terça-feira, 11 de junho de 2013

Exceção sem regra

Para um número alargado e especialistas de várias áreas disciplinares, o empreendedorismo é, assim como uma espécie de culto e, o remédio para todos os males das sociedades como a portuguesa. Dão-se exemplos de empreendedores, ele é o Bil Gates, ele é o Mark Zuckerberg, eles são alguns jovens portugueses que as televisões, pública e privada, produzem. Eles são a exceção que não confirmam a regra, e alguns destes exemplos nem exceções chegam a ser. A ideia do empreendedorismo vende. Vende como proposta política, vende como oferta de formação, desde o ensino profissional ao ensino superior, e não falta por aí quem compre. O contingente de candidatos a empreendedor cresce. A ideia é apelativa, cultiva o sucesso individual e a ascensão social e económica, não importa como nem à custa do quê.
Conheço alguns empreendedores que transformaram uma ideia numa atividade económica produtiva, não tenho nada contra, reconheço o seu valor e admiro-os. São jovens e menos jovens que colocam os seus saberes e dinamismo ao serviço da comunidade, da Região do País, criaram postos de trabalho e geram riqueza. Mas generalizar a ideia de que a solução para o desemprego jovem passa, no essencial, por promover um batalhão de jovens empreendedores parece-me profundamente errado, isto para além de conformar a desresponsabilização política da Região e do País de promover políticas públicas de emprego, ou seja, de passar o ónus da criação de emprego jovem para as vítimas das políticas de destruição de emprego.
A ideia de empreendedorismo emergiu naturalmente como resposta à cultura de atomização das sociedades e o abandono da ideia de que as soluções políticas e económicas que promovem o desenvolvimento devem ser, têm de ser construções coletivas. Construções dos indivíduos, é certo, mas nunca do individualismo.
Não tenho uma reflexão profunda sobre a enunciação anterior e a sua ligação com a emergência desta epidemia em que redundou o empreendedorismo, contudo encontro algumas contradições entre os efeitos da cultura dominante, fundada na atomização da sociedade mas que uniformizou, aliás não tenho dúvidas de que esse era o objetivo, uniformizar. Uniformizar o consumo, uniformizar o pensamento, uniformizar os modelos económicos, uniformizar os modelos políticos, uniformizar a cultura. Posso até ser um pouco mais duro nesta análise especulativa e, afirmar que esta uniformização é sinónimo de estupidificação. E quanto mais assim for, mais facilmente se exerce o domínio sobre os indivíduos e sobre os povos.
Apesar do grande investimento ideológico e financeiro as políticas de autoemprego e emprego ancoradas no empreendedorismo não trazem, verdadeiramente, nada de novo e, por outro lado encontram um público destinatário formatado com pseudoprojectos inovadores, aqui há exceções não posso generalizar, destinados ao fracasso mal se acabe o apoio público.
Talvez volte, quem sabe, a este aliciante assunto. É que esta coisa do empreendedorismo, tenho para mim, é uma característica do ADN do povo português, e empreendedor, no meu dicionário pessoal, não tem como significado - empresário.
Angra do Heroísmo, 09 de Junho de 2013

Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 11 de Junho de 2013, Ponta Delgada

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