quarta-feira, 1 de setembro de 2010

De volta à realidade

Chegados a Setembro temos a ilusão de que tudo recomeça como se o Mundo tivesse parado durante o Verão ou, mesmo por estas latitudes e longitudes, que todos os cidadãos retomassem as suas actividades profissionais após um período de férias mas, nem o Mundo se quedou nas suas incessantes órbitas à volta do astro rei, nem a humanidade deixou de se confrontar com velhos e novos problemas de subsistência e sobrevivência mesmo, a parte da humanidade que vive no Norte da abundância e do desperdício. É este Norte onde vivemos que os mandantes do Mundo têm vindo a procurar transformar no Sul da pobreza, da exclusão, da fome, das desigualdades.
A lógica de desenvolvimento fundada no conceito da Nações Unidas tem vindo a retroceder no Norte rico, que continua rico, cada vez mais rico mas, com um elevado e crescente número de pobres e excluídos, desempregados e com a generalidade da população a ser subtraída dos direitos básicos a que, segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, todos devem aceder. O Sul subdesenvolvido ou em vias de desenvolvimento, exceptuando alguns pontos onde se teima estoicamente contrariar as históricas causas que estão na origem dos problemas que os remeteram para a condição de subdesenvolvimento, continua na generalidade a manter se não mesmo a aprofundar as desigualdades que o distanciam do Norte rico e desenvolvido.
As opções políticas e económicas que desde a década 70, do século XX, se instalaram nos países desenvolvidos, designadamente com Ronald Reagan e Margareth Tatcher e, com a chamada terceira via, pela qual Tony Blair deu a cara e lhe proporcionou, acabado o seu “reinado”, uma imensa fortuna pessoal sobre a qual se colocam muitas interrogações, mas como dizia o neoliberalismo não só é responsável pela profunda crise global que vivemos mas, também procura nivelar as relações de trabalho, os rendimentos e os direitos sociais para um quadro que se aproxima assustadoramente dos países em vias de desenvolvimento e subdesenvolvidos, ou seja, o paradigma de desenvolvimento que no pós Grande Guerra foi adoptado no Ocidente capitalista, em grande parte resultantes das pressões a que foi sujeito, pelos seus cidadãos, na inevitável comparação com o desenvolvimento social e científico que na época se verificava nos países do designado bloco socialista, o paradigma foi abandonado e a selvajaria capitalista instalou-se, ganhou força e a tendência passou a ser de hegemonização do modelo neoliberal com os efeitos nefastos que todos conhecemos.
O modelo neoliberal, associado ao imperialismo, para se afirmar necessita, porém, do caos, dos conflitos armados, necessita no fundo de ter um inimigo que possa associar ao terror exercendo pelo medo o domínio dos cidadãos sob a sua protecção.
Só assim se compreende que muitos de nós estejamos acomodados aos tempos e estejamos dispostos a ser despojados de direitos e de rendimentos a troco de uma suposta segurança pessoal. Este é o imposto que o império nos cobra para manter afastado o perigo que, por agora, é o islamismo.
Aníbal C. Pires, In Diário Insular, 01 de Setembro de 2010, Angra do Heroísmo

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