segunda-feira, 24 de junho de 2013

Do património, da vinha e do vinho

A cultura da vinha em currais constitui um património único dos Açores, que atingiu o seu expoente máximo na ilha do Pico, onde esta paisagem característica obteve o justo reconhecimento internacional através da sua classificação como Património Mundial. 
A proteção da cultura de vinha em currais e o desenvolvimento da vitivinicultura na ilha do Pico trouxeram benefícios muito positivos para a ilha e para a Região. Desde logo, no campo da economia produtiva, através de vários produtos de alto valor, que continuam a representar receitas relevantes para a Região, apesar de quebras na produção em anos recentes. Criaram-se, também circuitos comerciais associados, que muito contribuem para o dinamismo económico e para o emprego na ilha do Pico.
Também do ponto de vista ambiental foi possível proteger o nosso património vegetal, com a recuperação várias castas tradicionais que tinham sido votadas a algum abandono. Mas, a proteção, classificação e estímulo à cultura tradicional da vinha também trouxe benefícios no plano cultural, através recuperação dos saberes e produções tradicionais, da sua valorização e divulgação, sendo, sem dúvida, esta é uma das razões que fazem do Museu do Pico o mais visitado da nossa Região.
Mas, um dos principais benefícios colhidos pela ilha do Pico e pela Região está, no entanto, no setor turístico. O regime de proteção da cultura da vinha permitiu reforçar a capacidade de atração da ilha através da oferta de uma paisagem única e de uma gama de produtos tradicionais de elevada qualidade. Este fator contribui fortemente para explicar o desempenho, comparativamente melhor, da ilha do Pico, em termos dos indicadores da atividade turística. 
A proteção e redinamização da cultura tradicional da vinha, permitindo a criação de produtos característicos e de alto valor, associadas à proteção paisagística e ambiental, à dinamização cultural da produção do vinho e às atividades turísticas, demonstraram ser experiências muito positivas que podem ser adaptadas e replicadas em núcleos tradicionais noutras ilhas dos Açores. 
A prática tradicional da cultura da vinha em currais existe em todas as ilhas dos Açores e representa um importante potencial produtivo, mas também cultural e turístico que deve ser preservado e potenciado. 
Importa, assim, que se utilize a experiência valiosa colhida na ilha do Pico ao longo dos últimos anos, para dinamizar o setor vinícola regional e aproveitar as potencialidades existentes nas restantes ilhas do arquipélago.
É, portanto, necessário que se proceda, numa primeira fase, a um levantamento exaustivo das zonas de currais de vinha existentes em todas as ilhas do arquipélago e se realize uma avaliação do seu estado de conservação, das necessidades de intervenção com vista à sua reutilização e se avalie o seu potencial vinícola, bem como o tipo de produção mais adequado. 
Na posse desses dados, será então possível criar um regime de proteção das zonas referenciadas, associado a um sistema de incentivos à sua recuperação e reutilização produtiva, aproveitando o conhecimento e capacidade dos parceiros locais e estimulando o associativismo dos produtores. Utilizando também a comprovada capacidade e os meios técnicos de excelência de que a Região dispõe, em parceria com os produtores, será possível criar uma nova gama de produtos vinícolas, de cunho local, com caraterísticas específicas e diferenciadoras, de elevada qualidade e potencial económico. 
A recuperação paisagística e o crescimento das produções locais poderão potenciar a atividade turística em geral e o segmento do enoturismo em particular, acrescentando mais ofertas de qualidade ao produto turístico regional, o que se converterá, necessariamente, em benefícios económicos substanciais para cada uma das ilhas e para a Região no seu conjunto.
Ponta Delgada, 24 de Junho de 2013

Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 24 de Junho de 2013, Ponta Delgada

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