quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Desígnio por cumprir

A política de coesão dos governos de Carlos César foi, como se sabe, entregue a uma sociedade conhecida pela designação de “Ilhas de Valor”. Esta empresa de capitais públicos pouco mais tem feito que promover a construção de algumas infraestruras na área do turismo o que, diga-se, é muito pouco para levar a bom porto qualquer projecto de coesão social, económico e territorial. Mas se esta visão “turística” do desenvolvimento harmonioso é redutora e claramente insuficiente em qualquer lugar do Mundo, se tivermos em conta que os Açores têm um território exíguo e pulverizado numa vasta área do Atlântico Norte e distante dos continentes, então o resultado só podia ser um: o fracasso.
O poder regional demitiu-se de promover o desenvolvimento harmonioso da Região ao transferir para a sociedade “Ilhas de Valor” a responsabilidade pelas políticas de coesão, aliás o anúncio por Carlos César, já lá vão três anos, de um plano estratégico para a coesão nos Açores (um tal PECA)* é, em si mesmo, o reconhecimento da necessidade de retomar uma linha política que cumpra este desígnio autonómico ou, se preferirem, o reconhecimento do falhanço das políticas de coesão e opções erradas dos governos do PS Açores. As assimetrias no desenvolvimento estão aí, basta olhar ao longo dos anos para as diferenças nos índices do poder de compra nos concelhos açorianos e, mais recentemente, os resultados dos Censos de 2011 para concluir que estamos cada vez mais distantes de um modelo de desenvolvimento equilibrado.
Em boa verdade mais do que palavras valem os factos e, como está à vista de todos, não basta um avultado plano de investimentos em obras públicas ou a canalização, a fundo perdido, de apoios financeiros para o sector privado, apenas porque temos fundos comunitários disponíveis, para que o miraculoso mercado se encarregue de tudo resolver.
Os resultados dos Censos de 2011 vieram confirmar aquilo que se temia e que intuitivamente se esperava (eu pelo menos). Tendência para a concentração da população em duas das nove ilhas do arquipélago e uma continuada perda nas restantes, com excepção do Corvo que voltou a crescer como já tinha acontecido em 2001. Ainda assim o crescimento da população residente na Terceira e S. Miguel é assimétrico. Dos oito concelhos destas duas ilhas apenas três apresentam crescimento da população residente, os restantes perdem população o que significa que mesmo dentro das fronteiras de cada ilha se verificam ritmos de desenvolvimento diferente.
Temia-se porque os movimentos e as oscilações populacionais estão directamente ligados às políticas públicas e ao investimento. Adivinhava-se porque as guerrilhas partidárias pela conquista de poder autárquico e regional levaram à concentração estratégica de avultados investimentos públicos e que, por coincidência ou não, se verificaram nas cidades que apresentam o maior crescimento da população residente.
Direi, a terminar, que a uma irracional e acelerada terciarização da economia regional e a falta de um sistema integrado de transportes marítimos e aéreos de mercadorias e passageiros cujo custo final garanta o direito ao não isolamento e à mobilidade serão, dois dos factores que mais terão contribuído para a continuada sangria populacional de algumas das nossas ilhas.
Ponta Delgada, 28 de Agosto de 2011
Aníbal C. Pires, In A União, 31 de Agosto de 2011, Angra do Heroísmo

* A ante proposta do Plano Estratégico para os Açores (PECA) foi apresentado na ilha Graciosa no dia 29 de Agosto de 2011, ou seja, mais de 3 anos depois do seu anúncio. Este artigo foi escrito no dia 28 de Agosto de 2011.

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