segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Escola e sociedade(1)


A revolução de 25 de Abril de 1974 veio transformar profunda, económica, social e culturalmente a sociedade portuguesa nomeadamente o Sistema Educativo.
A democratização da Escola, o acesso de todos à educação e ao ensino, a igualdade de oportunidades a par da procura de uma reorganização que rompesse com o passado e proporcionasse iguais condições às crianças e jovens de todas as classes sociais foram as preocupações dominantes e que tiveram como efeito a introdução da primeira reforma do pós 25 de Abril, implementada no ano escolar de 1975/76.
No domínio político satisfazia-se, assim, a rutura com um sistema de ensino assente nas diferenças de classe e que não promovia a permeabilidade e mobilidade social.
 O ensino durante o Estado Novo tinha um grande cunho etnocêntrico, classista e elitista e não favorecia a permeabilidade e ascensão social, apesar de, na reforma de Veiga Simão se vislumbrar uma tentativa de inverter esse ‘status quo’. O ensino do pós 25 de Abril caracterizou-se pela democratização do ensino baseado na igualdade de oportunidades e de acesso (ou mesmo obrigatoriedade no caso do ensino básico) à educação.
Mas será que a Escola Democrática perdeu todos os atributos que caracterizavam a Escola do Estado Novo?
Será que o princípio da igualdade de oportunidades será por si só um fator de democratização da Escola?
Será que a Escola saída da revolução de Abril teve e tem em conta a diversidade cultural dos alunos que acolhe?
Tradicionalmente a Escola favorece os meios socialmente privilegiados, ao criar métodos progressão baseados em capacidades individuais e na meritocracia com objetivos propedêuticos, que estão intimamente ligados aos conhecimentos, atitudes, valores e comportamentos próprios dos alunos que vêm de meios privilegiados e para quem o sistema escolar foi primitivamente criado.
Nesta perspetiva, o princípio da igualdade de oportunidades se não for acompanhado de medidas e modelos pedagógicos que contemplem as diferenças e o respeito pela diversidade cultural, não garante, em minha opinião, a democratização do ensino. Como podemos constatar  a organização escolar e os modelos pedagógicos tem-se pautado pela homogeneidade das normas, dos espaços, dos tempos, dos saberes e da cultura que se procura transmitir e, por outro lado, os alunos caracterizam-se pela heterogeneidade e pela diversidade cultural. A esta dicotomia a Escola ensina a todos como de um só se tratasse, talvez a génese da insatisfação, do abandono e do insucesso dos alunos resida nesta recusa sistemática da Escola em não atender a diferença. Os currículos alternativos, as vias precoces do ensino profissional e outras soluções encontradas no Sistema Educativo Regional não são solução, são paliativos.
A sociedade atual é caracterizada por uma enorme diversidade cultural que tem a sua origem nas diferenças socioeconómicas, de cultura, de género, na deficiência, na língua, nos espaços habitados e experienciados, ou outras.
Novas tecnologias de informação, globalização, informatização, questões culturais, de género, imigração, novas manifestações culturais dos adolescentes e jovens, diversas formas de violência e exclusão social são fenómenos que configuram novos e diferentes cenários, sociais, políticos e culturais, aos quais a Escola (Sistema Educativo) não pode ficar indiferente e para os quais tem de preparar as respostas adequadas.
O impacto que estes novos e diversos fenómenos sociais têm no quotidiano escolar é cada vez maior e a Escola não pode, não deve, ignorar esta realidade.
A atual dimensão dos problemas sociais e culturais que afetam a sociedade contemporânea e o seu reflexo na Escola, exige que se reformulem conceitos, currículos, modelos de formação e se adotem práticas adequadas, que incorporem as novas realidades sociais e culturais, sob pena de continuarmos a ver as taxas de abandono e insucesso escolar aumentarem, excluindo e empurrando para a marginalidade milhares de jovens. 
Torna-se assim necessário a emergência de novos modelos de Escola que reconheçam que a diversidade e a pluralidade cultural são sinónimos de interação e troca, que reconheça os valores, modos de vida, valores simbólicos e acentue as interdependências culturais e potencie, como gerador de desenvolvimento humano, a diversidade e as interações culturais.
                          
Nota: este texto foi escrito em Março de 2003, hoje foi revisto e objeto de correções e pequenas alterações. Na próxima semana darei continuidade a este tema com uma reflexão sobre a escola intercultural.
Ponta Delgada, 06 de Janeiro de 2012

Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 07 de Janeiro de 2013, Ponta Delgada

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