segunda-feira, 6 de junho de 2011

Partir e chegar

Foto - Aníbal C. Pires
O cais da partida e do almejado regresso transmutou-se. A tristeza dos que ficam, a saudade que já germina nos que partem, não muda nunca. Não muda ainda que esse seja um secular fado do povo português: abalar, já a magicar no retorno.
Da baía abrigada do porto para a aerogare. Dos intermináveis dias de viagem para umas fugidias horas, da pedrinha escrita no cais para o sms, da carta escrita para o mail, do telefone fixo, ou móvel, para o skype.
Conquistas da ciência e da técnica que afagam os sentimentos e dão a sensação de proximidade mas que não evitam, na hora da partida, aquele aperto no peito, os dentes cerrados tentando impedir uma lágrima que teima em assomar e rolar pela face e, o sentimento de vazio que, ao último beijo, ao derradeiro aceno, enche a alma de tristeza de quem fica, de quem parte.
Há coisas que as maravilhas da ciência e da técnica não vão mudar nunca. Entre a partida e o regresso fica a ausência e, isso, não se altera. Não há avanço tecnológico que preencha o roubo da presença de quem amamos, ainda que o regresso esteja seguro e a ausência seja curta.
Temos sempre alguém por fora… alguém embarcado e não há como habituar-nos. Nem mesmo o tempo, que é cura para todos os males, remedeia a saudade. Saudade que nem sempre é tristeza, mas é sempre, sempre, um vazio e o refúgio que alimenta a esperança da alegria do regresso, ainda que apenas te tenha deixado ontem no cais da partida. No mesmo embarcadouro de onde vistes partir os teus filhos quando tomaram asas e voaram do ninho, naquele cais da saudade onde nos recebes de sorriso aberto, mas com uma lágrima a espreitar antecipando uma nova partida.
Não há como mudar a dor da hora da abalada, não há como mudar o sentimento de vazio que a ausência desperta, não há como abafar esta saudade. Saudade tão própria dos ilhéus, saudade tão própria dos portugueses. Não há como mudar os sentimentos de um povo marcado pela partida da qual nem sempre há regresso e a saudade perpetua-se, a saudade canta-se no choro triste da morna, do fado, da saudade.
Há coisas que não mudam nunca, outras há, porém que se podem alterar. Só depende de nós!
Horta, 02 de Junho de 2011

Aníbal C. Pires, In A União, 06 de Junho de 2011, Angra do Heroísmo

1 comentário:

João D'Olyveira disse...

Gostei muito do texto. A ambiguidade da partida me encantou.

Muito obrigado.