quarta-feira, 26 de março de 2014

O comum promove a desigualdade

Foto - Aníbal C. Pires
É no quadro nacional que a estratégia açoriana de desenvolvimento e de convergência social e económica, com o país e com a Europa, se deve conformar. Isto sem invalidar que a Região Autónoma dos Açores, no âmbito das suas competências constitucionais e estatutárias, não possa e, sobretudo, não deva desenvolver ações próprias com objetivo de sensibilizar as instâncias europeias para as suas especificidades. Considerando, é claro, que a União Europeia entretanto não se desmorona e afunda nos intocáveis e nervosos mercados financeiros.
É meu entendimento que não é suficiente a garantia consagrada no Tratado do acervo já existente sobre as Regiões Ultraperiféricas, sendo importante é, no entanto, escasso para os interesses dos Açores.
Assim, considero que o aprofundamento e a evolução da política europeia relativamente às ultraperiferias, e, em particular para os Açores, consagrem a possibilidade de exceção às políticas comuns, sempre que esteja em causa a salvaguarda dos interesses específicos derivados da nossa condição ultraperiférica, da diminuta dimensão e dispersão territorial, do equilíbrio ambiental, bem como de outros fatores que, nos aproximam ou diferenciam da Madeira, das Canárias ou dos DOM’s franceses.
Todas elas são consideradas Regiões Ultraperiféricas mas, todas elas com especificidades próprias e onde as políticas comuns não podem ser aplicadas da mesma forma que nas vastas regiões continentais com continuidade territorial e próximas dos centros de decisão, nem as políticas para a ultraperiferia têm de ser, forçosamente, iguais para todas as Regiões com esse estatuto. Não se trata por igual o que é diferente, sob pena das desigualdades se aprofundarem.
A defesa das questões relacionadas com o Estatuto da Ultraperiferia e o seu aprofundamento são, a par da defesa do sector produtivo tradicional, da diversificação da atividade económica e, da procura de novas centralidades fundadas na privilegiada situação geográfica da Região e nos notáveis avanços tecnológicos que permitam o investimento na investigação de excelência e em atividades diretamente relacionadas com as potencialidades e o valor acrescentado das novas tecnologias.
Considero, assim, essencial que para a coesão social e económica dos Açores, o seu desenvolvimento harmonioso, a subsequente convergência real com a média do PIB nacional e Europeu e para a sustentabilidade da economia açoriana, que as políticas traçadas para os Açores ao abrigo do Estatuto das Regiões Ultraperiféricas devem considerar a existência de um Programa Específico que inclua derrogações permanentes às políticas comuns e que preveja um conjunto de apoios financeiros acrescidos a áreas especialmente importantes e que contribuem para a coesão económica e social e para a convergência com o País e com a União Europeia.
Deste programa específico devem constar, de entre outros, os seguintes aspetos: i) garantia de manutenção da produção de leite, em função da capacidade instalada, e o seu escoamento; ii) recuperar a gestão da Zona Económica Exclusiva, aliás dando cumprimento a insuspeitas orientações internacionais que aconselham a que os recursos marinhos sejam geridos pela proximidade das populações ribeirinhas; iii) apoio financeiro para os transportes aéreos e marítimos interilhas, tendo em vista a diminuição dos custos dos transportes.
Uma política fundada nas diferenças para alcançar a convergência. Esta é a frase, direi eu, que melhor sintetiza uma posição de defesa dos Açores, enquanto Região Autónoma de Portugal. As políticas comuns têm uma filosofia igualitária que não se coaduna com contextos tão diferenciados como os existentes, entre o continente europeu e as Regiões Ultraperiféricas, e as diferenças existentes entre as próprias.
Ponta Delgada, 25 de Março de 2014

Aníbal C. Pires, In Diário Insular et Açores 9, 26 de Março de 2014

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