segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Capitulação e domínio

As medidas de austeridade que assolam Portugal foram subscritas, em diferentes momentos, pelo PS e pelo PSD com a bênção de Cavaco Silva e, sempre com a inevitabilidade a dar-lhe o sustento político e a preparar consciências para uma resignada aceitação social.
O facto de o PS e do PSD se colocarem de acordo com este continuado ataque à economia e à soberania nacional, não constitui uma novidade pois, estas duas formações políticas disputam o poder pelo poder, ou seja, não as distingue um projecto político alternativo e, as “divergências” não passam de uma calculada estratégia eleitoral com data marcada. Esta disputa do poder pelo poder traduzida em mais de três décadas de alternância de governos laranja e rosa, aqui e além pintalgados de CDS, defraudarem as expectativas dos portugueses de diferentes gerações, liquidaram conquistas civilizacionais, desbarataram os dinheiros públicos, destruíram os sectores económicos produtivos e colocaram o país de cócoras face a essa entidade sem legitimidade a que chamam mercados.
Não deixa de ser interessante, embora dramático, verificar que a Alemanha tendo imposto a outros que, no quadro das políticas de integração europeia, desmantelassem os sectores produtivos manteve a saúde da sua economia ancorada nesses mesmos sectores económicos.
A Alemanha está a impor à generalidade dos países europeus por via pacífica aquilo que não conseguiu pela força das armas – a capitulação e o domínio.
Não é por acaso que a Alemanha tem taxas de crescimento muito acima da média dos seus parceiros de moeda única, em claro contra ciclo, não esquecendo que o sector financeiro alemão está a sugar, até ao tutano, os seus parceiros da Zona Euro por via da especulação financeira que resulta, obviamente da imposição de um valor comum para o défice público, sem atender aos contextos e características de cada uma das economias que, naturalmente têm ritmos e níveis de desenvolvimento diferenciados.
A promoção da equidade deve ancorar-se no reconhecimento da diferença e não na cegueira administrativa que o Pacto de Estabilidade e Crescimento tenta conformar.
Tratar de forma igual o que é diferente é contribuir para acentuar o fosso das desigualdades e não caminhar para o desígnio da coesão que, afinal é um dos principais pilares do projecto que esteve na génese da União Europeia.
A actual situação vivida por Portugal e pelos países da periferia europeia traduzem bem o fracasso do processo de construção e integração europeia, tal como ele nos tem sido “vendido” pelos europeístas e eurocêntricos.
Alguém me diz onde está o projecto europeu promotor da coesão social, económica, cultural e territorial? Alguém me diz onde está o projecto social europeu?
Ponta Delgada, 19 de Novembro de 2010

Aníbal C. Pires, In A UNIÃO, 19 de Novembro de 2010, Angra do Heroísmo

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