segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Não forma, formata

Foto - Aníbal C. Pires
Ando já há algum tempo a matutar na ideia que a evolução social e civilizacional não foi tão longe quanto julgava, mas não só. Mesmo o que ajuizava ser um acervo consolidado da humanidade, afinal tem pés de barro. Avaliei mal. Não evoluímos socialmente tanto quanto me parecia, continuamos a comportarmo-nos como aquilo que afinal somos, animais. Animais cuja evolução que decorre do conhecimento, da ciência e da tecnologia nos está a encaminhar para um triste fim. As declarações de princípios subscritas e aplaudidas nas instâncias internacionais, pela generalidade dos países do Mundo, não passam de meras e bonitas declarações de circunstância para protelar a necessária rutura com um modelo de desenvolvimento depredador, insustentável e que provoca gritantes e profundas injustiças sociais e económicas.
A vitória da Frente Nacional de Marie Le Pen nas eleições regionais francesas terão contribuído para que hoje tivesse optado por este tema, por esta preocupação. Não porque tenha avaliado mal, isso é de somenos importância, os meus juízos não são infalíveis e dúvidas tenho cada vez mais. A preocupação decorre da constatação que os sistemas educativos são ineficazes, ou seja, não transformam. Direi, para ser justo, que em Portugal houve um tempo, muito curto é certo, em que a
Foto - Aníbal C. Pires
Escola se assumiu com um dos agentes ativos da transformação da sociedade. Um perigo ao qual rapidamente se pôs cobro. E a Escola voltou ao que sempre foi, uma Escola que não transforma, uma Escola que reproduz e tende a perpetuar modelos e estilos de vida atomizados.
A atomização social não acontece(u) por acaso, por exemplo o empreendedorismo, tão em voga, não passa de uma desresponsabilização coletiva em nome da liberdade individual e, da desresponsabilização coletiva na promoção de políticas públicas de emprego, sem que isso coloque em causa a liberdade individual. Promover iniciativas de autoemprego não deve significar a demissão coletiva de promoção do emprego para todos. Julgo mesmo que só com a assunção coletiva da necessidade de promover de políticas públicas de emprego se pode garantir a liberdade individual, ou seja, manter o desemprego a taxas elevadas, ou promover o emprego sem direitos, isso sim, é privar os cidadãos de um direito básico e cercear a sua liberdade individual.
A penetração na opinião pública e, por conseguinte, a aceitação pela maioria dos cidadãos de uma cultura atomizada da sociedade não promoveu a diferenciação, estamos mais iguais nos costumes. A uniformidade dos hábitos e do pensamento favorece o domínio dos cidadãos e o poder gosta e serve-se dessa imensa mole de gente a pensar e a consumir o mesmo.
E é com base na premissa anterior que o discurso xenófobo aliado a um evento recente deu a vitória a Marie Le Pen nas eleições regionais francesas, e é com base na premissa anterior que a direita portuguesa colheu um apoio significativo nas eleições de 4 de Outubro, e é com base nessa premissa que uma grande parte da opinião pública mundial continua a ver num muçulmano um potencial terrorista.
Poderia dizer que a comunicação social de massas é um forte aliado do secular poder do capital financeiro, mas não estaria a ser rigoroso. A comunicação social de massas não é um aliado, é o instrumento do poder financeiro para exercer domínio sobre os cidadãos, tornando-os mais iguais nos costumes e escravos do pensamento único.
Um povo informado e culto não se verga perante os amos, não se deixa manipular, exige e luta. Um povo informado e culto é uma ameaça ao poder secular do capital financeiro e dos seus representantes políticos. Um povo informado e culto não se deixa amordaçar, não tem medo. Um povo informado e culto não se domina, é livre.
Talvez por isso a Escola não forme, formate.
Horta, 06 de Dezembro de 2015

Aníbal C. Pires, In Jornal Diário e Azores Digital, 07 de Dezembro de 2015

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