segunda-feira, 28 de maio de 2018

O tempo e as suas dimensões

Foto by Aníbal C. Pires 
Não é tanto a meteorologia que me interessa, embora o estado do tempo tenha, naturalmente, importância sobre a forma como utilizamos o nosso tempo. No Verão não há pachorra para dar outros usos ao tempo a não ser para usufruir dos prazeres da estação. Abraçar e penetrar o mar, deleitarmo-nos com imenso azul que nos envolve o corpo e afaga a alma, caminhar pelo fresco verde que sobe pelas vertentes das caldeiras, que se espraia por pastos a perder de vista, ou nas perfiladas sebes das plantações de chá, em cerradas matas de criptomérias ou, na floresta endémica, Tanto verde. Tanto verde a desafiar os biscoitos negros onde a alva espuma da ondulação cobre verdes jardins de maré baixa, ali onde a terra entra pelo mar que a acolhe saciado num perpétuo abraço.
Não será bem assim. Mesmo no Verão o tempo tem outros que não apenas estes usos de contemplação e usufruto da beleza natural que nos envolve.
Não tenho por objetivo deixar qualquer indicação sobre o uso que devemos dar ao tempo conforme o tempo esteja. Embora o tempo seja o tema sobre o qual mais tenho refletido e escrito. O tempo esgota-se, mas não a vontade de falar sobre ele. Não lhe consigo fugir, também não faço esforço para isso, e à medida que vou acumulando tempo esse interesse aumenta, desde logo, por que se trata de um acréscimo patrimonial com tudo o que isso representa de conhecimento, maturidade e, porque não, sabedoria, mas também pela valorização do tempo e dos usos que lhe dou.
O dia continua a ter 24 horas e as horas, 60 minutos, nem mais nem menos. É inexorável. Mas a perceção do tempo é variável. Há momentos na vida em que o tempo não sobra, há lugares que nos consomem o tempo e, até corremos atrás do tempo para ter o tempo que não temos. É um tempo sem tempo.

Foto by Madalena Pires
Outros momentos há em que o tempo se instala ao nosso lado e caminha connosco, e temos tempo até para falar do tempo perdido e do estado do tempo. É o tempo a dar tempo ao tempo.
Não sei, também não vou confirmar, se o direito ao tempo está consagrado na Carta dos Direitos Humanos, mas se não está deveria estar pois, o tempo é o nosso bem mais precioso.
Pode até parecer um exercício meio abstrato e pouco consistente, e não contesto. Mas preocupa-me a falta de tempo para refletir face à exigência de respostas e decisões céleres impostas pelas novas tecnologias de comunicação e informação. Para tudo é necessário tempo, mas vivemos num tempo sem tempo. Este imediatismo reinante é preocupante.
 Ponta Delgada, 28 de Maio de 2018

Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 28 de Maio de 2018

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