segunda-feira, 11 de março de 2013

Santa Maria, à (re)descoberta (*)


Da minha última visita a Santa Maria resultaram vários textos e algumas iniciativas que tiveram divulgação pública através dos OCS. Aquilo que aos OCS se destinava, outros textos e outras iniciativas tiveram apenas divulgação nas redes sociais mas, nem tudo teve divulgação, nem terá. Destas visitas resultam sempre instantes e sensações que ficam com quem as vive e sente. Não as partilho. Não é por nada, é apenas porque não sou capaz. Os poetas fazem-no, mesmo quando escrevem em prosa, mas isso são os poetas, não eu.
Vou com regularidade a Santa Maria e posso afirmar que já a vou conhecendo um pouco, um pouco mais para lá do Central Pub. Mas também tenho de confessar que a cada viagem acabo por descobrir algo de novo. Desta vez fui à Maia, vou sempre à Maia como sempre vou ao Central Pub, e numa breve visita ao Núcleo Interpretativo da Baleação tomei consciência que também na ilha de Gonçalo Velho, a indústria baleeira e a baleação tiveram significado e importância na economia local. Do alto da Ponta do Castelo, na costa Sudeste da ilha de Gonçalo Velho pude observar o que resta dessa indústria, ruínas. Como em ruínas, ou para lá caminhando, estão outras memórias de Santa Maria. 
Do que foi a baleação em Santa Maria retive algumas notas que me despertaram a atenção. A atividade iniciou-se no final do século XIX (1896) e cessou no princípio da segunda metade do século XX (1966), foram capturados 900 cachalotes, diz-se que foi em Santa Maria que a média de capturas por bote foi a mais elevada dos Açores. No primeiro período da história da baleação em Santa Maria (1896 a 1906) as tripulações integraram baleeiros vindos de Cabo Verde.
A Ponta do Castelo, onde o farol Gonçalo Velho brilha na noite num alerta de aviso aos navegadores, é uma das zonas açorianas com mais características mediterrânicas. As suas abrutas encostas foram sabiamente aproveitadas para o cultivo da vinha. A cultura da vinha tem em Santa Maria uma paisagem singular, na Maia e em S. Lourenço. É preciso ver e sentir aqueles lugares para os valorizar, não basta varrer o olhar pelas encostas, pelas baías e perder-se na linha do horizonte.
Nesta última visita soube, não sabia, é imperdoável e penitencio-me pelo meu desconhecimento, da existência da “Confraria dos Escravos da Cadeinha”. Estórias da história da pirataria que assolou estas ilhas. A “ Confraria dos Escravos da Cadeinha” foi criada, no século XVII, para resgatar os marienses raptados e escravizados por piratas vindos do Norte de África.
Muito me falta conhecer e descobrir em Santa Maria. Ainda não fui à “Pedra que Pica”, jazidas fósseis, nem mergulhei, no “Ambrósio”, com a colónia residente de Jamantas, e quem sabe, talvez seja este ano que o tempo me permita ir ao “Maia Folk”, à “Maré de Agosto” ou ao festival de “Blues” nos Anjos.
Muito me falta conhecer de Santa Maria mas tive, este ano, um encontro privilegiado com um exemplar da Regulus regulus sanctae-mariae. Já tinha ouvido falar da famosa “estrelinha de Santa Maria”, sabia também o quanto é difícil avistar estas aves, não só porque o seu número as classifica em perigo de extinção, mas também porque as estrelinhas se movimentam nas copas das árvores o que torna o seu avistamento e observação bastante difíceis. Mas, desta vez, uma estrelinha de Santa Maria quis dar um ar da sua graça e veio até ao coração da freguesia de Santo Espírito mostrar-se ao visitante, como se viesse dizer-lhe, estou aqui, não te esqueças de mim, também faço parte do património desta ilha que tu teimas em defender contra a vontade de alguns e para além da compreensão de muitos outros.
Não é por acaso que Santa Maria é referenciada como um destino turístico de excelência, mesmo sem ter campos de golfe e Spas. Ou, talvez por isso, talvez porque o mar e a terra, a flora e a fauna endémicas, a paisagem natural e humanizada sejam, por si só, os elementos suficientes para que o destino Santa Maria, nos Açores seja um destino turístico de excelência. Aos homens exige-se que aproximem Santa Maria do Mundo, não mais do que isso.
(*) As notas que estão na origem deste texto foram publicadas no blogue “momentos”, no dia 27 de Janeiro de 2013. Hoje foi revisto e ampliado para publicação na imprensa regional.
Ponta Delgada, 10 de Março de 2013

Aníbal C. Pires, In Expresso das Nove, 11 de Março de 2013, Ponta Delgada

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