso implica, de bom ou mau, fica a dever-se ao marketing comercial.
Não fazendo parte da tradição portuguesa não compreendo que esta importação da cultura anglo-saxónica se tenha, nas Escolas, sobreposto à tradição nacional e aos seus regionalismos. É aceitável que os docentes de língua inglesa promovam esta celebração, faz parte do processo de ensino aprendizagem da língua e da cultura dos povos anglo-saxónicos, já não é aceitável que a Escola o promova de uma forma acrítica e secundarizando a nossa, ou outras culturas.
Menos aceitável é a submissão da Escola à teologia do mercado, ao consumismo e à uniformidade, num Mundo que é tudo menos igual.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 26 de Outubro de 2017

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Agradecimento aos mentores do logro

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O autor da expressão “Uma greve a destempo”, está naturalmente informado, diria até, bem informado da evolução das negociações sindicais da FENPROF com o Ministério da Educação, porém, como é um homem avisado e que sabe ouvir o que lhe aconselham, mesmo quando sugerido por um dos mentores do logro em que os educadores e professores dos Açores foram enredados, foi rever o texto da notícia de ontem que dava conta da insatisfação, transmitida por Mário Nogueira, à saída de uma reunião negocial com o Ministério da Educação, não se tivesse dado o caso de, na leitura feita ainda ontem, não ter percebido qual a matéria da discordância e se o assunto constituía uma surpresa.

O autor da expressão “Uma greve a destempo” leu, e releu e, não encontrou nada que não tivesse lido e percebido ontem. Mas, ainda antes de dar continuidade a esta questão importa deixar algumas notas para desconstruir as acintosas insinuações com que, um dos mentores do logro, tentou menorizar o autor da tal expressão.

- o autor não tem seguidores, mas tem opinião própria e afirma-a sustentando-a em factos;
- o autor não apregoa nem a bondade do Governo da República, nem de governo nenhum, e não o faz em relação à questão das reivindicações dos educadores e professores, como em relação a matéria nenhuma, pois tem consciência que só mesmo com a luta é que vamos lá. Aliás o tal autor confessou-me que dá um doce a quem encontrar, nas suas palavras, qualquer expressão de onde implícita, ou explicitamente se possa inferir que o autor continua a “… apregoar a bondade do governo da república…”
- quanto à “putativa ausência de estratégia de luta regional”, considera o autor, da tal expressão, que esta insinuação não lhe é dirigida, mas sim à estrutura sindical onde está associado. Diz, também, o autor da tal expressão, que quem o está a procurar aconselhar demonstra, com estas palavras, um grave desconhecimento da agenda reivindicativa regional da estrutura sindical à qual o autor da expressão está associado e, aproveita a oportunidade para informar que essa estratégia será discutida, alterada, construída e validada pelos educadores e professores nos plenários regionais já agendados para este mês (é a democracia a funcionar).

Imagem retirada da internet
Retomemos agora o cerne da questão.

Ontem, dia 3 de Janeiro, ao fim de uma reunião negocial suplementar com Ministério da Educação, o Secretário-geral da FENPROF deu conta do descontentamento daquela federação de sindicatos de professores face à indisponibilidade do Ministério da Educação para negociar propostas da FENPROF. Mário Nogueira deixou em aberto a possibilidade de endurecer a luta, porque como se pode ler em todos os documentos da FENPROF a palavra de ordem é, "manter a luta na agenda”.
Mas afinal quais eram os objetos da reunião negocial.

- A fixação de uma percentagem mínima de vagas anuais para progressão aos 5.º e 7.º escalões, a ter em conta já em 2018, bem como a garantia de negociação anual do contingente a fixar;
- Uma revisão geral do regime de concursos e a realização, em 2018, de um concurso interno, externo e de mobilidade interna.
Ora bem, sendo sem dúvida importante para os educadores e professores do continente e da Madeira, no caso do 5.º e 7.º escalões, e apenas os do continente no caso dos concursos, para os Açores e Madeira só indiretamente nos diz respeito.

Passo a explicar,
- na Região Autónoma dos Açores não existem limitações (vagas) para progredir para o 5.º e 7.º escalões, ao contrário do continente e da Madeira. Não existem porque a estrutura sindical a que o autor da tal expressão está associado lutou, infelizmente sem a apoio de outras estruturas sindicais, para que assim fosse. Ou seja, o que releva é que esta questão não afeta os educadores e professores dos Açores, mas serviu para os mentores do logro introduzirem ruído comunicacional para denegrir uma estrutura sindical e uma federação de sindicatos, por acaso, só por acaso, é o sindicato e a federação a quem se devem as maiores conquistas, também se contabilizam algumas derrotas, dos educadores e professores na Região e no País;
- quanto à revisão geral do regime de concursos e à realização, em 2018, de concursos, como é bom de ver não tem nada a ver com a Região. É importante, sem dúvida até porque indiretamente se relaciona com a mobilidade dos docentes em todo o território nacional.

Foto by Aníbal C. Pires
Para terminar o autor da tal expressão lamenta, acabou de me confessar, que os mentores do logro contem com o desconhecimento dos educadores e professores dos Açores para, com base na aludida notícia, encontrarem argumentos para manter os docentes que genuína e legitimamente estão disponíveis para lutar pela dignidade e valorização profissional, mas que já começaram a questionar-se sobre o verdadeiro objetivo desta inexplicável greve que, como o autor a classificou, se realizou a “destempo”.
E porquê, perguntam os leitores, Bem por que esta rutura não coloca em causa o compromisso assinado no dia 15 de Dezembro pp. Compromisso que garante o descongelamento de 7 anos de serviço e sua contagem para efeitos da progressão, ou seja, não compromete as reivindicações dos educadores e professores dos Açores.

Se a luta se resume apenas a esta questão, Não, claro que não. Mas esta é, como todos percebemos a prioridade das prioridades. Depois iremos a outras questões nacionais e regionais que importa continuarem na agenda das lutas.

O autor agradece a oportunidade de poder fazer este esclarecimento na sequência do aconselhamento de que foi alvo.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 04 de Dezembro de 2018