quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Pede-se tudo e nada se dá

Foto by Aníbal C. Pires
À Escola tudo se pede. Pede-se que eduque, que ensine, que alimente, que seja pai e mãe, que seja inclusiva, que transmita valores e atitudes, que socialize. À Escola pede-se que seja o que não pode, nem deve ser. À escola pede-se tudo e não se dá nada. E a missão institucional da Escola perde-se no caminho de regresso a casa. A família e a sociedade deixaram de cumprir o seu papel na educação das nossa crianças e jovens. Não constituindo, assim, surpresa os estudos recentemente tornados públicos sobre a indisciplina escolar.
Se a Escola tem responsabilidade, Tem. Alguma da responsabilidade é da instituição escolar e dos agentes educativos, sejam educadores, professores ou auxiliares de ação educativa. Responsabilidade que advém de alguma demissão do papel educativo que se verifica no seu seio, razões não faltam que justifiquem essa demissão, mas que não vou, de momento, desenvolver, porém sempre direi que a tentativa, diga-se, bem-sucedida, de desvalorização das carreiras dos agentes educativos por via de cortes salariais, do congelamento das carreiras e, sobretudo, da funcionalização da docência. Funcionalização traduzida na uniformização de procedimentos e em tarefas burocráticas limitando, assim a necessária independência pedagógica e individual e coletiva. Tudo isto e alguns normativos direcionados para o efeito retiraram autoridade aos docentes e à Escola. A reação foi de desistência. É claro que os educadores, os professores e os auxiliares continuam a dar o melhor de si, mas há limites à resiliência. E esses limites, para alguns destes profissionais, já foram ultrapassados pela ordem natural da vida. Os agentes educativos estão envelhecidos. A idade do pessoal docente e do pessoal auxiliar também conta e, o prolongamento da sua vida ativa, para além de contrariar qualquer política pública promotora de emprego, não contribui para que a Escola se transforme.

Foto by Aníbal C. Pires
Mas da inventariação das variáveis que contribuem para o insucesso da missão da Escola, na Região e no País, a que depende diretamente da Escola é residual mesmo não se confinando às questões que já enumerei. As variáveis que mais contribuem para o estado da Educação Pública são-lhe exógenas, resultam das políticas educativas construídas nos gabinetes que tutelam a educação e que não são ideologicamente inócuas, como por vezes se pretende fazer crer. Perpetuar modelos sociais e económicos serve os poderes instituídos e a Escola limita-se a reproduzi-los. Lamentável para quem deposita, ou depositava, na Escola uma expetativa transformadora da sociedade. E nós fomos aceitando, Nós docentes, nós cidadãos.
Fomos e vamos aceitando a desregulação do mercado de trabalho e a consequente fragilização das famílias, o empobrecimento com a implementação de políticas austeritárias, a cultura agressiva de apelo ao consumo, a transmissão de valores assentes no acessório promovida pelas corporações mediáticas. Fomos e vamos aceitando a estupidificação.
Ponta Delgada, 07 de Fevereiro de 2017

Aníbal C. Pires, In Diário Insular e Açores 9, 08 de Fevereiro de 2017

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