quarta-feira, 21 de outubro de 2015

As voltas que o Mundo dá - do México ao Pico (estória de Verão)

Foto - Aníbal C. Pires
As migrações e o amor estão na origem de muitas estórias e por vezes mesclam-se, na mesma estória, o amor e as migrações. Esta é uma dessa estórias em que o amor uniu, longe da sua terra, uma mulher e um homem que migraram. Uma como muitas outras estórias em que o amor vence distâncias e diferenças.
Das migrações conhecemos as estórias dramáticas da imigração de desespero como as que temos assistido nos últimos dias, semanas, meses, anos. Tempo de mais sem que nada seja feito para acabar com as desigualdades que estão na origem, em quem não tem nada a perder, da decisão de caminhar, quantas vezes, para a morte no Mediterrâneo, no Atlântico, na “muralha” fronteiriça do México com os Estados Unidos ou em qualquer outro rincão deste Mundo onde se levantam “muros” físicos ou administrativos que limitam o direito universal a migrar e a procurar melhores condições de vida. Esquecemo-nos, vezes de mais, que foram as migrações que povoaram todos os recantos do nosso planeta e que transformaram o Mundo.
Também há estórias de percursos migratórios de sucesso e até se promove a migração de luxo. Estas são as estórias dos bem-sucedidos e empreendedores, estas são as estórias dos vistos Gold, esta é a imigração que os governos europeus acarinham, publicitam e mostram aos organismos internacionais com medidas de boas práticas de integração e acolhimento.
Existem, porém, outras estórias bem-sucedidas de milhares e milhares de migrantes assalariados, que nunca saem do anonimato mas que se integram nas comunidades de acolhimento, que trabalham, pagam impostos e a segurança social. Estes não fazem, nem querem fazer, manchetes na comunicação social. Estes querem apenas o seu direito a ser felizes.
Das estórias de amor que dizer que não saibamos todos, desde logo a nossa própria estória.
Foto - Aníbal C. Pires
Ainda era Agosto e já as vindimas no Pico tinham começado, na adega cooperativa a azáfama era grande e o cheiro caraterístico a uvas maduras e ao mosto pairava no ar. Coisas do tempo que este ano favoreceu a maturação precoce das uvas. Entrei na Adega Cooperativa com o Presidente da Direção, pessoa de bom trato e com um sentido de humor apurado, que me foi explicando o uso dos diferentes espaços e apresentando cada um dos trabalhadores com quem nos fomos cruzando. Mulheres e homens de diferentes idades a quem o Presidente tratava de forma afável realçando as suas caraterísticas e qualidades. Este é o José está connosco há alguns anos e é mexicano. Cumprimentei e falei com o José como tinha cumprimentado e falado com todos os outros trabalhadores com quem me fui cruzando mas, por razões do meu particular interesse pelas migrações, quis saber um pouco mais sobre o José. Como é que um cidadão da América Central tinha vindo parar à ilha do Pico, não que o facto me causasse grande estranheza pois tenho encontrado cidadãos das mais improváveis origens por todas as ilhas açorianas. A estória do José mais do que do seu percurso migratório, era afinal uma estória de amor com raízes na Califórnia onde as migrações juntaram uma jovem mulher do Pico e um jovem oriundo do México que se apaixonaram, casaram e, optaram por deixar as oportunidades douradas da Califórnia e viverem na tranquilidade da ilha do Pico, na procura do direito à felicidade.
Ponta Delgada, 20 de Outubro de 2015

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 21 de Outubro de 2015

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