segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Causa efeito

Foto by Madalena Pires
Os indicadores sociais e económicos em Portugal sofreram nos últimos dois anos alterações que não podem ser ignoradas. Os analistas de política e economia de diferentes quadrantes políticos não deixam de o referir. Sim, analistas de diferentes quadrantes políticos, bem que nos querem fazer crer que sim, mas não existem analistas independentes e imparciais, isto é, ao passo que os anjos não têm sexo os analistas regem-se, como todos nós, por uma matriz ideológica e política. Os analistas de política e economia não são seres assexuados nem apolíticos e, por vezes, nem apartidários chegam a ser. Mas como dizia, os analistas não ignoram a inversão dos indicadores sociais e económicos, têm leituras diferentes, em conformidade com a sua matriz política e ideológica, mas não conseguem esconder que o desemprego baixou, a economia cresceu e o rendimento per capita aumentou, é inegável.
O que diverge na opinião publicada não é o reconhecimento das transformações, o que não é coincidente na opinião dos analistas e comentadores são as causas que lhe estão na origem. Por exemplo Marques Mendes, essa grande figura da política nacional que se transformou em analista e comentador residente numa das televisões nacionais, disse por estes dias que apesar do bom momento económico que Portugal atravessa não estamos a convergir com a Europa. O que Marques Mendes não explicou foi a que se deve o tal “bom momento económico”, nem as razões porque não estamos a convergir com a média europeia.
Uma outra eminência parda que não sendo comentadora nem analista, mas que tem como responsabilidade presidir ao Conselho Superior das Finanças Públicas(CSFP) também veio a terreiro com as suas doutas opiniões e que dizem bem da sua independência e imparcialidade política. Teodora Cardoso afirmou recentemente, a propósito do Orçamento de Estado para 2018, que "a proposta do OE2018 continua sobretudo empenhada em tirar partido da conjuntura favorável e em cumprir as regras apenas nos mínimos indispensáveis para obviar a desaprovação da Comissão Europeia.” A presidente do CSFP também não procurou explicações para aquilo que designa de “conjuntura favorável”, como se isso fosse uma espécie de bênção divina e não resultasse de ações concretas decorrentes de opções orçamentais que tiveram como consequência o aumento do rendimento das famílias, quanto ao cumprimento das regras, no mínimo, no meio ou no limite máximo, diz bem da subserviência política de Teodora Cardoso ao diretório que domina a União Europeia. Mas a presidente do CSFP não se fica por aqui e insiste que não é pelas opções orçamentais que se prevê uma descida de 1,4% do défice, em 2017, para 1%, em 2018, mas sim devido ao impacto da atividade económica, aos dividendos do Banco de Portugal e a outros efeitos não identificados. Não especificou, eu pelo menos não tenho conhecimento, qual o contributo destas três variáveis para a descida do défice público, mas valham-nos os todos os deuses, Então senhora presidente, os impactos da atividade económica e os dividendos do Banco de Portugal devem-se a quê, isto porque quanto aos efeitos não identificados enfim, abstenho-me de comentar. O dinamismo ou a anemia da atividade económica resultam, creio eu, das opções políticas traduzidas em sede de orçamento e que, naturalmente, têm repercussões na atividade financeira.

Foto by Aníbal C. Pires
Em Portugal atravessa-se uma conjuntura favorável, como diz Teodora Cardoso, ou um bom momento económico, segundo Marques Mendes. Julgo que estaremos todos de acordo quanto a isso, mas porquê. Qual a causa que está na origem desta conjuntura favorável, qual a causa que provoca este bom momento económico, ou será que não existe uma causa e os efeitos estão a acontecer por um qualquer acaso.
O que está na origem das alterações que se verificaram nos dois últimos anos resume-se a uma palavra, Rutura. Em 2015 quebrou-se o ciclo de austeridade e empobrecimento e tomaram-se medidas, ainda que insuficientes e incipientes de reposição de rendimentos e direitos aos trabalhadores e aos reformados e pensionistas. Foi pouco, mas foi o suficiente para alterar o cenário dramático que se vivia em Portugal. O Orçamento para 2018 dá mais uns passos na consolidação e avanço destas opções. Se só por si é suficiente para que o bom momento económico não seja apenas uma conjuntura favorável, Não. O aumento do consumo por via do aumento do rendimento tem de ser acompanhado por políticas que promovam o aumento da produção nacional e a redução da dependência externa. Se isto não for feito então sim, estaremos a falar apenas de conjunturas favoráveis ou, de um bom momento económico.
Ponta Delgada, 12 de Novembro de 2017

Aníbal C. Pires, In Azores Digital, 13 de Novembro de 2017

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