quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Gestão de expetativas e falta de memória

Foto by Aníbal C. Pires
Um dos deputados da República eleitos pelo círculo eleitoral dos Açores afirmou que não espera o cumprimento das medidas, aprovadas no Orçamento de Estado, destinadas aos Açores, ou seja, a sua expetativa é inversa à que o Governo da República cria na opinião pública à volta do que o governo de António Costa aprovou e diz que vai executar.
A minha expetativa, à semelhança do deputado António Ventura, também não é elevada. O que o deputado dos Açores em Lisboa disse pode aplicar-se, a este como a muitos outros Governos do país que precederam o atual. Lembro apenas os governos de Cavaco Silva e de Durão Barroso, de entre outros. É quanto baste para espevitar a memória do deputado pois, de outros governos, certamente, se lembrará sem necessitar dos meus lembretes.
Não tenho nem nunca tive grandes expetativas em relação aos governos de Lisboa, no que à concretização de investimento público estadual nos Açores diz respeito, seja qual for o partido do centro que governe com, ou sem o apêndice que Assunção Cristas agora lidera.
O Estado tem vindo a demitir-se das sua funções e competências nos Açores, o mesmo se poderá dizer de outras regiões continentais, o mesmo se poderá dizer da Região Autónoma da Madeira. O Estado português é centralista por natureza, mas não é apenas de uma questão de mais, ou menos centralismo de que se trata, mas também.
A coesão social e territorial, sendo conceitos que ainda se mantêm no discurso político não são, porém objeto de medidas que favoreçam políticas públicas para o uso e a ocupação territorial social e economicamente justas. As políticas de coesão social e territorial estão à mercê, como muitas outras, do mercado, ou como quem diz, Ao Deus dará. E este deixa andar, a que Deus é alheio e, do qual o mercado beneficia, mas como se sabe não atende a questões que não envolvam chorudos dividendos. Sendo assim, é às políticas e a quem as executa, mas também a quem assiste, confortavelmente no sofá, sem se indignar que devem ser assacadas responsabilidades pela falência do Estado.
Na Região Autónoma dos Açores são, por demais, conhecidas as razões que sustentam a afirmação de que o Estado não cumpre as suas obrigações para com este território pulverizado numa vasta área do Atlântico Norte. A falta de meios e de efetivos das forças de segurança e das forças armadas, o abandono das populações que sofreram e sofrem os efeitos colaterais do uso, durante décadas, do seu território por uma potência estrangeira ao abrigo de um acordo celebrado entre dois países, as inaceitáveis condições dos estabelecimentos prisionais da Horta e de Ponta Delgada, os efeitos do encerramento de serviços públicos e o seu afastamento dos cidadãos, a internet não pode nem deve substituir o atendimento presencial, o subfinanciamento da Universidade. Estes são alguns, de entre outros aspetos, que se podem encontrar, com outra dimensão e contornos, noutras regiões do país, em particular no interior do território continental.

Imagem retirada da internet
Portugal é um país caracterizado por descontinuidades ou, se preferirem por profundas assimetrias sociais e económicas e, o uso do território e a sua ocupação efetiva relaciona-se diretamente com essa desarmonia dramaticamente visível aquando dos incêndios deste, e de ouros verões.
Sei que o deputado António Ventura no que concerne à coesão territorial tem posições que se aproximam das minhas, designadamente ao uso e ocupação do território como condição sine qua non para que as políticas de coesão social e territorial possam ser bem-sucedidas. A diferença situa-se ao nível da intervenção do Estado que ele agora tanto exige, alto e bom som, mas que não perfilha pois, como é sabido a família política alargada a que pertence tudo tem feito para destruir o Estado e reduzi-lo a um mero e injusto coletor de impostos que depois distribui de forma igualmente pouco justa.
Ponta Delgada, 05 de Dezembro de 2017

Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 06 de Dezembro de 2017

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