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| imagem retirada da internet |
Excerto de texto para publicação no Diário Insular e, como é habitual, também aqui no blogue momentos.
(...) Veja-se como a pena corre, quando a deixamos ir sem controle para assuntos complexos, quiçá interessantes, mas que não faziam parte do meu propósito. Quando me sentei trazia comigo a ideia de abordar uma das condições humanas do nosso tempo: as migrações. Estou a meio caminho do fim do texto e ainda ando à deriva entre o Mediterrâneo e o Atlântico. Se bem que estes dois mares serviram e servem para a deslocação de pessoas, uns compulsivamente, outros por vontade própria, mas sempre em resultado da violência e de sistemas políticos e económicos predatórios. Foi assim com a escravatura, é-o agora com a guerra, com a pobreza e com o esgotamento das economias locais, entendidas aqui como regiões onde por diferentes motivos a fome e a negação de uma vida digna impelem cidadãos para percursos migratórios nos quais não há nenhum romantismo, apenas desespero. A maioria não são nómadas digitais, nem têm vistos gold.
Ao contrário do que tantas narrativas oficiais tendem a caraterizar, migrar não é escolha, migrar é uma fuga à morte. E não é uma sentença natural, inscrita no destino, mas fabricada por um sistema económico global que transforma regiões inteiras em zonas de extração, dependência e desespero. A Europa e os Estados Unidos, tão rápidos a proclamar valores e direitos, são igualmente rápidos a negar qualquer ligação entre o seu bem-estar e o sofrimento alheio. Fingem não perceber que cada barco que atravessa o Mediterrâneo com destino á costa europeia transporta, além de vidas, um inventário de responsabilidades históricas. Cada pessoa que atravessa a fronteira mexicana leva consigo as marcas de décadas de ingerência económica, militar e política. (...)

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