segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Da morte e da luta pela liberdade

Imagem retirada da internet
A morte era esperada, pela idade e pelo estado geral de saúde previa-se que era uma questão de mais ou menos dias, mais ou menos horas. No dia 7 de Janeiro António Tereso e Mário Soares faleceram.
Sobre Mário Soares já foram tecidas as mais diversas opiniões e nada vou acrescentar ao muito que se tem escrito e dito, e ao muito que se virá a escrever e a dizer. Era uma personalidade controversa e é natural que a sua morte desperte polémicas e díspares opiniões. Não me parece, contudo, apropriada a altura de expressar a minha opinião sobre a personalidade política de Mário Soares. Como cidadão português manifesto o pesar pela morte de um antigo Presidente da República Portuguesa e apresento condolências à família e ao Partido Socialista.
António Tereso, também ele um ativista e militante político, dedicou toda a sua vida à luta pela Liberdade, pela Democracia e pelo Socialismo, mas que nunca ascendeu a cargos públicos e, talvez, por isso tenha sido uma personalidade de quem a maioria dos portugueses nunca ouviu falar.
António Tereso, militante comunista, foi preso pela polícia politica de Salazar, a PIDE, em 1959 na sequência das lutas dos operários da Carris. Foi condenado a dois anos e três meses de prisão no Forte de Caxias onde se encontravam presos outros militantes e dirigentes do PCP.
A estória de António Tereso é bem conhecida pelos militantes do PCP e por quem se interessas pela história da resistência ao fascismo em Portugal. A este homem foi pedido pelo Partido, por via do José Magro que também estava a cumprir pena em Caxias, que assumisse o papel de “rachado”, designação dada aos presos políticos que se passavam para o lado errado da luta. António Tereso ganhou a confiança dos carcereiros, dos inspetores da Pide e do diretor da prisão e foi insultado, cuspido e agredido pelos seus camaradas, apenas o José Magro saberia que o António Tereso estava a desempenhar o papel de “rachado” e a finalidade da tarefa que lhe estava confiada.

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Os seus conhecimentos de mecânica e a sua experiência como motorista revelaram-se de grande utilidade para que o sacrifício pedido ao António Tereso valesse a pena e foram determinantes para ganhar a confiança dos seus algozes. A fuga, pois era disso que se tratava veio a acontecer no dia 4 de Dezembro de 1961. Na manhã desse dia após verificar que os seus camaradas de fuga se encontravam todos no pátio e a poucos minutos do recolher obrigatório, António Tereso trouxe um Chrysler blindado para onde entraram os seus camaradas José Magro, Domingos Abrantes, Francisco Miguel, António Gervásio e Rolando Verdial. O portão do Forte de Caxias cedeu ao embate da viatura blindada que, por sê-lo, evitou que os projeteis disparados pelas armas dos guardas o não tivessem perfurado. Dirigiram-se para Lisboa e dispersaram.
Das muitas estórias da história da luta antifascista esta será uma das mais geniais e exemplares. O António Tereso protagonizou uma das mais espetaculares fugas dos cárceres fascistas a conduzir um carro blindado que tinha estado ao serviço de Salazar, viatura que tinha sido oferecida por Hitler ao ditador português e que António Tereso, a pedido do Diretor do Forte de Caxias, tinha consertado.
A liberdade conquistada em Abril de 1974 é uma construção do povo português, não se deve a um homem só. O António Tereso é apenas um, de entre muitos, homens e mulheres que lutaram ao longo de toda a vida pela Liberdade, pela Democracia e pelo Socialismo em Portugal. Estes homens e mulheres não podem nem devem ser esquecidos, nem a história da luta pela Liberdade em Portugal pode ser branqueada.
Ponta Delgada, 08 de Janeiro de 2017

Aníbal C. Pires, In Azores Digital e Jornal Diário, 09 de Janeiro de 2017

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