terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Ainda e sempre a coesão

Numa recente visita à ilha de Santa Maria pude constatar que o caudal de vozes que se manifestam contrárias à construção do Campo de Golfe naquela ilha tem vindo a aumentar.
Os marienses já não embarcam nas abundantes e confusas promessas do Governo regional e muito menos na validade da “Sociedade das Ilhas de Valor”, que paradoxalmente tem a sua sede em Santa Maria, cuja eficácia na promoção da coesão é pouco mais que nula.
Não é, todavia, apenas o descrédito que contribui para que a utilidade daquele investimento esteja a ser, cada vez mais, posta em causa. Os elevados consumos de água, a inevitável impermeabilização de uma extensa área agrícola, abrangendo uma das zonas mais férteis da ilha de Santa Maria, o que compromete a sua capacidade produtiva e até a sua segurança alimentar e os impactes ambientais, nomeadamente, no ciclo hidrológico despertam cada vez mais consciências. Existem ainda outros factores que contribuem para que a oposição a este previsível “elefante branco” ganhe cada vez mais adeptos, causas que se relacionam com a oportunidade do investimento e, sobretudo, com o seu retorno e contributo para a dinamização da economia mariense.
Numa época de crise, em que assistimos ao decréscimo contínuo dos fluxos turísticos, ao encerramento de unidades hoteleiras e às dificuldades que outras infraestruturas de promoção do golfe enfrentam, não se entende como é que será possível rentabilizar este empreendimento, nem como é que ele poderá contribuir para a tão desejada coesão.
Muito mais relevante e urgente do que enterrar milhões de euros em miragens turísticas, seria a satisfação de outras necessidades básicas da ilha de Santa Maria, como por exemplo, a implementação de um sistema de apoio à recuperação da habitação degradada, o fomento do turismo rural, a criação de condições para que as infraestruturas portuárias e aeroportuárias contribuam para a sustentabilidade da economia mariense e potenciem a emergência de novas actividades económicas.
A conservação da memória histórica da ilha de Santa Maria está por fazer. A paisagem natural e humanizada da baía de S. Lourenço e da Maia, a história e acervo do Rádio Clube Asas do Atlântico e o património aeronáutico de Santa Maria deveriam merecer uma atenção particular no quadro das políticas de coesão e de uma estratégia turística sustentável.
A ilha de Santa Maria como todas as outras ilhas da Região têm potencial para que as suas economias possam ser sustentáveis mas não será, certamente, com mais “elefantes” sejam eles cor de laranja, como a fracassada Zona Franca, ou cor-de-rosa como o projectado Campo de Golfe.
Aníbal C. Pires, IN A UNIÃO, 02 de Fevereiro de 2010, Angra do Heroísmo

1 comentário:

Maria Margarida Silva disse...

Olá, Aníbal!

Num comentário que fiz a uma das tuas últimas crónicas, cujo tema central era, justamente, o abandono a que tem estado condenada a Ilha de Santa Maria, tive a oportunidade (melhor dizendo, a veleidade, uma vez que não possuo informações razoáveis para tal) de entrelaçar algumas considerações sobre o assunto. E quando digo veleidade, refiro-me aos parcos conhecimentos que possuo sobre a matéria, pois como sabes muito bem, só é exequível abalizar situações como essa, in loco e, particularmente, no contacto com as populações. Só depois, será razoável fazer uma análise criteriosa e cuidada. E, quanto a isso, ninguém melhor do que tu e todos os outros que se confrontam directamente com os problemas que afectam a nossa região.
Todavia, não posso deixar de relacionar a construção do Campo de Golfe na Ilha de Santa Maria com o Cais de Cruzeiros em Angra do Heroísmo. Realmente, numa época de crise como esta que estamos a atravessar, com unidades hoteleiras a encerrar e com tantas necessidades básicas por colmatar, nada mais urgente do que proceder a obras deste vulto! Antes se debruçassem, já que têm tanto dinheiro para despender, em reconstruir os edifícios degradados que abundam nestas ilhas (pelo menos, aqui na Terceira) e dar-lhes um futuro que abonasse a favor de quem mais precisa. É lamentável!!

“Existem imbecis superficiais e imbecis profundos.” Karl Kraus

Um abraço.
margarida