domingo, 20 de fevereiro de 2022

quem invade quem

imagem retirada da internet

Quando no mesmo texto leio, “a Rússia de Putin e Joe Biden Presidente dos Estados Unidos”, fico logo com os pelos eriçados. A diferença de dignidade atribuída a um e a outro, ambos presidentes eleitos, confere à notícia um alinhamento, ou seja, o jornalista que diz ou escreve coisas como as que referi, ou “o regime russo” e os Estados Unidos”, não é imparcial, a informação vem ancorada à opinião pessoal, a que tem direito em contexto diverso, ou à voz e interesses de quem lhe paga o que contraria a ética profissional. Mal vai o jornalismo em Portugal. Não é novidade, mas é bom que tenhamos consciência de que a informação que nos é veiculada pela comunicação social “de referência” não nos informa, procura moldar-nos como se fossemos um pedaço de plasticina.

As possibilidades de que a situação na região de Donbass se venha a alterar, enquanto escrevo este texto, são elevadas. Os diferendos entre a Rússia e a Ucrânia são de vária índole, mas é na região do Donbass que o conflito bélico aberto possa vir a acontecer, ou melhor se venha a agudizar. Quem acompanha a política internacional sabe que a Rússia tem limites, as chamadas linhas vermelhas, que não permitirá que sejam ultrapassados. Um desses limites é adesão da Ucrânia à NATO, e por consequência a instalação de potencial bélico ofensivo que fragiliza a sua capacidade de dissuasão, e outro é o genocídio das populações russófilas das repúblicas populares de Donetsk e Lugansk. Estas regiões do leste da Ucrânia, através de atos referendários, autoproclamaram-se independentes e, por razões geográficas e culturais têm uma grande proximidade com a Rússia, recusam a aproximação à União Europeia e, por conseguinte, a subserviência aos interesses estado-unidenses.

A cronologia da atual situação é conhecida e tem como data de partida a deposição, em 2013, do presidente ucraniano eleito, Viktor Yanukovich após o seu governo ter recusado a aproximação à União Europeia.

O que aconteceu na Praça Maidan, em Kiev, é conhecido, bem assim como o apoio de organizações nazis, internos e externos, mas também da União Europeia e dos Estados Unidos cuja participação foi posta às claras com célebre telefonema entre Victoria Nuland e Geoffrey Pyatt, embaixador dos EUA na Ucrânia. A própria Victoria Nuland esteve em Kiev durante as manifestações que levaram à deposição de Yanukovich.

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O que se seguiu é também conhecido. O referendo da Crimeia e a sua integração na Federação Russa, ao que se seguiram as proclamações de independência de Donetsk e Lugansk (região do Donbass) onde, desde 2014 se instalou um conflito armado entre os separatistas e a Ucrânia. É aqui, no Donbass, que o conflito nos últimos dias se agudizou. Os ataques de grupos armados (milícias nazis, como o Batalhão Azov, e exércitos privados como a Blackwater, agora renomeada Academy) e a deslocação de militares ucranianos para a região do Donbass já provocou 40 mil refugiados, recebidos pela Rússia, e a mobilização geral da população de Donbass.


A atuação dos Estados Unidos neste conflito (distante como convém) pode até perceber-se, já não se percebe a posição de subserviência da generalidade dos países da União Europeia. Se o presidente ucraniano cair na tentação de invadir o Donbass será o fim daquele país, tal como o conhecemos, e os efeitos nos países europeus serão devastadores.    

A União Europeia e os Estados Unidos são diretamente responsáveis pela política expansionista da NATO e pela tentativa de trazer para a sua área de influência a Ucrânia. O que sendo pacífico entre a maioria dos ucranianos que vivem nos territórios a Oeste não o é para os do Sul e do Leste que, por serem russófilos, preferem relações de boa vizinhança com a Rússia.

Os anúncios de “iminente invasão”, “é na 4.ª feira”, “está prevista para os próximos dias”, ou a retoma da ideia de que será na “4.ª feira” é, para além de terror comunicacional uma falta de rigor e servilismo atroz.

A continuar a ofensiva contra as repúblicas do Donbass, ou a qualquer tentativa de conquistar a Crimeia, é bem possível que venha a haver uma intervenção russa. Que afinal é aquilo que os Estados Unidos e os seus acólitos pretendem.

Aníbal C. Pires, Ponta Delgada, 20 de fevereiro 2022  


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