segunda-feira, 2 de junho de 2014

Epifenómeno

Aníbal C. Pires - Foto Tiago Redondo
As análises aos resultados eleitorais estão concluídas mas os efeitos estão ainda a produzir-se. Uma conclusão parece-me óbvia e, atrevo-me até a afirmar, que reúne alguma unanimidade, ainda que, por alguns, inconfessada. Os partidos que de uma forma ou outra são responsáveis pelo estado a que o Estado chegou foram penalizados eleitoralmente, aliás as lutas intestinas no PS são a maior prova disso. Num partido que se afirma como o grande “ganhador” das eleições europeias devia reinar a calma e a unidade tendo em vista as eleições legislativas de 2015. Mas não, o comportamento do PS é o de um partido derrotado, e foi. O PS foi um dos partidos perdedores, por mais que António Seguro diga que o PS ganhou, ganhou, ganhou… a verdade é que os factos, mais do que os números, evidenciam que o PS perdeu, perdeu, perdeu… e, continuará a perder enquanto não mudar, mudar de projeto político, não de protagonista. António Costa pode até conseguir mais apoio eleitoral do que o seu homónimo Seguro, mas não chega. Nem chegará a reforma do sistema eleitoral que o PS agora anunciou. A questão é bem mais profunda do que a maquilhagem.
Mas foi a democracia, esta democracia, a grande perdedora das europeias. Este alheamento da maioria dos cidadãos, como se comprova, não impediu que os 21 deputados fossem eleitos e, por outro lado, permitiu que os partidos alternantes mantivessem a sua posição dominante, não é com a abstenção que se rompe com o “sistema”, a rutura só será possível com a participação ativa dos cidadãos, nos momentos eleitorais mas, sobretudo, fora deles. Enquanto o descontentamento se transformar em ativismo de sofá e as vozes da insatisfação se fizerem “ouvir” apenas nas redes sociais, os partidos responsáveis pela dramática situação que se vive em Portugal vão continuar a esfregar as mãos de contentes, vão continuar a alternar no poder, vão perpetuar-se.
A expressão do descontentamento dos portugueses assumiu contornos diversos. Foi a já aludida abstenção, foi a penalização eleitoral dos partidos alinhados com as políticas de austeridade, designadamente o PS, foi o crescimento eleitoral da CDU, e foi o “fenómeno” Marinho Pinto. Não digo MPT porque é bom que se separem as águas como, aliás o próprio Marinho Pinto tem feito e, a seu tempo, tornará ainda mais claro, por agora vão bastando exteriorizações como “união de facto”, expressão usada pelo “fenómeno” para caraterizar a sua relação com o MPT. Resta saber até quando o MPT se vai deixar parasitar por Marinho Pinto, ou até quando e qual será a dimensão do deslumbramento, de um segmento de eleitores, no discurso populista que carateriza o antigo bastonário da Ordem dos Advogados.
A vida política portuguesa tem variados exemplos de epifenómenos político eleitorais como o de Marinho Pinto/MPT que, com algum esforço de memória ou pesquisa, com facilidade se encontram. Comprovadamente, não é por aí a rutura, com as políticas de austeridade e empobrecimento de que temos sido vítimas, se dará.
Horta, 01 de Junho de 2014

Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove et Azores Digital, 02 de Junho de 2014 

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