quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Os incómodos do PS

Foto by Aníbal C. Pires
Uma das caraterísticas do funcionamento da Assembleia Legislativa da Região Autónoma (ALRAA) quando comparado com o funcionamento quer da Assembleia da República (AR), quer com a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM), ainda que com algumas alterações introduzidas na IX Legislatura (2008-2012), tem sido o respeito pelas oposições e alguma maleabilidade regimental decorrente dos consensos construídos na Conferência de Líderes. O PS sente-se, contudo, incomodado com as múltiplas vozes que representam o Povo açoriano e, logo no início da aludida legislatura fez uma alteração cirúrgica à Orgânica da ALRAA retirando apoios financeiros e humanos aos grupos e representações parlamentares.
O alvo do PS eram, em primeira instância, as representações parlamentares do PCP e do PPM, ainda assim o PS não conseguiu nem calar, nem reduzir a produtividade dos chamados pequenos partidos. Ainda durante a IX Legislatura o PS, sem proceder a nenhuma alteração quer do Regimento quer da Orgânica impôs, em sede de Conferência de Líderes, a utilização de tempos globais na discussão das diferentes iniciativas. Esta imposição não sendo ferida de legalidade regimental ou estatutária demonstrou que o PS se sentia e sente incomodado pela pluralidade democrática da ALRAA. As maiorias absolutas têm destas coisas.

Foto by Aníbal C. Pires
Mas o PS foi demonstrando sempre que, ainda assim, as medidas que tinha tomado não eram suficientes e os seus incómodos foram tomando corpo, quer em sede de Comissão quer, sobretudo, no Plenário e, ao que parece, a democracia açoriana vai ser alvo de mais um atentado. O PS não satisfeito com a imposição de tempos globais pretende agora reduzi-los, impondo mais uma vez a força da sua maioria absoluta tendo a seu lado o BE para levar a cabo a sua pretensão (nada que surpreenda). O PS com o apoio despudorado do BE prepara-se para retirar tempo, ao já pouco tempo que dispõem as representações parlamentares. As maiorias absolutas e a inutilidade dos blocos têm destas coisas.
Com a entrada em vigor da Lei Eleitoral que consagrou o Círculo de Compensação, que para além de corrigir a desproporcionalidade eleitoral permitiu o aumento da pluralidade da ALRAA, com a revisão constitucional, em 2004, e a revisão do Estatuto, o quadro parlamentar e político na Região alterou-se substantivamente. Seria expetável que quer o Regimento, que data de Novembro de 2003, quer a Orgânica, que data de Dezembro de 2006, documentos que conformam e regulam o funcionamento da ALRAA fossem revistos e adequadas à nova realidade política, embora estes dois documentos tenham posteriormente sofrido alterações, na verdade, essas modificações destinaram-se apenas e tão-só a acomodar as alterações cirúrgicas a que já me referi.
Mas o PS ao invés de tomar a iniciativa de adequar o Regimento e a Orgânica da ALRAA à realidade política prefere utilizar, no recato da Conferência de Líderes, utilizar uma vez mais a força musculada da sua maioria e evitar o debate democrático que a revisão do Regimento e da Orgânica suscitariam. Lamentavelmente a pluralidade e o debate democráticos incomodam o PS e o acólito de sempre.
Ponta Delgada, 14 de Fevereiro de 2017

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 15 de Fevereiro de 2017

Sem comentários: